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Leia a transcrição da entrevista de Eduardo Jorge ao UOL e à Folha

Do UOL, em Brasília

14/06/2014 06h00

Eduardo Jorge, pré-candidato a presidente pelo PV, participou do Poder e Política, programa do UOL e da "Folha" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 13.jun.2014 no estúdio do grupo Folha em Brasília.

 

 

Eduardo Jorge - 13.jun.2014

Narração de abertura [EM OFF]: Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho tem 64 anos. Nasceu em Salvador, na Bahia. Passou a juventude na Paraíba.

Formado em medicina pela USP, no início da carreira Eduardo Jorge foi aprovado num concurso de médico sanitarista do Estado de São Paulo.

Iniciou sua militância política em 1968, como membro do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, o PCBR. Foi preso e processado pela ditadura militar.

Mais tarde, Eduardo Jorge ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores, em 1980. Foi eleito deputado estadual e quatro vezes deputado federal pelo PT.

Foi secretário municipal de Saúde de São Paulo nas gestões de Luiza Erundina e Marta Suplicy.

Em 2003, Eduardo Jorge deixou o PT após divergências com a cúpula da legenda. Filiou-se então ao Partido Verde. Pelo PV, foi secretário municipal de meio ambiente de São Paulo nas gestões de José Serra e Gilberto Kassab.

Neste ano, Eduardo Jorge deve ser o candidato do PV a presidente da República.

Folha/UOL: Olá, bem-vindo a mais um Poder e Política - Entrevista. Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo e do portal UOL. A gravação é realizada no estúdio do Grupo Folha em Brasília. 
O entrevistado desta edição do Poder e Política é Eduardo Jorge, do Partido Verde, que deve ser o candidato a presidente pelo PV, neste ano.

Folha/UOL: Olá, como vai? Tudo bem?
Eduardo Jorge: Tudo bem, Fernando. Obrigado pelo convite.

O Partido Verde elegeu, em 2010, 13 deputados federais, uma bela bancada para um partido que não é tão grande. Hoje tem uma bancada de oito deputados. A meta neste ano é eleger quantos?
A nossa meta é ter, pelo menos, um deputado ambientalista de confiança, de qualidade em cada Estado.

Seriam 27.
27 em cada Estado, mas é claro, em alguns Estados nós podemos ter mais. Em São Paulo, provavelmente, nós vamos ter mais do que isso. Portanto, o esforço nosso, inclusive com a divulgação de uma diretriz de programa desde março, foi o primeiro partido que divulgou 32 páginas com várias políticas públicas, é fazer um forte trabalho de formação política, vamos dizer assim, uma dose maior de ideologia de um partido que quer ser de vanguarda para que não aconteça isso que você falou: éramos treze, e viramos oito, né?

Isso.
Então, a gente quer quantidade, claro, porque cada homem, cada mulher no Parlamento é um voto precioso, a gente sabe disso, mas a gente está tentando ter qualidade principalmente, para garantir que tenham pessoas preparadas com os ideais do PV.

Mas esses 13 deputados de 2010 foram reeleitos muito por conta da grande votação que o PV teve no país inteiro com a então candidata a presidente Marina Silva ou não?
Não foi, não foi não, Fernando. A gente teve praticamente a mesma coisa já no período anterior à eleição que nós disputamos essa coligação PV e Marina. Na verdade, não aumentamos nada. Nenhum deputado a mais. O voto da coligação PV e Marina, na verdade, foi um voto muito complexo. Você que é especialista nisso deve até hoje se dar tratos na bola para explicar aqueles 20% de votos. Teve muito voto em protesto, teve votos dos ambientalistas mais severos, teve voto religioso muito forte, a Marina tem um apelo muito forte nessa área, né. Mas não se refletiu no aumento da bancada, isso foi uma coisa interessante.

Ou seja...
Interessante não, ruim para a gente.

Ou seja, os 13 de 2010 agora praticamente dobrariam. Essa é a expectativa do partido?
Essa é a expectativa...

Essa é uma expectativa realista?
Eu tenho andado, porque eu quando, em fevereiro, resolvemos que estaríamos no primeiro turno, eu pedi uma coisa: que primeiro se preparasse um programa, uma diretriz de programa porque sendo um partido que quer defender o parlamentarismo, primeiro as ideias e depois os homens e mulheres candidatos. Então nós fizemos um programa, isso foi colocado no nosso site, em março, e em seguida combinamos com a direção nacional que nós iriamos discutir esse programa em todas as capitais. Eu já fui em 20 capitais, 20. Comecei lá em Boa Vista, em Roraima, estava dizendo a você, é uma cidade muito lindinha, fica na margem de um rio maravilhoso... Que vista, que vista... Bom, de Boa Vista fui até Porto Alegre, volte por Aracaju, Belém, bati Teresina. O que eu vejo, Fernando? Que o PV tem muita gente ligada a ele pelo Brasil afora e eu fiquei surpreso porque eu não conhecia o PV no Brasil todo, né. Então, eu tenho uma boa expectativa, com o programa, com ideias, com coisas a falar que é o único patrimônio que o PV tem. O PV não está ligado a grandes corporações sindicais, sejam trabalhistas ou empresariais, grandes construtoras, grandes máquinas públicas...O patrimônio do PV são as ideias. Como a gente alinhou bem as ideias dessa vez, eu acho que o nosso pessoal vai ter o que falar, o que conversar com os eleitores. Portanto, eu acho que a gente tem chance de chegar em uma bancada bem maior dessa vez.

Então estamos falando de uma expectativa de ter cerca de 27 deputados...
Dobrar a bancada.

Um por cada uma das Unidades da Federação, 26 Estados e o Distrito Federal. E no Senado, qual é a expectativa?
No Senado, que eu lembro, dessas 20 capitais que eu fui, eu acho que a gente vai ter três ou quatro candidatos. Mas aí a chance é mais remota porque é uma eleição majoritária.

Certo. E nos Estados, nomes para disputar governos estaduais. Qual é a situação? Hoje há expectativa?
O que eu tenho dito, coerente com a posição nossa nacional de lançar um candidato no primeiro turno, porque em um partido ideológico, de vanguardas, de ideias, o sentido do primeiro turno é esse: abrir o espectro para as pessoas votarem com a cabeça e com o coração. Não ser obrigado no primeiro turno a já escolher, não vamos dizer o menos ruim, mas... Um outro candidato que pareça um pouco com a gente. A gente quer ter no primeiro turno a chance das pessoas que valorizam a questão ambiental, do desenvolvimento sustentável e votar no primeiro turno no candidato da cabeça e do coração, e é a mesma coisa que deveria ser nos Estados, mas na verdade...

Quantos candidatos próprios deve ter?
Isso que eu vou dizer para você, a gente tem que respeitar a implantação do PV nos Estados. Você não pode dar uma ordem de Brasília artificial. Então a gente tinha deixado que a direção estadual, que os militantes estaduais montem a sua estratégia local, a sua tática local. O que eu, recenseando assim, eu sei que a gente vai ter candidato em São Paulo, no Paraná, no Pará, em Tocantins... Será que eu estou esquecendo algum? Quatro ou cinco candidatos a governador pelos Estados.

Marina Silva, pelo PV, teve cerca de 20 milhões de votos, em 2010. A tua expectativa em 2014 é receber quantos votos na campanha para presidente da República?
Não sei, Fernando.

Tem uma meta a perseguir?
Não sei porque nós estamos no início do campeonato. O campeonato mesmo começa em julho e em campeonato a gente sabe: tem os favoritos, tem os três grandes favoritos aí que são verdadeiros aspirados de pó de apoiadores de partidos, de apoio, pelo Brasil afora, né. Nós vamos praticamente sozinhos para uma campanha como essa, somente com as nossas ideias. Eu não sei qual vai ser a repercussão disso, não me arrisco a prever.

Mas tem uma meta a ser perseguida pelo menos?
A meta de verdade é tentar chegar no segundo turno. Se eu entro no primeiro turno eu tenho que tentar chegar no segundo turno.

O sr. acha que...
Mas como isso é uma coisa muito difícil, né, a meta nossa é ter a votação maior possível, expressar a força orgânica do ambientalismo da maneira mais forte possível, no primeiro turno, para poder influenciar no segundo turno de forma consequente, coisa que nós não fizemos, diga-se de passagem, em 2010, que foi um erro político muito grave. Então, é isso: você tem que expor as suas ideias, e como vamos fazer, eu pelo menos penso, uma campanha baseada em meia Atenas e meia Esparta, né? Na razão e na austeridade. Uma campanha austera nos meios e baseada na razão e no Iluminismo, e esperar, confiar na capacidade do povo de nos julgar. Mas, eu insisto, tentar alcançar o maior número possível e influenciar no segundo turno. No segundo turno, se o povo escolher o candidato A e o candidato B, que é o direito do povo e para isso que existe segundo turno, o PV deve tentar influenciar essas campanhas, coisa que não fez, insisto, e foi um erro em 2010.

Neste ano haverá algum partido coligado ao PV?
Não.

Em 2010 o erro foi cometido por qual razão?
Você está falando do segundo turno?

Do segundo turno.
Porque o primeiro turno foi um estrondo de vitória.

O primeiro turno foi uma vitória grande no sentido de ter 20 milhões de votos para o partido, foi um fato inédito.
Uma coisa fantástica.

No segundo turno não houve uma participação efetiva, por quê?
É uma coisa, eu me desgastei muito nesse processo do segundo turno porque eu defendi que com 20% de votos, quase 20 milhões de votos e tendo dois candidatos de nível muito bom, que era a Dilma e o José Serra, o PT e o PSDB, dois partidos muito fortes e com uma contribuição para a história recente democrática muito importante, seria possível que o PV não discutisse internamente com A e com B, não conseguisse influenciar essa campanha no segundo turno e um projeto de país para os próximos períodos, era possível. Mas, no entanto, a visão foi que, foi uma visão, eu acho, nacionalista de partido e também de muito... O grupo em torno da Marina deixá-la preservada para a eleição futura e querer garantir esse capital íntegro para uma disputa posterior. Isso foi uma posição dela, da candidata Marina, e que a direção do PV concordou, uma posição muito errada, na assembleia que isso foi decidido, parecia uma assembleia soviética, todo mundo levantava a mão apoiando e eu levantei a mão sozinho contra, na primeira fila, e devo ter ficado marcado por isso para o resto da vida. Mas então, isso daí foi uma posição errada, foi como se você lavasse as mãos. “Já que eu não fui para o segundo turno, eu caio fora do jogo e deixo o povo se virar”. Isso é errado porque teve consequências, isso decidiu a eleição, decidiu a eleição. Naquele momento, quando o PT pensava que ia ganhar o primeiro turno, não ganhou. Você sabe que quando um time acha que vai ganhar e ele tem uma prorrogação, ele entra meio balançado. Haveria condições do PV ter negociado tanto com o PT ou com o PSDB condições muito importantes para haver uma inflexão em defesa do desenvolvimento sustentável, coisa que nunca houve e a gente recusou isso.

E naquele momento, em 2010, no melhor do seu juízo, qual teria sido a melhor opção para o PV no segundo turno?
Eu escrevi um artigo sobre isso.

Sim.
Na Folha até.

Eu me lembro, mas enfim, para recapitular aqui, José Serra ou Dilma Rousseff?
Eu fiz um artigo que se chamava “Verde, azul e vermelho”, que a Folha publicou e que teve uma grande repercussão, positiva e negativa para mim. Os que gostaram, gostaram muito e os que ficaram com raiva, ficaram com mais raiva de mim. E eu avaliava assim o PT e o PSDB –isso, inclusive, era uma tese minha no PT– são partidos da mesma família, da grande família socialista, uma social democrata e o outro é um semimarxista, vamos dizer assim...

É isso.
Já foi mais, é menos, mas são da mesma família. E eles têm proximidade em posições políticas, dizia isso lá em 1990, na época das campanhas do Lula, do Mário Covas, do Franco Montoro, eles já deviam ter se acertado para ter um governo reformista consistente que não ficasse dependendo de negociar migalhas com partidos conservadores para conduzir o Brasil para uma reforma muito forte que a gente precisava. Eu já defendi essa tese na época que eu era da direção do PT, há muito tempo, há muito tempo.

Mas em 2010?
Eu analisei o seguinte: do ponto de vista econômico, do ponto de vista social, PT, PSDB, Dilma e Serra são muito parecidos, uns com mais ênfase aqui, um com mais ênfase lá, mas são parecidos. A diferença do ponto de vista econômico e do ponto de vista social. A diferença, do nosso ponto de vista do desenvolvimento sustentável, estaria ali na questão do meio ambiente. E a minha experiência, tanto com o PT como com o PSDB é que o PSDB, o José Serra particularmente, ele era mais aberto às posições do desenvolvimento sustentável, já tinha provado isso na Prefeitura de São Paulo. Tornou a cidade de São Paulo uma referência em vários pontos dessa questão do meio ambiente no mundo. Portanto, por essa questão eu desempatava por uma coligação com o José Serra. Econômica, social, Dilma, Serra, PT, PSDB muito parecidos, empate. A questão do meio ambiente, que é uma questão muito cara ao PV, o Serra é a mais aberto, então eu optaria pelo José Serra, mas antes disso eu queria que o PV decidisse se era Dilma ou Serra, porque tinha dilmistas no PV e serristas no PV, mas eu votei por escrito a minha posição e expliquei o porquê.

Agora, neste ano de 2014, é muito provável, claro que pode haver mudança, mas é muito provável que os finalistas dessa eleição, no segundo turno se houver, sejam novamente PT e PSDB. Aí como que vai ser encaminhada a discussão dentro do PV a respeito do segundo turno?
Eu não tenho a mesma experiência com o Aécio que eu tive com o José Serra, porque com o José Serra eu vi que ele é um sujeito que tem abertura para o meio ambiente, e é verdade. E nos não governávamos uma cidade qualquer, uma cidade-país. São Paulo, 11 milhões de habitantes, é maior que a Suécia, do que Cuba, do que Portugal. Então, tinha essa segurança, vamos dizer assim, que ele teve abertura para as posições do PV e nós implementamos muitas questões. A primeira lei climática do Brasil, antes do governo federal e antes do governo estadual, primeira lei de mudança climática e combate ao aquecimento global fomos nós, em São Paulo, que fizemos. E isso, inclusive, fez pressão no governo estadual em Brasília para ter as suas leis climáticas. Por exemplo, um exemplo, tinha essa segurança. Eu não tenho a mesma segurança com o Aécio, portanto, eu acho que se o PV sair fortalecido na eleição, por isso que eu preciso de qualquer apoio para ser fortalecido e chegar no segundo turno e influenciar o segundo turno, nós vamos ter que analisar com muito cuidado e ver como é que o PT e o PSDB, se forem esses dois...

Claro.
...Ninguém sabe, você também não sabe. As coisas estão muito tumultuadas. Qual dos dois vai conseguir, e mesmo se for o PSB também, quais são as aberturas que eles têm para a posição avançada do PV.

Mas, no melhor do seu juízo hoje, até para... Colocar os três juntos: Dilma Rousseff, PT, Aécio Neves, PSDB, Eduardo Campos, PSB. Nesses três há alguma distinção?
Não, para mim não, porque veja: o caso de Dilma, PT, é um partido claramente do século 20, nesse aspecto do meio ambiente. Continua sendo, por exemplo, o partido das montadoras de automóveis, basta qualquer espirro de São Bernardo [do Campo] para se abalar Brasília correndo para lá para dar subsídio, dar ajuda, da socorro. O PT, citando essa questão genética, uma indústria automobilística, uma indústria superada, uma indústria datada, e o petróleo. O petróleo, um combustível que tende a ter uma importância ainda grande, mas deve ser diminuída a sua importância e ser substituído pelas energias renováveis, como os países previdentes já estão se preparando e o Brasil dormindo em berço esplêndido com o governo atual continua apostando em uma indústria automobilística e jogando subsídio para espalhar carros e motos pelo Brasil inteiro e no petróleo. Isso, portanto, classifica o partido PT, como partido do século 20.

E os outros dois?
O PSDB, o Aécio, ele na questão social, ele deve. Qual foi o grande projeto social que ele desenvolveu nesse tempo todo? E o desenvolvimento sustentável não é só voltado para a questão de diminuir o desmatamento, proteger os mangues, os mares. É que claro que nós vamos sempre ser os campeões da defesa, mas o desenvolvimento sustentável é o equilíbrio entre a defesa do meio ambiente, uma economia verde e uma justiça social. Então, eu quero saber, em uma discussão com o Aécio, como vai ser os programas sociais porque o Brasil continua sendo um país muito desigual. Eu vejo! Essas andanças minhas me fortalecem. Nós melhoramos com a democracia, mas a gente continua um país muito injusto, muito desigual. E, finalmente, o Eduardo. O Eduardo Campos, o PSB, para mim é uma incógnita, é uma incógnita. É um rapaz muito novo, tem uma tradição familiar muito importante no Brasil, mas o PSB até ontem era um partido de defesa da energia nuclear. O Eduardo Campos queria colocar usinas nucleares pelo sertão de Pernambuco afora. Como é que ele fez, por exemplo, o porto lá de Suape? Uma coisa tão importante para Pernambuco. O nosso candidato, na época, com a Marina e com o PV denunciou dia e noite o trator na frente para fazer o porto. Ou seja, o equilíbrio ambiental e o econômico não aconteceu. E, finalmente, a grande obra dele é repetir o “abczinho” lá em Pernambuco. Dá todo o tipo de estímulo para instalar uma gigantesca fábrica de quê? De quê? De automóveis. Portanto, veja, a gente está, essa família, e eu digo, nós estamos diante desses três grandes, todos os três partiram, de um algum ponto de vista, do século 20. Todos os três da mesma família socialista. Um vermelho, um cor-de-rosa e um carmim. Então, eu não quero responder a você, não estou fugindo da sua questão do segundo turno, porque eu acho que a gente tem que ver quem realmente vai para o segundo turno, se nós não formos, e discutir concretamente as questões sociais e ambientais com eles.

O fato de Marina Silva, como está anunciado, ser a candidata a vice-presidente na chapa de Eduardo Campos, se for essa a chapa que for para o segundo turno, aproxima ou afasta o PV?
No presidencialismo imperial, que é outra coisa que nós estamos combatendo no nosso programa, porque nós estamos defendendo o parlamentarismo, o voto distrital misto e o voto facultativo como um tripé de reforma política necessária para você avançar na democracia representativa no Brasil. Mas, eu sei que isso é uma coisa difícil, nós não somos... Aqui não é uma ditadura, isso é uma coisa que depende de uma discussão muito profunda, de mudanças constitucionais, portanto, nós vamos continuar vivendo, no próximo mandato, esse presidencialismo imperial. É presidencialismo imperial. O candidato é Eduardo Campos, de um partido do século 20 também, igual ao PT, igual o PSDB, e o noivado lá não está indo muito bem, parece lá.

Por quê?
Bom, em parte, eu acho que o noivo e a noiva estão meio bicudos.

Marina deveria ter ficado no PV e discutido...
Sim, isso eu fiquei até o fim pedindo pelo amor de Deus, porque eu vindo de um partido forte como o PT, que tem uma estrutura de movimentos sociais, sindicais poderosíssima, e agora que tem um aparelho de Estado todo, ficou mais poderoso ainda, eu via a fragilidade do movimento político-ambiental. Tem muita simpática na opinião pública, muita gente quer ser verde, mas organicamente, as forças orgânicas, políticas, estruturadas do movimento ambientalista no Brasil é frágil. Então, se a gente teve a oportunidade de juntar um partido como o PV, que foi o fundador dessa ideia aqui no Brasil, o [Fernando] Gabeira, a Lucélia [Santos], o [Alfredo] Sirkis, o Herbert Daniel, voltaram do exílio e trouxeram essa ideia, o [José Luiz] Penna também. Esse grupo inicial, que veio do exílio, durante vinte e tantos anos, achincalhados pela direita e pela esquerda, conseguiram segurar essa bandeira. A gente tem que, eu sou novo no PV, entrei em 2003, sempre faço essa homenagem a eles. Sirkis, Pena, Gabeira, Lucélia, Hércules Daniel que trouxeram essa ideia para cá com todas as dificuldades de sobreviver no sistema político nosso que corrói e enferruja todos os partidos e a Marina é uma grande liderança, não só nacional, mas mundial. Nós tínhamos um casamento muito bom, para você ampliar e fortalecer o movimento ambientalista brasileiro do ponto de vista político e social. E se dividiram. Se dividiram porque novamente noivos bicudos, como estão agora Eduardo Campos e Marina, a mesma coisa, PV e Marina. Eu atribuo a responsabilidade aos dois: à direção do PV na época e à Marina. Não teve essa sensibilidade, essa tolerância, essa paciência...

Qual foi o fator principal do rompimento de Marina com o PV?
Existe um grupo em torno da Marina, eu não quero criticar a Marina, de jeito nenhum, aliás ela não é candidata, para que eu vou fazer isso? Mas existe um grupo em torno dela muito antipolítica. Já não queriam que a Marina viesse a ser candidata nossa em 2010, eu estava na reunião quando isso foi discutido. Queriam que ela ficasse fora, organizasse alguma ONG, fosse uma espécie de patrimônio das ONGs, uma espécia de pensamento crítico nacional. Ela que peitou esse grupo que está em torno dela e resolveu ser candidata, uma decisão acertada dela, em 2010. Mas depois, essa mesma entourage, falaram “o PV é muito trabalhoso, é muito heterogêneo, é muito desigual, nós temos chance de ter um partido à sua imagem e semelhança”. E foram alimentando essa ideia.  É claro que havia problemas e é claro que há problemas no PV que precisam ser resolvidos, democratizados, mas veja, isso que eu dizia na ocasião do debate. A presença dela iria ampliar bastante o PV e reformá-lo, ampliá-lo. É preciso paciência nisso daí. Na verdade, havia forças no PV que não estavam muito entusiasmados com a presença dela, e havia esse grupo que iria tirá-la e formar um partido à imagem e semelhança dela. É um direito fazer isso, mas isso eu acho que nunca tem bom futuro. Um partido à imagem e semelhança de uma pessoa.

A propósito de o Partido Verde ser heterogêneo. Há de fato algumas pessoas que têm uma imagem que, a princípio, quando alguém olha de longe fala “o que tem a ver um coisa com outra?” Vou citar o deputado Zequinha Sarney, que é um dos principais líderes do PV no Congresso. Combina o Partido Verde com Zequinha Sarney?
Eu acho que ele é mais Zequinha do que Sarney, porque hoje, depois que eu me aproximei mais e com essa tarefa que, talvez, se o PV me aguentar, eu vou ter que desempenhar, eu vi, estava fora do Congresso já há algum tempo, e eu observei as votações, as ações. Zequinha é hoje o principal deputado ambientalista do Congresso. É o mais preparado, é o mais consequente, é o mais constante aqui no Congresso Nacional. Teve uma passagem importante na época do Fernando Henrique no ministério. Eu acho que o Zequinha, deputado, é um ótimo deputado ambientalista. O fato de ter o nome do Sarney é claro que é uma coisa ligada à política velha, à oligarquia, isso ninguém nega. Será que ele vai ser condenado pela genética a vida toda? Eu digo isso para você respondendo e vendo, e avaliando hoje no Congresso Nacional, o Zequinha é o melhor deputado ambientalista do Congresso Nacional, é fato. Pode ver. Veja o levantamento das comissões, das propostas, da combatividade dele, a capacidade de articulação dele.

As diretrizes programáticas do PV falam em descriminalizar o aborto. Em que termos isso vai ser feito se o sr. for eleito?
Olhe, eu sou o autor da lei de planejamento familiar do Brasil, não sei se você sabe. A lei de planejamento familiar do Brasil, o autor sou eu. A da lei também que legaliza o acesso do homem e da mulher à esterilização voluntária, que era ilegal. Isso vem de uma experiencia de vida minha. Eu fui diretor de saúde pública em uma área muito pobre em São Paulo, eu e a minha mulher que também é médica, muitos anos. Lá em Itaquera agora, na área de São Mateus, Itaim [Paulista], aquela que era a região mais pobre de São Paulo e agora está em evidência, muita evidência. Mas eu passei lá muitos anos. Essa questão do planejamento familiar é uma questão-chave para as famílias brasileiras e eu sou autor dessa lei. A posição do PV então é estender o planejamento familiar o mais vastamente possível. O SUS já fez isso, já melhorou, mas precisa fazer muito mais. Essa é a posição da gente. O aborto, a interrupção da gravidez não é planejamento familiar, é falha no planejamento familiar. Mas, Fernando, enquanto isso não acontece, enquanto o planejamento familiar não se enraíza, o SUS não consegue levá-lo aos locais mais recônditos, nós temos 600, 700, 800, 900 mil interrupções de gravidez. O Ministério da Saúde não sabe direito porque é uma prática clandestina. Mas varia, vamos dizer, 800 mil interrupções clandestinas no Brasil por ano, por ano, que aumenta a mortalidade materna, que é um dos maiores fatores de mortalidade materna no Brasil, de sequelas, quando não morre, e de sequelas psíquicas inclusive, porque essas mulheres, que não fazem aborto por brincadeira, é sempre uma questão social, pessoal, afetiva importante para controlar esse instinto maternal da mulher, ficam com sequelas psíquicas, porque a lei atual diz que elas são criminosas. Eu insisto nisso. A nossa posição é expandir o planejamento familiar por um lado e educação sexual nas escolas para combater a gravidez precoce que é muito difundida hoje no Brasil. Enquanto isso não tem eu tenho que descriminalizar a prática da interrupção da gravidez, do aborto, para acolher essas mulheres, senão eu estou lavando as mãos, eu estou entregando essas mulheres, principalmente as mais pobres, a essa possibilidade: a morte, a sequela física e psíquica. Isso não é humano, não é correto. Para um Estado laico, que tem que respeitar todas as visões religiosas, não pode ficar como uma espécie de carrasco das mulheres cristãs, porque 95% das mulheres do Brasil são cristãs, evangélicas e católicas. Já há pregação no púlpito das duas grandes correntes de que isso não deve ser feito, mas elas fazem. E aí, eles querem empurrar para o Estado algo que não conseguem convencer as próprias mulheres do púlpito. Não é correto em um Estado laico, respeitando o direito das igrejas defender uma posição contrária, plenamente, eu não posso abandonar essas mulheres. Por isso, tem um projeto de minha autoria, aliás, tem dois projetos. Um mais reformista que acrescenta o aborto legal já permitido hoje no Brasil, mas também que o governo não coloca à disposição das mulheres quando é a gravidez resultado do estupro e do risco de vida. Você viu agora o episódio vergonhoso...

Pois é.
...De acovardamento do Ministério da Saúde em relação a isso que já existe, já existe. Lá em São Paulo, no governo da Luiza Erundina, nós fomos o primeiro lugar do Brasil que organizou isso: o direito no caso, que já existe, de atender à mulher legalmente na interrupção da gravidez quando é resultado de um estupro ou do risco de vida, acrescentar o risco à saúde. Tem casos de risco à saúde que a mulher, esse é um projeto meu, que ampliaria esse espectro do aborto legal. E tem outro projeto, meu também, junto com a Sandra Starling, ex-deputada nossa queria lá de Minas Gerais, do PT, que descriminaliza o aborto como um todo. Tem duas possibilidades: avançar ou fazer uma descriminalização mais abrangente. Mas tudo isso, não é uma posição de incentivar o uso do aborto como planejamento familiar, como alguns países já fizeram, inclusive a União Soviética fez isso um tempo e depois voltou atrás. Era um método de planejamento familiar. Nós não estamos falando isso. Planejamento familiar é uma coisa, educação sexual...

Entendi.
E acolher as mulheres que fazem.

Seus adversários nessa campanha presidencial, Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos, se manifestaram já sobre esse tema, mais de uma vez, e têm posição diversa da do sr., são contra ampliar os casos em que o aborto é legalmente aceitável. Por que o sr. acha que representantes, candidatos a presidente desses três partidos, PT, PSDB e PSB, têm posição diferente da do sr.?
Usando uma linguagem bíblica, porque estão entrando como [Pôncio] Pilatos na história, estão lavando as mãos, porque não é essa a posição pessoal deles. Eles sabem muito bem do drama das mulheres...

O sr. acha que eles mentem em público porque têm medo de perder voto?
Exatamente. É isso. Ou mentem ou se omitem. Não sei o que é pior.

A sociedade brasileira é conservadora nesse nível que exija de um candidato a presidente que tenha uma posição desse tipo para vencer?
Sim, sim, por isso que, inclusive, a posição da Marina, eu tinha criticado, de partir direto para um plebiscito, também é uma posição meio à Pilatos também, porque já sabe qual é o resultado, 70% contra, porque não há um amadurecimento na discussão. Eu falei que eu quero ser um candidato Iluminista, da razão, no caso aqui são questões de dogma, de fé e de paixão que influenciam muito a população brasileira e que impedem uma discussão mais racional. Portanto, se houver um plebiscito hoje, aqui no Brasil, essa posição de acolher as mulheres que fazem o aborto, como fazem hoje no Brasil, será derrotada. Eu defendo uma evolução no momento no Judiciário e no Parlamento, onde a posição da razão, da discussão, dos dados, dos números possa ter mais trânsito. Se vai chegar um plebiscito mais na frente, como houve em Portugal, na Itália, tudo bem, mas nesse momento agora a posição mais correta é evoluir no Judiciário e no Parlamento, onde a razão e os dados possam ter mais trânsito.

No caso de Marina Silva, o sr. acha que era de fato convicção por ela...
Ah sim, a Marina...

No caso, é convicta, diferentemente dos outros?
Claro. A Marina é, nesse ponto, totalmente transparente. A Marina é uma moça religiosa e a interpretação dela, da revelação, é praticamente literal.

Agora...
É literal mesmo, porque tem... Eu gosto de ler a Bíblia e tudo, sou de formação cristã também, tanto o Judaísmo e o Cristianismo têm interpretações mais liberais das revelações e dos documentos. Mas tem outros que têm a interpretação mais literal. A Marina é da corrente de interpretação literal, portanto ela é totalmente sincera nas posições dela.

Que, eu diria, do ponto de vista dos costumes, são mais conservadoras as posições dela.
Claro, claro.

E nesse sentido Marina Silva...
E nesse sentido é um direito dela. Eu não vejo nenhum problema. Ela é uma moça ótima, estudiosa, é competente, mas ela tem essa visão religiosa que a gente tem que respeitar e como a gente respeitou, inclusive, na campanha anterior.

Isso que eu iria perguntar. No caso, embora, enfim, ela seja legitimamente convicta a respeito dessas posições, ao ter sido ela a candidata que vocalizava as propostas do Partido Verde, ela fez com que o Partido Verde, em 2010, se afastasse de algumas de suas bandeiras históricas, mais liberais?
Por isso que eu digo que a campanha nossa, não sei se você notou lá, em 2010, foi uma espécie de coligação programática, como nós gostamos e ela gosta também de dizer. Não foi realmente uma coligação programática entre o PV, o PV tradicional, com suas teses bastante avançadas e liberais de direitos humanos, e a posição dela, que nesse aspecto é uma posição mais conservadora. É normal em uma eleição você fazer o que uma composição desse tipo. O PV respeitou, seria uma violência nossa obrigá-la a assumir tais posições e também seria um prejuízo para o Brasil não ter uma candidatura coligada PV-Marina, com aquela chance de discutir o desenvolvimento sustentável como a gente teve. Eu acho que foi totalmente legítimo respeitar as posições dela e fazer a coligação com ela.

Outro ponto que chama a atenção no programa do PV, no aspecto liberal, é a legalização do uso da maconha para determinados fins. Para fins recreativos, fins medicinais. Como se daria isso?
Você falou dos dois fins então, para todos os fins então.

É, para todos os fins a proposta.
Na verdade, veja que eu tenho estudado bastante assunto. Já li dois relatórios imensos sobre essa história, um da comunidade europeia, outra que saiu agora da London School of Economics, assinado por sete prêmios Nobel de economia. O que os economistas têm a ver com isso, né? Se metem em tudo. Mas tem um relatório de 80 páginas deles sobre isso. Teve outro da comunidade europeia mais 80 páginas. A nossa posição mais do que a posição da legalização, é legalização e regulação. A palavra regulação é importante, porque a antiga forma com que o PV defendia, da pura legalização, podia dar uma impressão de que nós estávamos estimulando o uso da droga, na verdade não é essa. A posição nossa, em relação à maconha, é a mesma posição com relação ao tabaco e em relação ao álcool, legalizar com regularização pelo Estado, regulação pelo Estado significa você ter um forte programa de educação e de saúde em relação ao uso da droga psicoativa, legal, álcool, tabaco e ilegal, por enquanto, a maconha. O que eu vou dizer? Se eu legalizar e regular, que é uma forma de você dar um golpe tremendo na economia do crime, porque a maconha é uma das principais fontes da gente ter a criminalidade com essa poderio econômico. Virou agora corporação mundial. Domina territórios no mundo, inclusive no Brasil, no Rio, em São Paulo, em Salvador. Portanto, a regulação é um golpe sério na criminalidade, na violência do nosso país. Mas eu trago para a saúde e para a educação do Estado, do SUS, a educação, uma tarefa muito clara. Eu vou dizer três coisas, se houver a regulação e a legalização. Primeiro: você de preferência não use essa droga, como não use o álcool, como não use o cigarro porque ela pode trazer prejuízo para a sua saúde. Ponto um, de preferência não use. Segundo, se usar, use muito pouco. Use da forma mais moderada possível para não prejudicar a sua família, o seu trabalho, seus amigos etc. Como, se for assistir o jogo, tomou uma cervejinha, foi para casa –espero que não foi dirigindo– então não vai ter nenhum problema, esse rapaz, essa moça não tem nenhum problema. É a mesma coisa, com a maconha pode ser, se for um uso moderado. Eu conheço jovens que eles são totalmente integrados, trabalham, estudam, são ativos. Primeira coisa, não deve usar, prefira não usar, por favor, não use. Segundo, se usar, use moderadamente para não te atrapalhar. Terceiro, mas se você começar a notar que a coisa está ficando mais séria, que começa a te atrapalhar, sua família está notando que você está com sintomas que está te prejudicando, ou seja, você está se tornando um dependente e, no caso da maconha, os estudos, alguns da Organização Mundial da Saúde, falam que 10% dos que usam ficam dependentes, 10%. Portanto, não é brincadeira. É muita gente. Eu quero tratar você logo no começo, eu quero te ajudar logo no começo, porque hoje o sistema de saúde quando tenta ajudar um dependente ele já está no fundo do poço, porque aquele ambiente de criminalidade, de contato com a criminalidade leva o sujeito a se esconder, evitar. Então é: por favor, não use, se usar, use muito pouco, se tiver problemas, eu quero te ajudar. Veja, novamente, é a mesma coisa em relação à interrupção da gravidez. É uma posição muito clara, responsável que diz que aquela tese de 1961, da Convenção da ONU de 1961, que nós íamos proibir completamente o plantio, o tráfico e o uso, é uma tese impossível de ser atingida, é mentira, o que nós prometemos à ONU em 1961 que nós íamos erradicar totalmente o uso de drogas psicoativas e eu quero agora fazer uma política de redução de danos.

Nesse caso...
Portanto, a família precisa ficar tranquila em relação ao PV, nós não estamos estimulando, pelo contrário, a gente quer diminuir os prejuízos que essa droga pode causar.

Nesse caso específico da descriminalização do uso da maconha, os três principais pré-candidatos, no momento, a presidente, Eduardo Campos, Aécio Neves e Dilma Rousseff, se manifestam sempre contrários a um avanço...
Não deveriam.

Por que o sr. acha que eles fazem isso?
Não deveriam porque ao contrário do aborto, que é uma coisa muito difícil, para mim é difícil também, porque eu já falei para você, eu sou de formação cristã católica cerrada, minha família toda. Eu tenho uma tia com 101 anos que é catolicíssima. É quase uma segunda mãe para mim. Claro que ela não fica satisfeita me vendo defender uma posição dessa e eu sei também porque a questão da interrupção da gravidez é uma coisa dramática porque conflita até com o instinto materno da mulher. Agora, no caso da droga é uma pura questão de massa cinzenta.

Por que o sr. acha que os outros candidatos defendem essa posição? É também o mesmo caso do aborto, com medo de perder votos de um eleitorado mais conservador, ou porque eles têm convicção, o sr. acha?
Aí eu fico... Eu não quero fazer o mesmo julgamento tão peremptório que eu fiz no outro caso, né. Não sei, não sei. Eu acho que aí é uma questão de marqueteiro fazendo as contas, porque ao contrário da interrupção da gravidez, que é esmagadoramente favorável à posição atual, manter como está a ilegalidade, ignorando o sofrendo das mulheres, uma posição machista, uma posição de homem em relação às mulheres, o caso da droga, é pau a pau. Nós estamos ali entre 55% e 45%.

Uhum.
Então, o marqueteiro que não quer perder nem um por cento e que sabe que, às vezes, a decisão é no olho mecânico, fica influenciando, acredito, os candidatos. Agora, eu não quero me arriscar a dizer o que realmente o Eduardo Campos, a Dilma e o Aécio pensam disso. Eu apenas recomendo a eles: façam como eu, leiam os relatórios mais atuais, as experiências da Espanha, Portugal, do Uruguai, dos Estados americanos. A Califórnia foi o primeiro Estado americano que proibiu, que criminalizou o uso da maconha em 1911, que eram os mexicanos que levavam e eles achavam que os mexicanos não trabalhavam, ficavam sentados na calçada, às vezes, fumando maconha, e não trabalhavam como eles queriam. Então, eles criminalizaram a maconha em 1911, foi o primeiro Estado americano. E hoje, é a Califórnia, junto com outros, que estão na vanguarda de você ter uma política de redução de danos. Eu recomendo para eles que tenham coragem. Uma liderança, às vezes, começa com a sua posição contra a corrente, mas explicando ao povo, tendo confiança no povo, na capacidade do povo de entender que ele pode, por isso que ele é liderança, ele pode mudar essa ideia. De 55% para 45% pode virar, 55% a favor de uma política mais racional e 45% na posição mais conservadora. Tenham coragem Dilma, Eduardo Campos e Aécio e enfrentem essa questão. A juventude brasileira, principalmente, vai agradecer porque hoje quem sofre com isso é juventude. Não só a juventude usuária, que são de todas as classes, da alta burguesia ao proletariado, mas principalmente a juventude que está presa nas prisões. São centenas de milhares de jovens usados pelo tráfico que estão mofando nas prisões por causa de uma política irracional da guerra das drogas.

O sr. pessoalmente já usou algum tipo de droga?
Eu uso, às vezes, a cerveja e o vinho. Pouquinho, né? Porque eu sou muito fraco, também porque eu só tomo cerveja se meu time ganhar e meu time é difícil de ganhar.

Qual é seu time?
Eu sou Botafogo.

Tá certo. Mas drogas que hoje são consideradas ilícitas no Brasil, já usou quando era jovem? Maconha ou algum outro tipo de droga na juventude?
Não, não usei. Nunca usei. Eu prefiro jogar futebol, brincar com meu neto, ler, observação de pássaros. Uma vez, naquela época de 1968, até uma amiga minha estava assistindo a Woodstock, me ofereceu e eu não quis, porque como eu era muito ligado ao esporte, futebol, voleibol eu sempre tive uma aversão a essas drogas, porque pode prejudicar e prejudica mesmo a saúde.

Que mudanças o PV proporia, assim, em síntese, na política econômica do Brasil, se o sr. fosse eleito?
O nosso programa fala disso. As pessoas às vezes pensam que o PV não fala disso, mas o nosso programa fala de tudo. Fala de economia, de reforma tributária, de educação, de saúde, área de política internacional.

Deixa eu perguntar alguns itens específicos.
Uma questão importantíssima que a gente começa de cara a dizer é a questão da reforma tributária, que é uma questão econômica fundamental.

Para diminuir, aumentar, fazer o que com a carga tributária do país?
A carga tributária brasileira...

Ela é boa, alta ou ideal?
A carga tributária brasileira, para as tarefas de um país que quer ter um estado de bem-estar social civilizando, ela seria razoável se fosse bem gasta. O problema dela não é o tamanho, é que a qualidade da forma com que ela é gasta que não é boa. Portanto, a gente hoje manteria esse patamar e procuraria arrecadar melhor, de forma mais justa, e gastar melhor principalmente.

Deixa eu fazer algumas perguntas bem pontuais, se o sr. puder ser conciso nas respostas. Por exemplo, taxa de juros, seria mantida no nível atual ou não?
Essa é uma questão-chave. O Brasil vive uma oligarquia de 10 bancos mandando na economia do Brasil.

A presidente Dilma tentou baixar a taxa de juros e depois recuou.
Infelizmente recuou. Foi uma atitude boa, corajosa dela, mas ela voltou no meio do caminho. A posição do PV...

É reduzir.
É reduzir porque, veja, hoje, além da taxa Selic estar lá em 11%, 12%, sei lá, lá em cima, né, que é a taxa que eles usam, dizem que usam, para controlar a inflação, tem uma coisa que pouca gente sabe. As taxas para o tomador no banco brasileiro são altíssimas, chega a 100% para nós, cidadãos comuns, 50% para as empresas. Enquanto países semelhantes ao nosso isso não passa de 10%. Então, está alta a taxa Selic. Está mais alta ainda, é uma coisa berrante em relação ao tomador, coisa que não se fala. Então nós cairíamos na taxa para o nível da inflação, que é coisa semelhante do que acontece em outros países.

E a inflação.
Também taxaríamos e íamos controlar as taxas que o banco cobra de você, que são altíssimas também no Brasil. Se você reduz a taxa Selic, se você controla as taxas dos bancos, você vai obrigar os bancos a irem para o mercado disputar você que vai buscar o empréstimo e aí essas taxas altíssimas vão cair e o Banco do Brasil e a Caixa Econômica poderiam ajudar nisso, baixando as taxas ao tomador e as empresas. Isso significa dinamizar a economia brasileira e sair dessa ditadura dos bancos. Os bancos estão controlando o Brasil.

O sr. falou da meta de inflação, que é hoje...O sr. falou de inflação. A meta de inflação hoje, no Brasil, é de 4,5%. O sr. acha que tem que reduzir essa meta ou mantê-la e persegui-la ao longo do tempo?
Eu acho que a gente deve perseguir, manter essa meta, mas eu analisaria a inflação dividindo, vamos dizer assim, a inflação dos trabalhadores mais pobres e a inflação em geral. Eu controlaria particularmente os preços que, naquelas listas que fazem a taxa de inflação, afetam a população mais pobre. Que é alimentação e transporte. Que é quase uns 25% disso daí. Eu controlaria basicamente esses dois elementos, que são as coisas que mais pesam na inflação do trabalhador no Brasil. Transporte e alimentos.

Trinta e nove ministérios tem o Brasil hoje. O sr. manteria esse número de ministérios ou reduziria?
Isso faz parte de uma das grandes reformas políticas que a gente está propondo no nosso programa, que é “Mais Brasil e menos Brasília”. Nada contra Brasília, adoro Brasília e tudo. Estou falando Brasília [como] governo federal. Vamos esclarecer, senão o cidadão de todo o Brasil que mora aqui, trabalhando aqui... Então “Mais Brasil e menos Brasília”. Como a gente está propondo mais gasto com educação e saúde eu tenho que dizer onde vou cortar. Porque os candidatos falam que vai ter mais educação e mais saúde, mas não dizem de onde vai cortar. Nós estamos dizendo onde vamos cortar. Está tudo lá [nas diretrizes programáticas do PV]. Cortar aqui, cortar acolá. E, no caso da estrutura dos ministérios, nós fomos o primeiro que falamos isso. Falamos e colocamos no papel quais são os ministérios que a gente quer. São 14, você juntando dá para você trabalhar muito bem aqui com 14, e isso faz parte dessa estratégia. “Mais Brasil e menos Brasília”, porque eu quero atacar também o presidencialismo imperial, que hoje está sugando, todas as verbas são para Brasília, para dizer o que eu lá em Catolé do Rocha [PB], lá em Bagé [RS], lá em Boa Vista [RR], tenho que fazer. Então eu quero também é fazer a redistribuição dos recursos para as prefeituras e para os Estados, mas principalmente para as prefeituras, que é mais perto do povo, que é o governo mais perto do povo. Portanto isso significa você ter que cortar aqui em Brasília. Cortar em ministérios, cortar em estrutura, cortar em cargos de confiança. O Brasil é campeão mundial de ministérios. Espero que ele ganhe a Copa, mas a Copa de campeão de ministério o Lula já ganhou. Então cortar os ministérios, cortar cargos de confiança, o Brasil também é campeão mundial de cargos de confiança, que vivem atrapalhando os trabalhos dos ministérios. Essa é uma estrutura geral de reforma política. Mais Catolé do Rocha e menos Brasília.

O programa do PV fala em implementar o “bem-estar dos animais” no país, um trecho, com regras que garantam suas necessidades “físicas e psicológicas”. Como se daria isso, na prática?
Você pode pensar “o que isso tem a ver com o programa presidencial de um país continental como o Brasil?”. Tem sim. Porque hoje a humanidade evoluiu a um tal ponto, a técnica agrícola, os estudos nutricionais, que já dispensa o homem de ter que ficar sacrificando, torturando as outras espécies, como sempre fez ao longo de sua história. Então é a nossa posição, que não é uma posição impositiva, é uma posição do exemplo, que a gente tem que caminhar para uma dieta vegetaria, que ela é mais humana do ponto de vista da relação com as outras espécies, ela protege melhor a saúde dos humanos e ela é ambientalmente mais adequada. Mas é sempre uma ideia de expor pelo exemplo, não é nada impositivo. Então, por exemplo, a gente implantou em São Paulo uma merenda vegetariana toda segunda-feira. Uma coisa para a pessoa experimentar, e é seguro. Então essa é uma tese muito importante. É uma tese ambiental, é uma tese de saúde, de nós, humanos, porque a alimentação carnívora, excessivamente carnívora, prejudica a saúde, isso é comprovado. E é também uma medida de cultura de paz. Eu insisto nisso, não é nada impositivo, é pelo exemplo. No caso do Rio Grande do Sul, por exemplo, seria uma coisa dificílima, que eu tivesse muitos adeptos, né. Mas não tem problema, porque é sempre uma posição de exemplo, não é nada impositivo. Mas é importante sim, do ponto de vista da saúde das pessoas, do ponto de vista da defesa do meio ambiente e do ponto de vista da cultura de paz. Você pode me perguntar, defesa do meio ambiente? Sim. A alimentação carnívora, que o Brasil agora se orgulha de ter os maiores frigoríficos, ser o maior exportador de boi. E o boi, para corte, não para o leite, para o queijo, mas para corte, é um grande predador do meio ambiente. É um dos principais fatores de destruição e desmatamento. E pode, além de tudo, se for substituído por outras culturas, produzir muito mais alimentos para muito mais gente, do que para gente, como é o boi. Então, realmente, essa é uma posição de vanguarda do PV, mas cada vez mais isso vai ter apoio na opinião pública, pode crer. Essa campanha, que estou falando aqui, da segunda-feira sem carne, nós lançamos lá na secretaria do meio ambiente.

Em São Paulo?
Em 2005, sabe com quem? Com Paul McCartney e com a Yoko Ono. Você já viu alguma coisa com que o Paul McCartney concordasse com a Yoko Ono? Então é alguma coisa muito séria, é uma verdadeira evolução no mundo pop, eles dois concordarem com uma coisa.

Agora, quando fala do tratamento para os animais, no que consistiria essa proposta?
Você tem que fazer uma coisa progressiva. Mas, por exemplo, você concorda que as galinhas fiquem em gaiolas com o bico cortado, com a luz acesa, para por o ovo dia e noite, e depois serem jogadas no lixo, você concorda com uma coisa dessas, você pode concordar? Você mostraria para o seu filho um filme de como os bois são sacrificados para produzir aqueles bifes que chegam na mesa? O homem não precisa mais disso. Na época em que nós éramos feras entre feras, na época das cavernas e depois, um pouco depois, isso até era uma questão de sobrevivência. Isso não é mais necessário, não é mais necessário que você torture os animais como a gente tortura.

Eduardo Jorge, pré-candidato, quase candidato do PV a presidente da República, a convenção vai ser neste sábado, dia 14 de junho de 2014, muito obrigado por sua entrevista à Folha de S.Paulo e ao UOL.
Obrigado, Fernando.