Militares "saíram de fininho" para evitar humilhação da queda, diz Gabeira

Para o jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira, a ditadura militar foi obrigada a "sair de fininho" durante a década de 80, uma vez que a situação econômica do país --impulsionada pelo "milagre" que ocorrera durante o governo Médici-- já não apresentava mais sinais de crescimento.
"A perda da legitimidade, o distanciamento da população, a dificuldade em manter a situação econômica da forma que eles queriam, enfim, tudo os obrigou, de uma certa maneira, a buscar uma retirada. O golpe militar não caiu propriamente como se cai no bojo de grandes manifestações. Ele saiu de fininho para não ter que lidar com a humilhação de cair de quatro", disse.
Gabeira afirmou que o principal erro do regime militar foi não ter "revisto o grande fôlego" obtido com o progresso econômico desencadeado após 1968, quando o PIB (Produto Interno Bruto) começou a crescer.
"Em um primeiro momento, teve uma dificuldade para se instalar do ponto de vista econômico. Mas conseguiu avanços econômicos interessantes, aprofundando a integração do Brasil na economia internacional. Essa integração e algumas medidas econômicas adotadas acabaram dando a eles um fôlego grande, mas era um fôlego que teria que ser revisto mais tarde", disse.
A trajetória de Gabeira, que chegou a participar da luta armada no decorrer da ditadura, é marcada por um ponto de inflexão, conforme ele próprio define o golpe de Estado de 1964.
Natural de Juiz de Fora --de onde saíram as tropas que marcharam rumo ao Rio de Janeiro com o objetivo de derrubar o governo João Goulart--, Gabeira instalou-se em um apartamento em Copacabana, na zona sul da cidade, onde vivia com outros quatro colegas de profissão e também militantes de esquerda.
Em 1964, trabalhava como redator no "Jornal do Brasil", com sede na avenida Rio Branco --palco das grandes manifestações na então capital da Guanabara. No dia 31 de março daquele ano, relembrou Gabeira, havia um clima de incredulidade entre os que se opunham ao golpe.
Anos antes, mesmo com a resistência dos ministros militares, Jango havia sido empossado depois de uma mobilização que ficou conhecida como "cadeia da legalidade".
"Pensava que aquele momento poderia ser uma reprodução do momento anterior, e que teríamos uma nova cadeia da legalidade, que a rádio Mayrink Veiga continuaria no ar, que nós iríamos resistir e que o golpe fracassaria", disse.Depoimentos sobre a ditadura militar
Internautas lembram o dia do golpe
'Golpe de 64 tornou-se inevitável', diz José Serra
FHC: 'Além dos militares, não sei qual força poderia impor situação nova'
Lula usa 50 anos do golpe para pedir participação popular
Ditadura tinha vínculos com nazistas, diz integrante da Comissão da Verdade
Frei Betto: CIA financiou Igreja em marchas pró-golpe
"Voltar ao Brasil seria reabrir ferida", diz exilado na Suécia
Seis frases revelam a visão de um militar que viveu o golpe de 1964
Para coronel Telhada, guerrilha contra ditadura e PCC são "a mesma coisa"
Jango tinha tropas leais e poderia enfrentar o golpe, diz Pedro Simon
"Josés" do esporte e do teatro enfrentaram censuras diferentes
Militares "saíram de fininho" para evitar humilhação da queda, diz Gabeira
Cristovam Buarque: Reformas de Jango teriam evitado violência urbana
Opositor do regime, Suplicy cresceu em família que apoiou golpe
Gabeira afirmou ainda ter sido acometido por uma "sensação de tristeza profunda" ao constatar que as tropas que avançavam em direção ao Rio não seriam contidas.
No fim da década de 60, Gabeira entrou para a resistência armada contra o regime militar, cujo objetivo era fazer uma revolução socialista e instituir a ditadura do proletariado. Um dos episódios mais famosos narrados pelo jornalista é o do embaixador americano Charles Elbrick, em 1969.
"De certa maneira, o movimento armado no Brasil tensionou muito a ditadura militar. A ditadura prendia e o sequestro [de autoridades que eram posteriormente "trocadas" por presos políticos] soltava", afirmou ele.Saiba mais sobre a ditadura militar
Você na ditadura: Jogue e descubra como você viveria após o golpe de 64
Dez razões para não ter saudades da ditadura
Como era a Dilma que lutou durante a ditadura? Companheiros respondem
Como a ditadura sequestrou crianças e torturou famílias para obter delações
Documentos reunidos por Elio Gaspari mostram bastidores da ditadura
"Que país é este?" Veja quem disse essa e outras frases da ditadura
A ditadura em 40 datas históricas
O golpe de 1964 e o regime militar em seus detalhes
Músicas de resistência marcaram os 21 anos de ditadura no Brasil
Todos os detalhes do dia do golpe
O que você conhece sobre a ditadura? Teste-se
O que a censura faria com o "Show das Poderosas"
Acabou sendo preso na mesma época e passou por vários países em dez anos de exílio. Nesse período, testemunhou no Chile, em 1973, o golpe militar que derrubou o presidente Salvador Allende. Posteriormente, refugiou-se na Suécia, onde passou a maior parte do exílio.
"Você diz que vai resistir, você parte para resistir, mas o que você vai fazer, de verdade, é fugir", escreveu em seu livro "O que é isso, companheiro?", que relata histórias relacionadas ao regime militar a partir das experiências do jornalista.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Apenas assinantes podem ler e comentar
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia os termos de uso