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Nova relação da Odebrecht com o poder é um fator de risco, diz fiscal do acordo

O advogado Otávio Yazbek vai monitorar a Odebrecht pelos próximos dois anos - Fernando Moraes/UOL
O advogado Otávio Yazbek vai monitorar a Odebrecht pelos próximos dois anos Imagem: Fernando Moraes/UOL

Flávio Costa e Guilherme Azevedo*

Do UOL, em São Paulo

25/03/2017 09h22Atualizada em 27/03/2017 11h17

Após confessar uma série de atos de corrupção em associação com agentes públicos, a Odebrecht será obrigada a passar por "uma mudança cultural significativa" e criar regras anticorrupção que não fiquem só no papel.

A maneira pela qual a Odebrecht irá se relacionar, a partir de agora, com os representantes do poder público --servidores, parlamentares, ministros e chefes do Executivo-- é um dos pontos principais a serem observados pelo advogado Otávio Yazbek. Ele é o monitor independente que irá fiscalizar no Brasil se a Odebrecht está cumprindo os termos do acordo de leniência firmado em dezembro pela companhia com a força-tarefa da Operação Lava Jato, além de autoridades dos Estados Unidos e da Suíça. Para ele, este assunto é um "fator de risco".

"Para qualquer empresa que é contratada pelo poder público ou que dependa de decisões do Legislativo, essa relação é necessariamente um fator de risco. O importante é estabelecer políticas claras de conformidade sobre como se dará esta relação. É uma questão central para meu trabalho", afirmou.

Caberá a Yazbek fiscalizar a política anticorrupção a ser implantada pelo grupo baiano, cobrar medidas casos sejam verificadas irregularidades e reportá-las às autoridades. "Não tenho poder para mandar ninguém embora. Tenho poder para chamar a atenção e cobrar que medidas sejam tomadas."

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Por sua vez, a Odebrecht afirma que há um ano deu início ao processo para que "pudesse virar a página", em relação aos fatos descobertos pela Operação Lava Jato. Entre as medidas já adotadas, está a criação de uma espécie de disque-denúncia anticorrupção. O sistema, chamado de Linha de Ética, funcionará nos 26 países em que o grupo tem negócios. Todo processo será gerenciado, a partir de maio, por uma empresa especializada neste tipo de serviço.

Contrato de dois anos

Iniciado em fevereiro último, o contrato de monitoramento tem validade para os próximos dois anos e pode ser prorrogado por mais um. "O fato de se impor um monitor é uma das provas que existem mudanças significativas para se fazer. O monitor é um elemento de suporte para esse processo de mudança, seja porque ele começa a fiscalizar, seja porque ele responde diretamente às autoridades. A gente pode antecipar que tem muita coisa para mudar [na Odebrecht]."

Yazbek foi designado pelos procuradores da força-tarefa da Lava Jato e do DOJ (Departamento de Justiça) dos Estados Unidos, após a Odebrecht indicar três nomes brasileiros para o trabalho de monitoramento independente, que está previsto no acordo de leniência. Ele trabalhará em parceria com Charles Duross, um ex-funcionário do DOJ --conhecido pelo combate à corrupção em seu país e responsável pelo monitoramento da Odebrecht nos Estados Unidos.

"Quando a gente está lidando com controles externos, com regras de conformidade, é muito fácil produzir apenas papel", diz Yazbek, que concedeu entrevista ao UOL em seu escritório, localizado na zona sul de São Paulo. "O importante é procedimentalizar as práticas na companhia. Criar padrões de conduta e de tomada de decisões que sejam seguidos por todos na empresa", acrescenta.

Delatores monitorados

"Toda atividade de monitoramento é uma atividade baseada em risco", afirma Yazbek. Ele é professor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, membro da Câmara de Arbitragem do Mercado da BM&F Bovespa e dirigiu a CMV (Comissão de Valores Mobiliários).

Durante a semana passada, Duross e Yazbek tiveram reuniões com equipes da Odebrecht, em São Paulo, para fazer uma avaliação da situação da construtora, identificando os fatores de risco, a exemplo da estrutura societária da holding, além de estabelecer um plano de trabalho.

Otávio Yazbek - Fernando Moraes/UOL - Fernando Moraes/UOL
Yazbek: delatores que continuam a trabalhar na Odebrecht estão neutralizados
Imagem: Fernando Moraes/UOL
"A gente precisa estar o tempo todo analisando qual é a estrutura política, qual é a estrutura de governança, qual é a estrutura financeira da companhia para saber se a gente está monitorando as coisas certas."

Entre as reuniões, destacava-se a que estava marcada com o presidente do conselho da holding, Emilio Odebrecht, que liderou o processo de negociação com a força-tarefa para que a empresa firmasse um acordo de leniência. Ele está entre os 78 executivos do grupo que fizeram delações premiadas --homologadas em janeiro pela presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Cármen Lúcia.

Emílio Odebrecht é um dos delatores que, pelo acordo firmado com os procuradores, continuará trabalhando na Odebrecht. Reportagem da "Folha de S. Paulo" revelou que durante um período superior a um ano ele ficará livre, mas com a responsabilidade de atuar como uma espécie de "fiador" dos acordos celebrados entre a empresa e a Lava Jato.

O presidente do conselho cuidará para que as diretrizes anticorrupção acordadas com os investigadores sejam implementadas de fato. Também comandará a transição das lideranças dentro da Odebrecht, consequência do afastamento dos funcionários que participaram da delação premiada.

Ao UOL, Yazbek afirma que observará como será atuação dos delatores que vão continuar trabalhando na Odebrecht. "Eu entendo que essas pessoas já estão neutralizadas, em larga medida. Elas já estão em uma posição específica, têm um tipo de acompanhamento das atividades que é diferenciado em relação às outras pessoas, não possuem mais capacidade de decisão direta."

Odebrecht afirma que está implantando mudanças

A advogada Olga Pontes, CCO (responsável pela conformidade a regras éticas de conduta) na Odebrecht S.A., afirma que as mudanças já estão sendo implantadas há exatamente um ano. Ela aponta como "marco'' o dia 22 de março do ano passado, quando grupo decidiu colaborar com autoridades ligadas à investigação da Lava Jato.

"Nós começamos o processo de transformação há um ano, antes mesmo de termos a confirmação de que um acordo de leniência seria firmado", afirma. O grupo aderiu também ao Pacto Global da ONU de boas práticas de governança, entre outras ações.

"Um dos compromissos fixados no acordo de leniência trata-se do sistema de conformidade de anticorrupção. Todos os processos de negócios que fazem a interação com agentes públicos possuem riscos inerentes e estamos implementando processos e regras que minimizem esses riscos", diz Pontes.

Em novembro, o Conselho de Administração da Odebrecht S.A. aprovou "sua política sobre conformidade". "Desde então, temos treinado intensivamente nossos funcionários de acordo com as novas regras em vigor", diz Pontes.

A respeito da manutenção de alguns executivos que fizeram delação premiada na Odebrecht, Pontes afirma que houve autorização da Justiça estabelecida no âmbito do acordo de leniência.

"Essas pessoas que porventura ficarão no grupo estão trabalhando com o aval da Justiça, e as restrições e maneira de como o trabalho delas será acompanhado foram estabelecidas no acordo firmado com as autoridades", afirma.

* Colaborou Vinicius Konchinski, do Rio

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