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Mediadora segura briga de Marçal e Datena em debate; merece o Nobel da Paz?

O que você prefere? Arrancar um dente sem anestesia ou mediar um debate na TV em pleno domingo com os candidatos a prefeito de São Paulo com a presença de Pablo Marçal (PRTB)?

A jornalista Denise Campos de Toledo provavelmente não teve essa escolha. Caso contrário, estaria sorrindo uma hora dessas com um dente a menos.

Como não foi dada outra opção, ela assumiu por algumas horas o que é certamente o trabalho mais árduo do jornalismo atual. E olha que estamos falando de uma profissão precarizada.

Durante o debate deste domingo (1º) da TV Gazeta, ela fez o papel de mediadora, de jornalista, de bedel de escola, de diplomata e de negociadora em área de conflito.

Dizem que seguranças estavam posicionados para entrar em campo caso a situação degringolasse, mas o que se viu foi uma jornalista tentando o tempo todo dar conta sozinha do empurra-empurra no fundão da sala.

"Eu peço, antes de mais nada, respeito", repetiu ela em diversas ocasiões.

Em um dos momentos, deu para ouvir o prefeito Ricardo Nunes (MDB) se queixando da postura do adversário Guilherme Boulos (PSOL). Algo como "olha só o que ele fez".

"O senhor também chamou ele de invasor", disse, curta e seca, colocando o prefeito em seu lugar.
Não é para qualquer pessoa.

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Mal sabia o que viria pela frente.

Antes do debate, Nunes, Boulos e José Luiz Datena (PSDB) fizeram os organizadores prometer que Marçal não usaria o estúdio como picadeiro. E então definiram uma série de regras para conter o meninão.

Boné? Podia. Carteira de trabalho? Não podia. Estava na categoria acessórios — que valia para documentos e, presume-se, objetos pontiagudos.

A plateia também ficou mais restrita e quem cruzasse a linha poderia tomar cartão vermelho.

Marçal então usou o espaço que tinha para fazer o que mais sabe: tirar os concorrentes (além de parte da audiência e a mediadora) do sério.

Quando não podia falar, ele tirava o foco dos candidatos em tela dividida olhando para a câmera com ar de deboche e fazendo cosplay da Eliana dos Dedinhos, desenhando a letra M com as mãos, seu mote de campanha.

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Repetiu as mentiras de sempre (Lula roubou mesmo um R$ 1 trilhão, produção? Essa era fácil checar), voltou a questionar Boulos sobre uso de substâncias e explorou o deslize na execução do hino nacional em linguagem neutra — o que rendeu a ele o apelido de "Boules".

Em resposta, ouviu um pouco de tudo. Boulos o chamou de criminoso. De bandido condenado. De bolsonarista. Quase o chamou de coach. Mas deslizou ao dizer que o Guilherme Boulos envolvido com drogas supracitado por Marçal era outro — um "homônimo", alertou a audiência.

Como se na quinta série todos soubessem o significado da palavra "homônimo" (em tempo: "diz-se de ou cada uma de duas ou mais palavras de significados diferentes e de grafia idêntica; homógrafo").
Custava dizer "citou uma pessoa que tem o mesmo nome que eu, mas não sou eu?". Pelo jeito, custava.

O candidato do PRTB, que tem tentado atrair Jair Bolsonaro e criaturas para seu barco, guardou as armas também para Ricardo Nunes, o candidato oficialmente apoiado pelo ex-presidente. Fez isso chamando Nunes de "Banana" e Bolsonaro, de "amante". Sim, amante. "Você gosta tanto dele que precisa esconder do povo".

Ganha a Secretaria do Tesouro da cidade mais rica do Brasil quem tiver imagens do "react" do ex-presidente no momento.

Nunes retrucou referindo-se ao rival como "M de Mentira" e de "tchutchuca do PCC". Marçal riu. Ele até assumiu a ligação: PCC, para ele, era Patriota Contra Comunistas.

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De petardo em petardo, a situação escalou. Denise Campos de Toledo já não sabia o que fazer para segurar os marmanjos quando Tabata decidiu levantar a mão e levar uma maçã para a professora com uma pergunta sobre educação.

Foi chamada de "ô garota" e "Chatábata" por Marçal.

O cessar-fogo durou pouco.

E escalou de vez quando Datena entrou no jogo. Ele partiu para cima do ex-coach, chamado por ele de "bandidinho de internet" e "fujão" ("você fugiu para os Estados Unidos para escapar da prisão").

E acusou Marçal de telefonar para ele e propor uma dobradinha no debate: um atacaria Nunes e o outro, Boulos. Datena disse ter refutado a ideia e expôs a conversa ao público.

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Marçal não confirmou nem negou. Disse apenas que, na mesma ligação, o apresentador lhe confidenciou que não queria ser prefeito. Foi uma declaração de guerra.

Mais de uma vez o candidato tucano se desconcentrou vendo Marçal fazer a dança dos dedinhos. E perdeu a paciência ao ser chamado de "gagá" que "não vê a hora de ir embora pra casa".

"Gostaria que o senhor não utilizasse palavras chulas por favor. O senhor está sendo advertido em relação a isso", disse Denise Campos, respirando fundo, para Marçal.

"O senhor não pode falar enquanto o outro estiver falando", pediu ela a Datena. "O microfone está cortado, mas acaba atrapalhando o outro candidato. Espero que isso não se repita".

Mas se repetiu. No bloco seguinte, ela precisou pedir quase aos gritos para Datena voltar ao seu lugar após o apresentador se dirigir até Marçal. Não teve ninguém na audiência que não segurou a respiração à espera do estalo - que não veio.

Já arrancando os cabelos, Denise decidiu punir também Marçal. "Por causa dessa bagunça foi retirado o seu direito de resposta. Acabou. Você estava provocando ele."

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Ambos ficaram sem recreio — aliás, sem espaço para revidar.

A bronca, verdade seja dita, funcionou. Ou então haveria uma carnificina no estúdio. Mais um pouco e ela pediria para os meninos colocarem a camisa da amizade e pensar no que fizeram. Não deu tempo.

Denise Campos de Toledo entrou no debate como responsável por colocar ordem nos meninos brigões. Saiu de lá candidatissima ao Nobel da Paz.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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