Áudio mostra que Temer sabia que J&F havia infiltrado procurador em investigação
O presidente Michel Temer (PMDB) sabia que o grupo J&F havia infiltrado um procurador da República nas investigações contra o grupo que tramitam na Justiça Federal. Em áudio divulgado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quinta-feira (18), o empresário Joesley Batista, dono do grupo, contou ao presidente que ele havia colocado um procurador para atuar em favor do grupo junto às investigações.
Na manhã desta quinta, a PF (Polícia Federal) prendeu o procurador Ângelo Goulart Vilella, que atuava nos casos envolvendo o grupo J&F por repassar informações sigilosas ao grupo empresarial.
No áudio divulgado, Joesley fala sobre o procurador ao detalhar sua estratégia de defesa em relação às investigações das operações Sepsis e Greenfield.
“Consegui um procurador dentro da força-tarefa que está me dando informação e que eu estou pra dar conta de trocar o procurador que está atrás de mim”, disse Joesley ao presidente.
“Eu consegui colar um no grupo e agora estou tentando trocar [o procurador titular] (...) então eu estou me defendendo”, repetiu Joesley ao presidente, que responde assentindo. “É”, disse Temer.
Em nota, o Palácio do Planalto afirma que Temer "não acreditou" nas declarações do empresário. "O presidente Michel Temer não acreditou na veracidade das declarações. O empresário estava sendo objeto de inquérito e por isso parecia contar vantagem. O presidente não poderia crer que um juiz e um membro do Ministério Público estivessem sendo cooptados", diz o texto enviado pela assessoria de imprensa da Presidência.
Joesley também detalha a Temer os detalhes sobre o quanto estaria pagando ao procurador infiltrado. "Consegui. Tô fazendo um [inaudível] 50 mil por mês do rapaz e tal, pra ele me dar informação, pelo menos me dar informação. “Ah, teve reunião, falou isso, falou daquilo”. O bravo é [inaudível] Enfim, mas vamos lá. Eu queria falar sobre isso e falar como é que é que... pra mim falar contigo, qual é a melhor maneira, porque eu falava com o Geddel... Eu não vou lhe incomodar, evidente..."
[Presidente Temer]: [inaudível]
[Joesley]: Tô no meio também, e tô segurando as pontas, tô indo. Nesses processos eu tô meio enrolado aqui, né, no processo assim...
[Presidente Temer]: Você está sendo investigado.
[Josley]: Isso, é, investigado, eu não tenho ainda denúncia. E eu dei conta de um lado do juiz, dá uma segurada, do outro lado o juiz substituto, que é um cara que fica...
[Presidente Temer]: Está segurando os dois.
[Joesley]: Segurando os dois. E eu consegui, dentro da força tarefa, que está também me dando informação, e eu lá que eu tô pra dar conta de trocar o procurador que está atrás de mim. Se eu der conta, tem o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que dá uma esfriada até o outro chegar e tal, e o lado ruim é que se vem um cara com raiva ou com não sei o quê...
[Presidente Temer]: Está te ajudando?
[Joesley]: O que tá me ajudando, tá bom, beleza. Mas o principal é o que está me investigando. Eu consegui colar um no grupo. Agora eu estou tentando trocar...
[Presidente Temer]: O que está [inaudível]?
[Joesley]: Isso... tô nessa aí. Então tá meio assim, ele saiu de férias, até essa semana eu fiquei preocupado que saiu um burburinho que iam trocar ele e não sei o quê. Eu tô com medo, eu tô só contando essa história para dizer assim: Eu tô me defendendo aí, tô me segurando e tal, os dois lá tô bancando, tudo bem. Mas... o Geddel estava aqui com aquele negócio da anistia e quase não veio.
[Presidente Temer]: Quase... [inaudível] empresariais que vão dizer que você [inaudível] são nossos. Se todos se reunirem e fizerem isso [inaudível], mas se todos fizerem isso.
[Joesley]: Sabe que eu estive até com o presidente Lula, na época, lá no dia, que o PT, parte do PT... “ah, Paulo Pedro não sei o quê...” – “pô, presidente, mas...” “ô, eu quero uma aguinha, um...”. “Água que você quer?” Todo mundo...
[Presidente Temer]: [inaudível]
[Josley]: Então, isso foi um negócio que... o negócio da autoridade também era outra, né? A autoridade.
Em outro trecho, Joesley conta a Temer que evitou uma investigação contra a JBS na Lava Jato ao pagar propina ao procurador infiltrado.
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Durante a conversa, Temer concorda com as críticas de Joesley contra o processo de delação adotado pelo MPF (Ministério Público Federal).
O dono da JBS afirma que a empresa já foi alvo de "quatro ou cinco" delatores. Ele afirma que o MPF recusou delatores que não falavam do grupo empresarial.
Joesley imita a postura de um procurador: "fala, se não [você vai ficar preso]". Temer responde: "para se livrar, fala".
Há mais críticas ao MP por parte do empresário: "Eu falo lá pro procurador: doutor procurador, o senhor quer me investigar, não tem problema. Mas não fica dando solavanco, não. E fazendo medidas destemperadas, e divulgando pra imprensa... Doutor, eu posso estar certinho, mas eu vou chegar lá morto. De tanto solavanco que o senhor vai me dar, se eu tiver 100% certo, eu morro. Para com isso", declara Joesley.
Temer pediu acesso a áudios
A gravação divulgada pelo STF também foi entregue a Temer, que pediu ao Supremo acesso aos áudios.
Mais cedo, o STF havia autorizado a abertura de inquérito contra o presidente. A decisão de abrir uma investigação contra Temer foi tomada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo. O pedido foi feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República). A partir de agora, o presidente passa a ser formalmente investigado.
No meio da tarde, Temer fez um pronunciamento no Palácio do Planalto e negou que vá renunciar após o escândalo. "Não renunciarei. Repito, não renunciarei. Sei o que fiz e sei a correção dos meus atos. Exijo investigação plena e muito rápida para os esclarecimentos ao povo brasileiro. Essa situação de dubiedade ou de dúvida não pode persistir por muito tempo", disse o presidente.
Em sua fala, Temer não cita a questão do procurador, mas diz que "em nenhum momento autorizei que pagassem a quem quer que seja para ficar calado. Não comprei o silêncio de ninguém, por uma razão singelíssima: exata e precisamente porque não temo nenhuma delação".
"Não preciso de cargo público nem de foro especial, nada tenho a esconder, sempre honrei meu nome: na universidade, na vida pública, na vida profissional, nos meus escritos, nos meus trabalhos, e nunca autorizei, por isso mesmo, que usassem meu nome indevidamente. E por isso quero registrar enfaticamente que a investigação pedida pelo STF será território onde surgirão todas as explicações, e, no Supremo, demonstrarei não ter nenhum envolvimento com esses fatos", completou Temer.
Entenda as acusações
Joesley Batista, um dos donos da JBS, encontrou Temer no dia 7 de março no Palácio do Planalto. O empresário registrou a conversa com um gravador escondido. Em um trecho, Joesley inicia um diálogo sobre o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Após perguntar qual era a atual relação entre Temer e o ex-deputado, o empresário diz que zerou "tudo o que tinha de pendência" com Cunha. Mais para frente, no diálogo, Joesley afirmou: "eu tô bem com o Eduardo". Ao que Temer respondeu: "e tem que manter isso, viu".
Na quarta-feira (17), ao divulgar em primeira mão a delação de Joesley Batista, o jornal O Globo relatou que a resposta "tem que manter isso" seria a um aviso de Joesley de que estaria pagando uma mesada para manter o silêncio de Eduardo Cunha na cadeia. O diálogo, porém, tem trechos inaudíveis, tornando inconclusiva uma possível referência a um aval de Temer aos pagamentos mensais.
Em nota publicada ontem, Temer confirmou o encontro, mas disse que "jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha" e negou ter participado ou autorizado "qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça pelo ex-parlamentar".
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