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Ministro da Justiça nega envolvimento de Lula na Operação Porto Seguro

Ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, durante depoimento na Câmara sobre Operação Porto Seguro - Evaristo Sá/AFP
Ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, durante depoimento na Câmara sobre Operação Porto Seguro Imagem: Evaristo Sá/AFP

Camila Campanerut

Do UOL, em Brasília

04/12/2012 15h43Atualizada em 04/12/2012 17h01

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, negou nesta terça-feira (4) em audiência na Câmara que as ações da ex-chefe de gabinete da Presidência da República, Rosemary Noronha, tinham a anuência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Ela tentava fazer intermediação, [mas] imaginar que o presidente Lula estivesse por trás disso está, ao meu ver,  desmentido por aquilo que eu vi e a Polícia Federal não tem nenhuma dúvida (...), o presidente Lula não estava envolvido”, afirmou o ministro. 

Segundo o ministro, Rose, como é conhecida, tentava, através de sua função, mostrar proximidade com o ex-presidente, para conseguir e fazer favores. Por isso, ainda de acordo com Cardozo, ela foi indiciada por três crimes: tráfico de influência, corrupção ativa e falsidade ideológica.

Cardozo insistiu que a função de Rosemary no esquema, descoberto pela operação Porto Seguro da Polícia Federal, era a de colaboradora, mas não integrante da quadrilha encabeçada pelo ex-diretor da ANA (Agência Nacional de Águas) Paulo Vieira. Ele é apontado como chefe da quadrilha que vendia pareceres técnicos e fazia tráfico de influência.

 

“Ela não participava do núcleo. Ela tinha uma relação sim indevida, sim, criminal. Não estou defendendo a senhora Rose, estou fazendo a definição técnica”, argumentou o ministro. 

Contrariando informações que saíram na imprensa, Cardozo negou ainda que polícia tenha feito gravações de ligações telefônicas feitas por Rosemary.

“Não há diálogos gravados entre ela [Rosemary] e terceiros. Não há decisão judicial que ampare isso. Não existem estas gravações. Cento e vinte e poucas, não sei de onde tiraram aquilo, não consigo entender de onde vem tanta criatividade”, afirmou Cardozo, negando, inclusive, diálogos entre Lula e Rose.

Durante a audiência, que começou pouco depois das 10h da manhã, parlamentares da oposição questionaram Cardozo várias vezes sobre a relação entre Lula e Rosemary.

"Por que não foi solicitada a quebra do sigilo da Rose? Por que gravações dela foram descartadas? Consta que ela acompanhou Lula em vários países e uma das notícias é de que algumas dessas viagens que ela teve oportunidade de participar e não estava registrada oficialmente como participante", questionou o deputado Mendonça Filho (DEM-PE).

Mais defesas

No último dia 30 de novembro, o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência da República) foi o primeiro integrante do Executivo do governo Dilma a fazer a defesa do ex-presidente.  “Não tem nenhuma complicação para o presidente Lula”, afirmou aos jornalistas.

Durante os dois mandatos de Lula (de 2003 a 2010), Carvalho foi seu chefe de gabinete.

Em entrevista concedida na última segunda (2), o presidente do PT, Rui Falcão, frisou que o partido da presidente Dilma Rousseff e do ex-presidente Lula não está envolvido no caso, apesar de dois filiados da legenda terem sido indiciados: Rosemary Noronha e Paulo Vieira.

“Nós lamentamos que alguém que estava num posto de representante do governo federal possa ter dado margem a esse tipo de fatos que a imprensa vem revelando a partir da investigação da Polícia Federal. O PT não convalida nenhuma política desse tipo. Ninguém mais do que o governo do presidente Lula e da presidente Dilma combateu a corrupção e o tráfico de influência”, afirmou Falcão.

Para Falcão, a imagem do presidente Lula não ficará manchada com mais este episódio de corrupção, pois, segundo ele, a imagem do petista “está muito associada às grandes transformações que o Brasil vem vivendo nestes últimos dez anos". 

Ao final da audiência pública, o presidente da comissão de Segurança Pública da Câmara, deputado Efraim Filho (DEM-PB), entregou ao titular da Justiça um pedido para que seja feito um levantamento das informações sobre as saídas e entradas oficiais de Rosemary Noronha durante atividades profissionais no gabinete da Presidência e a conferência das mesmas viagens com o passaporte dela.

O objetivo do requerimento é verificar se houve embarque dela em viagens sem o conhecimento oficial.  O resultado do levantamento deverá ser entregue à Polícia Federal e não aos parlamentares, para incluir nas investigações da operação.

Procurada pela reportagem, a assessoria do ex-presidente disse que não iria comentar o assunto, mas que todos os responsáveis pela investigação "já afirmaram que o ex-presidente não tem relação com os ocorridos e não está sendo investigado".

Entenda a operação Porto Seguro

Iniciada em março de 2011 e divulgada no último dia 23 de novembro, a Operação Porto Seguro da Polícia Federal resultou em 43 mandados de busca e apreensão, seis prisões e o indiciamento criminal de 18 pessoas no Estado de São Paulo e no Distrito Federal.

Os envolvidos participavam, segundo a polícia, de fraudes e compra de pareceres técnicos de diversos órgãos públicos para beneficiar empresas privadas. De acordo com a Polícia Federal, Paulo Vieira, diretor afastado da ANA (Agência Nacional de Águas), seria o chefe da quadrilha que praticava corrupção e tráfico de influência em órgãos do governo federal.

O esquema foi denunciado pelo ex-servidor do TCU (Tribunal de Contas da União) Cyonil Borges. O ex-auditor recebeu a oferta de R$ 300 mil por um parecer, aceitou parte do dinheiro, R$ 100 mil, mas, se arrependeu, devolveu a quantia e delatou o caso à polícia. Em entrevista à "Folha de S.Paulo", ele diz que nunca tocou no dinheiro para não caracterizar o crime de corrupção.

Além de Paulo Vieira, seus dois irmãos, Rubens Vieira, ex-diretor da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), e Marcelo Vieira, empresário, são acusados de participar do esquema. Rubens e Paulo foram soltos na última sexta-feira (30).

Por meio de interceptação telefônica, a PF identificou pagamentos feitos por Paulo Vieira a ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Noronha. A filha dela, Mirelle Nóvoa Noronha Oshiro, já foi exonerada do cargo comissionado de assessora técnica na Anac, onde trabalhava com Paulo Vieira.

Considerada como “peça-chave” do esquema, Rosemary teria a função de intermediar reuniões de “autoridades” com os interessados nos pareceres técnicos pagos e na indicação de pessoas para cargos em agências do governo. Para isso, ela usava sua proximidade com o ex-presidente  Luiz Inácio Lula da Silva.

Foi Lula quem nomeou Rosemary para o cargo em 2003. Até a semana passada, ela foi mantida pela presidente Dilma Rousseff. Rosemary era quem cuidava da agenda de Lula em São Paulo.

Outros órgãos como o MEC (Ministério da Educação), a AGU (Advocacia Geral da União) e a SPU (Secretaria do Patrimônio da União) também tiveram servidores citados como membros do esquema. O ex-advogado-adjunto da União, José Weber Holanda, foi exonerado do cargo e sofre um processo de investigação no órgão pela negociação de um parecer com Paulo Vieira.  Ele era o braço direito de Luís Inácio Adams na AGU, de quem era ainda amigo pessoal. Em entrevista,  Holanda negou fazer parte de um esquema de venda de pareceres jurídicos do governo para favorecer interesse privado e disse não ter nada a esconder.

No MEC, dois servidores foram afastados: o consultor jurídico Esmeraldo Malheiros dos Santos e Márcio Alexandre Barbosa Lima. O primeiro seria o intermediário para pareceres favoráveis e foi exonerado. O segundo foi quem ofereceu a senha a Paulo Vieira para consultar informações da faculdade da família de Vieira no ministério.

Na Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), vinculada ao Ministério dos Transportes, três servidores estão entre os 18 indiciados. Dois deles foram exonerados: Ênio Soares Dias, chefe de gabinete da agência e Glauco Alves Cardoso, procurador-geral do órgão. O ouvidor Jailson Santos Soares foi afastado.

A assessora da SPU Evangelina de Almeida Pinho também foi exonerada do cargo e uma sindicância interna foi instaurada no órgão para apurar possíveis irregularidades praticadas na secretaria.

Outras conversas interceptadas pela PF identificaram que o grupo investigado teria interesse em regularizar um empreendimento portuário na Ilha de Bagres, em Santos (SP), de propriedade do ex-senador Gilberto Miranda, e se reuniu com o número dois da SEP (Secretaria de Portos), Mário Lima Júnior, que continua no cargo.