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Presidente da África do Sul enfrenta ano difícil em meio a denúncias de gastos abusivos e corrupção no governo

Justice Malala

  • Jewel Samad/AFP

    Jacob Zuma (esq.), presidente da África do Sul, discursa durante o show de abertura da Copa do Mundo ao lado do presidente da Fifa, Joseph Blatter, em 2012

    Jacob Zuma (esq.), presidente da África do Sul, discursa durante o show de abertura da Copa do Mundo ao lado do presidente da Fifa, Joseph Blatter, em 2012

Aqui na áfrica do Sul as pessoas estão fazendo piadas sobre o falecido cleptocrata Mobutu Sese Seko, o ex-presidente do Zaire, atualmente conhecido como República Democrática do Congo. No auge de seus excessos, Mobutu construiu um aeroporto em sua cidade natal rural para que, diz a história, ele pudesse viajar para Paris para rápidas excursões de compras.   As piadas não são feitas por brancos “racistas” com medo do raiar da democracia, como nos anos 90. Em vez disso, elas são feitas pelos jovens negros que acreditam que o sonho de uma áfrica do Sul estável, próspera e democrática está desaparecendo. O partido do governo, o Congresso Nacional Africano (CNA), é incapaz de lidar de modo decisivo com a impaciência gerada pelo desemprego elevado, pela pobreza devastadora e pela desigualdade do país.   As piadas de Mobutu começaram após as revelações de que o presidente sul-africano, Jacob Zuma, está construindo uma propriedade de campo supostamente no valor de cerca de 203 milhões de rands (US$ 25,5 milhões) na área empobrecida de Nkandla, no rural KwaZulu-Natal, onde ele cresceu. O projeto em grande parte financiado pelos contribuintes inclui alojamentos subterrâneos com quartos com ar condicionado, um heliponto, uma clínica para o presidente e sua família, casas para os seguranças e unidades policiais, playgrounds e um centro para visitantes.   A notícia do palácio de Zuma foi dada em 30 de setembro, apenas três dias depois da agência de classificação de risco Moody’s ter rebaixado um grau a classificação de crédito da áfrica do Sul, de A3 para Baa1, citando preocupações com a força das instituições do país, com o clima para investimentos e com a futura estabilidade política.   “A revisão reflete o ponto de vista da Moody’s da capacidade reduzida das autoridades sul-africanas em lidar com atual situação política e econômica e implantar estratégias eficazes, que possam colocar a economia em um caminho de crescimento mais rápido e mais inclusivo”, disse a agência.   Este tem sido um ano ruim para Zuma e para o CNA, o partido que ele herdou de Nelson Mandela. Em 16 de agosto, a polícia matou 34 trabalhadores grevistas em uma mina da Lonmin em Marikana, no pior incidente de violência policial ocorrido aqui desde o início da democracia, há 18 anos. Uma onda de greves violentas se espalhou pelo setor de mineração, ameaçando meio milhão de empregos e um setor que contribui com 6% do produto interno bruto. Os trabalhadores de outros setores estão seguindo o exemplo, exigindo grandes aumentos. Os grevistas atacaram fisicamente líderes sindicais por “se venderem” –um foi morto recentemente perto da mina da Lonmin– em consequência da revolta por esses líderes receberem salários semelhantes aos dos executivos da empresa, enquanto os trabalhadores ganham uma miséria.   Nos primeiros sete meses de 2012, o país registrou mais protestos violentos por falta de serviços do que em qualquer outro ano desde o início desses protestos em 2004. O governo não entregou livros escolares na populosa província de Limpopo, por exemplo, mesmo após já ter passado mais da metade do ano letivo.   A áfrica do Sul está politicamente à deriva. O CNA está atolado em corrupção e em batalhas intensas pela liderança, e sua reação a essas crises tem sido frouxa, abrindo a porta para que populistas explorem a revolta entre os trabalhadores e os pobres. A áfrica do Sul não está se desfazendo, nem é outro Zimbábue, mas sua liderança está se debatendo e é incapaz de cumprir as promessas dos anos Mandela. Investidores estrangeiros e domésticos estão começando a questionar a futura direção das políticas à medida que o CNA debate repetidamente sem chegar a um consenso sobre a nacionalização de minas e terras.   O problema é a liderança. Zuma chegou ao poder em uma chapa populista, escorada por uma “coalizão dos feridos” –líderes do CNA que se sentiram ignorados ou vítimas do antecessor de Zuma, Thabo Mbeki– sem nenhuma agenda coerente ou líderes experientes.   Isso ficou acentuado com clareza devastadora quando o massacre de Marikana aconteceu em agosto, e o CNA fracassou miseravelmente em responder à população. Os parlamentares do CNA se recusaram a visitar o local, com um deles rotulando os trabalhadores de “suicidas”. Após enfrentarem insultos, os membros do Gabinete abandonaram um serviço fúnebre para as vítimas, deixando o líder jovem expulso do CNA, o populista Julius Malema, preenchendo o vácuo de liderança que deixaram para trás. Malema prontamente disse que lideraria uma “revolução mineira”, levando muitos a questionarem quem estava dirigindo o país –Malema ou o CNA. Zuma agora eufemisticamente “autorizou o uso” do exército no que muitos estão dizendo ser um estado de emergência não declarado.   As coisas dificilmente melhorarão tão cedo. Os líderes do CNA estão apenas preocupados com as eleições enquanto o partido prepara sua conferência em 16 de dezembro. Zuma e seu rival, o vice-presidente Kgalema Motlanthe, fracassaram em se comprometer com qualquer questão, particularmente a política macroeconômica, preferindo declarar que a conferência decidirá.   Enquanto isso, o país mais desigual do mundo permanece à deriva, atolado em incerteza política e revolta dos trabalhadores, enquanto seu líder esbanja dinheiro público como Mobutu.  

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