Essa questão me deixa desconfortável, diz Zavascki sobre julgamento do mensalão
Em sua sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado nesta terça-feira (25), o ministro Teori Zavascki foi questionado pelos parlamentares se participaria do julgamento do mensalão em curso no Supremo Tribunal Federal e disse que a questão o deixa "desconfortável".
Zavascki foi indicado para o STF pela presidente Dilma Rousseff para ocupar a vaga deixada por Cezar Peluso. Se julgar que está habilitado a votar sobre a ação penal 470 (mensalão), o novo ministro pode entrar no julgamento com ele já em andamento --o que abre a possibilidade de ele pedir vistas ao processo, por exemplo.
“Quem decide a participação [em um julgamento em curso], em última análise, não é o juiz. É o órgão colegiado do qual ele vai participar. Essa questão, a mim pessoalmente, me deixa muito desconfortável”, disse. “Me reservo a não responder sobre casos específicos”, reforçou.
"Eu não tenho ideia do que eu teria que decidir se for decidir, de modo que eu acho que eu não posso ou deva me pronunciar sobre esse caso que está no STF", disse inicialmente. "A regra diz que, em princípio, o juiz que não ouviu o relatório [do ministro-relator] e não participou dos debates não participa do julgamento. Me parece que essa regra é correta", afirmou.
Zavascki disse que é o principal interessado em esclarecer a questão “para que não paire qualquer dúvida a respeito de eventuais motivos que possam ter determinado minha escolha”. Ele lembrou, porém, que a Lei Orgânica da Magistratura impede que juiz se pronuncie a respeito de processo em curso, mas concordou que seria uma contradição se dizer habilitado a votar no processo e ao mesmo tempo pedir vista.
“Dar-se por habilitado e pedir vista é uma contradição”, disse Zavascki. “Não há possibilidade de dar-se por habilitado e pedir vista”, reforçou.
Ele minimizou ainda a sua participação no julgamento. "Um voto a mais num julgamento com dez membros é absolutamente irrelevante porque o resultado será absolutamente igual. Se houver empate de cinco a cinco, tendo o presidente votado, o 11º voto jamais pode beneficiar o acusado, porque o acusado está beneficiado pelo empate."
A indicação de Zavascki em meio à análise do mensalão --que atinge principalmente o PT-- foi visto com desconfiança pela oposição ao governo de Dilma. Alvaro Dias (PR), líder da bancada do PSDB no Senado, primeiro dos senadores inscrito para questionar o candidato ao Supremo, perguntou se o ministro pretendia participar do julgamento , pergunta que foi repetida por Pedro Taques (PDT-MT). Na primeira rodada de perguntas, também levantaram questionamentos os parlamentares Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), Aloysio Nunes (PSDB-SP) e Eduardo Suplicy (PT-SP). Segundo Eunicio Oliveira, havia um total de 25 senadores inscritos para perguntas.
Após o encerramento da sabatina, o senador Pedro Taques disse que o Senado tem que cumprir seu papel. "O que eu sei é que existe a necessidade que o Senado cumpra o seu papel constitucional e não faça da sabatina um convescote entre amigos até em homenagem ao próprio ministro, que é um homem de bem, que tem uma vida pública decente, com conhecimento notável da ciência jurídica. Agora, os senadores não podem ser impedidos de votar.”
Papel do Judiciário
O magistrado disse em sua exposição inicial, de cerca de 20 minutos, que o papel do Judiciário no Brasil precisa ser redefinido. "O Judiciário ainda passa pela necessidade de definir corretamente as funções de seus tribunais superiores. Os dois grandes tribunais da federação passam por um período de acomodação de definição do seu perfil. Exige definição no âmbito do Judiciário", afirmou Zavascki, que é atualmente ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Veja quem indicou os ministros do STF
Ministro: | Indicação: | Empossado em: |
Ayres Britto (presidente) | Luiz Inácio Lula da Silva | 25 de junho 2003 |
Celso de Mello | José Sarney | 17 de agosto de 1989 |
Marco Aurélio | Fernando Collor de Mello | 13 de junho de 1990 |
Gilmar Mendes | Fernando Henrique Cardoso | 20 de junho de 2002 |
Joaquim Barbosa | Luiz Inácio Lula da Silva | 25 de junho de 2003 |
Ricardo Lewandowski | Luiz Inácio Lula da Silva | 16 de março de 2006 |
Cármen Lúcia | Luiz Inácio Lula da Silva | 21 de junho de 2006 |
Dias Toffoli | Luiz Inácio Lula da Silva | 23 de outubro de 2009 |
Luiz Fux | Dilma Rousseff | 3 de março de 2011 |
Rosa Weber | Dilma Rousseff | 19 de dezembro de 2011 |
De acordo com o artigo 101 da Constituição, para ocupar uma cadeira de ministro no Supremo, o indicado deve ter mais de 35 e menos de 65 anos de idade, além de ser reconhecido pelo saber jurídico e "reputação ilibada" (sem manchas).
Após a sabatina, o nome de Zavascki ainda precisará ser confirmado em votação no plenário do Senado, o que não tem data para acontecer. Desde a saída de Peluso, no início de setembro, o STF tem trabalhado com apenas dez ministros da Corte.
Os senadores suspenderam às 16h30 a sabatina para que pudessem dar início à ordem do dia no plenário do Senado, que deve votar a MP do Código Florestal ainda nesta terça. A data em que a sabatina será retomada ainda não foi definida.
O presidente da CCJ descarta reconvocar a comissão hoje. Disse que isso pode acontecer amanhã ou então somente quando o Senado retomar os seus trabalhos –o que, segundo ele, depende do presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). “Hoje acho muito difícil, acho que não vai dar. Vai depender da convocação do Senado.”
Sobre o eventual descontentamento por parte de senadores que considerarem que Zavasckis não respondeu à pergunta feita, Oliveira disse que ele pode votar pela não aprovação do ministro.
“Votar contra ou a favor está no direito do senador. O voto é secreto. O senador faz um questionamento e não se sente satisfeito com a resposta, o que ele pode fazer é votar contra [a aprovação do ministro Teori Zavascki].”
Na saída da sala da comissão, o ministro não quis dar entrevista à imprensa. Perguntado se havia ficado decepcionado com a suspensão da sessão, disse apenas: “Faz parte do processo democrático".
Julgamento sobre Palocci
Alvaro Dias também questionou Zavascki sobre o ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci. Zavascki foi o responsável pelo voto condutor que absolveu Palocci de um processo por improbidade administrativa que chegou ao STJ. Em novembro de 2010, todos os ministros da 1ª Turma do STJ seguiram a manifestação de Zavascki favorável a Palocci, então coordenador da vitoriosa campanha de Dilma.
“A jurisprudência aplicada naquele caso [Palocci] é o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça”, respondeu. “Nós não podemos suspender direitos políticos de um prefeito ou de um governador porque teve problema em uma licitação por má interpretação da lei. Temos aí uma ilegalidade, mas não um ato que leve a sanção tão grave que leve à perda do cargo."
Terceiro inscrito, o senador Pedro Taques (PDT-MT) questionou sobre a condenação do STF e o trânsito em julgado. Taques também questionou sobre uma convenção que trata de enriquecimento ilícito e transconstitucionalismo. Outra questão posta pelo senador de Mato Grosso foi a teoria do domínio do fato (é uma análise da responsabilidade quando não há uma prova direta relacionada ao mentor do crime), que tem sido levantada por vários magistrados do Supremo no julgamento do mensalão. Se levada à frente, a teoria do domínio do fato poderia levar à condenação, por exemplo, do ex-ministro José Dirceu mesmo sem fatos documentais.
“Essa é uma questão de natureza constitucional de altíssima indagação”, respondeu Zavascki. “Nada impede que se interprete hoje a Constituição de uma maneira e amanhã se interprete de hoje”, afirmou. “O que existe é a constante mudança da jurisprudência, esse é o problema. Segurança jurídica é também previsibilidade”, completou.
Perfil
Teori Zavascki tem 64 anos e é ministro do STJ desde maio de 2003. No STJ, atua na Corte Especial --órgão responsável, entre outros processos, pelo julgamento de autoridades com foro privilegiado--, na Primeira Turma e na Primeira Seção, especializadas em matérias de direito público.
Conhecido como um dos juízes mais técnicos do STJ, Zavascki defende a racionalização dos trabalhos do Judiciário e a necessidade de rediscutir o papel do STJ, que hoje, diz, é de revisão das decisões estaduais.
Zavascki nasceu em Faxinal dos Guedes (SC). É mestre e doutor em direito processual Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e atualmente é professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Durante a sabatina, ele agradeceu a presença da mulher, que é juíza federal, e da filha Liliana, advogada, na plateia do Senado.
O magistrado fez carreira na advocacia, tendo integrado a área jurídica do Banco Central e do Banco Meridional do Brasil. Na magistratura, fez parte do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, antes de chegar ao STJ, em 2003.
“O Teori é um excelente juiz, preparado, sério, estudioso, ponderado e prudente. Eu não teria vocabulário suficiente para elogiá-lo”, afirmou ao UOL o desembargador aposentado Amir José Finocchiaro, que trabalhou por cerca de dez anos com Zavascki no TRF-4.
Entre os livros que escreveu, destacam-se "Processo de Execução – Parte Geral" e "Comentários ao Código de Processo Civil".
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