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Um vislumbre da repressão em Teerã

Alan Cowell

Em Paris (França)

  • EFE

    Manifestantes e membros de forças de segurança iranianas se enfrentam em na capital Teerã (14/2/201)

    Manifestantes e membros de forças de segurança iranianas se enfrentam em na capital Teerã (14/2/201)

Por 18 dias, o mundo assistiu ao vivo a revolução no Egito pela televisão, acompanhando cada aumento dos protestos, cada escalada incremental do poder popular. E por um dia nesta semana, quando o fervor inspirado pelo exemplo do Egito tomou Teerã, o mundo fez o oposto. Nenhuma imagem por satélite, como as registradas na Praça Tahrir, mostrou a Praça Enghelab. Nenhum repórter estrangeiro chegou pelo aeroporto de Teerã. Nenhuma emissora lutou pela cobertura mais completa. Em vez disso, os forasteiros reviraram o YouTube e o Facebook em busca de fragmentos para adivinhar o que estava acontecendo. A narrativa era desconjuntada, como pretendiam aqueles que a atrapalharam. Um leitor escreveu para me perguntar porque não há vídeos para confirmar a retomada, mesmo que fugaz, dos protestos que ocorreram após a contestada eleição de 2009 do Irã, que foram brutalmente esmagados. A resposta é simples: câmeras foram proibidas; jornalistas foram impedidos de chegar aos protestos e punidos com a perda de credenciais de imprensa, enquanto as autoridades iranianas empregavam seu arsenal de controles: limitação da Internet; agentes de segurança à paisana em motos batendo e intimidando os manifestantes; o Parlamento latindo para que os líderes de oposição fossem executados. As diferenças na cobertura, entretanto, refletiam outra distinção ligada ao modo como os regimes interagem com o mundo além de suas fronteiras e as escolhas que precisam fazer diante da fúria da região, mostrando como a ajuda do Ocidente, antes uma fonte de apoio para alguns líderes, agora pode minar os próprios regimes que antes mantinha. “Por anos, os governantes árabes diziam a seus patronos ocidentais para não se preocuparem com seus súditos, que eram crianças obedientes, apesar de às vezes indisciplinadas, e esse patronos ficavam contentes em seguir seus conselhos”, escreveu Adam Shatz, um editor sênior, no “London Review of Books”. Mas assim que a nova onda de fúria árabe, iniciada na Tunísia, virou um tsunami no Nilo, Washington concluiu relutantemente que seu apoio ao presidente Hosni Mubarak o colocava no lado errado da história. O governo Obama mudou de posição e o destino de Mubarak foi selado. Por três décadas, como base da política regional de proteção a Israel, Mubarak caiu nas graças dos Estados Unidos e foi recompensado de muitas formas –desde tolerância ao seu governo autocrático até o US$ 1,3 bilhão por ano em ajuda americana para os militares do Cairo. Essas contribuições também se transformaram em influência: os generais do Egito insistiram desde o início que não ordenariam a suas tropas o uso de força contra os manifestantes, na prática encorajando o levante contra o chefe político deles. Por sua vez, os governantes frequentemente divididos de Teerã não possuem um patrocínio semelhante –na verdade, eles atraem poder como patrocinadores de grupos como o Hamas, em Gaza, e o Hizbollah, no Líbano– de modo que podem agir com impunidade. é verdade, o Irã depende da China e da Rússia para conter o esforço do Ocidente para sanções mais duras. Mal tinha se passado um dia após a repressão de Teerã aos manifestantes e o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, em visita a Londres, disse que discordava de um aumento das penas contra o Irã, porque causariam sofrimento ao povo iraniano. Em Teerã, o presidente Mahmoud Ahmadenijad joga segundo as regras diferentes de seu regime, aparentemente imune à reprovação de estrangeiros. Seu relacionamento com o Ocidente é definido pelo confronto, principalmente em torno do contencioso programa nuclear do Irã, mas também por suas ambições estratégicas, suas restrições aos direitos humanos, sua intolerância com a dissensão e, acima de tudo, sua hostilidade em relação a Israel. E a influência do Ocidente por meio de sanções econômicas é limitada. Sanções têm “muito mais chance de ser bem-sucedidas” em terras em que a população se opõe às mesmas políticas do governo que os estrangeiros que as impõem –“neste caso o enriquecimento nuclear”, disse Hossein G. Askari, da Universidade George Washington, em uma entrevista para o Conselho de Relações Exteriores em Nova York. Mas “o povo iraniano não está dizendo ao seu governo para abandonar o enriquecimento. Ele na verdade aprova o enriquecimento. O que torna mais difícil pressionar o Irã”. A elite de governo do Irã pode estar tomada por rivalidades internas divisoras, mas na prática a “Guarda Revolucionária Islâmica deve defender o regime em tempos de crise, mesmo ao custo de sua própria reputação”, disse Ali Reza Eshraghi, do Institute for War and Peace Reporting. Com seus frequentes ataques contra os Estados Unidos, Ahmadinejad mostra que a palavra de Washington não só tem pouco peso, mas também oferece uma mobilização pronta para o mesmo sentimento antiamericano como após a revolução de 1979. Enquanto a onda de protestos prosseguia nesta semana, pelo Oriente Médio e Norte da áfrica, as assimetrias –e limites– do poder americano de patrocínio reapareceram nas respostas do presidente Barack Obama ao protesto que irrompeu no mesmo dia no Irã e em Bahrein –um importante aliado americano no Golfo, que recebe a Quinta Frota da Marinha americana. Obama encorajou os manifestantes iranianos, pedindo aos manifestantes que encontrem “a coragem para expressarem seu desejo por maiores liberdades e um governo mais representativo”. Mas ele disse aos líderes árabes, incluindo a monarquia em Bahrein, que eles não podiam ficar “atrás da curva” da mudança exigida por uma “geração jovem e vibrante”. Mesmo assim, as forças de segurança lideradas pelos sunitas de Bahrein reprimiram duramente os manifestantes de maioria xiita, cuja fé os liga à maioria xiita no Irã. Nas primeiras horas de quinta-feira, a polícia investiu contra um campo pró-democracia tolerado na Praça Pérola, semelhante ao da Praça Tahrir no Cairo. Rajadas de balas, granadas de concussão e nuvens de gás lacrimogêneo envolveram os manifestantes que dormiam. Cinco pessoas morreram. Em horas, tanques e blindados de transporte ocuparam Manama, a capital. O exército disse que tomou o controle de grande parte da cidade. Em vez de fazerem as concessões políticas que os adversários de Mubarak (e do homem forte da Tunísia antes dele) viram como um sinal de fraqueza terminal, as autoridades de Bahrein –como as da Líbia no mesmo dia– escolheram a opção de Teerã de repressão. Enquanto os Estados Unidos agonizavam por causa de seu papel e influência, Ahmadinejad parecia à vontade com sua forma de fazer as coisas. “A nação iraniana é como o sol em seu brilho. E é claro que esse brilho faz inimigos e eles se esforçam muito”, ele disse, falando sobre seus inimigos tanto em casa quanto em Washington. “Mas no final seus esforços são como atirar terra contra o sol. Ela acaba caindo sobre eles.”

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