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Réu diz que comprou terreno a pedido da Odebrecht e confirma ligação com Instituto Lula

Terreno na zona sul de São Paulo foi comprado para ser a sede do Instituto Lula - 20.dez.2016 - Adriano Vizoni/Folhapress - 20.dez.2016 - Adriano Vizoni/Folhapress
Terreno na zona sul de São Paulo foi comprado para ser sede do Instituto Lula
Imagem: 20.dez.2016 - Adriano Vizoni/Folhapress

Do UOL, em Sâo Paulo

06/09/2017 15h09Atualizada em 06/09/2017 18h22

Em depoimento nesta quarta-feira (6) ao juiz Sergio Moro, o dono da DAG Construtora, Demerval Gusmão, confirmou que comprou, em 2010, um terreno em São Paulo a pedido da empreiteira Odebrecht, mas que apenas depois soube que ele serviria para o Instituto Lula. O instituto nunca utilizou a propriedade.

Gusmão é réu, junto com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-ministro Antonio Palocci, o ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e outras quatro pessoas em processo da Operação Lava Jato sobre um esquema de corrupção envolvendo oito contratos entre a Odebrecht e a Petrobras, que teriam gerado desvios de cerca de R$ 75 milhões e teriam beneficiado o ex-presidente e seu grupo político.

O dono da DAG, que trabalhou na Odebrecht por dez anos, disse que foi procurado por Paulo Melo, diretor da empreiteira em São Paulo e réu na ação penal, para falar sobre o terreno. Segundo Demerval, a Odebrecht não queria aparecer como compradora porque, por ser de grande porte, poderia inflacionar o valor do imóvel. Assim, sondou a DAG para ser a compradora. Depois, Gusmão viraria sócio do empreendimento que a Odebrecht queria erguer no local.

O dono da DAG também era amigo de Marcelo Odebrecht, presidente da companhia, e acabaram se encontrando pouco depois. Foi nessa ocasião que ele diz ter descoberto que o terreno, de R$ 7 milhões, serviria como sede do Instituto Lula. “No meio da conversa, Marcelo me pergunta se Paulo Melo havia comentado comigo sobre a compra do terreno para construção do Instituto Lula. Eu disse que ele havia me falado da compra do terreno, não do Instituto Lula”.

Mas Gusmão disse ter visto uma oportunidade de negócio com o Instituto Lula. Após a aquisição do terreno, a instituição decidiria se compraria ou pagaria aluguel pelo terreno em que o edifício seria erguido, segundo o relato.

Gusmão ainda disse que Roberto Teixeira, advogado de Lula e também réu no processo, estava comandando a questão envolvendo o instituto. “Roberto, de forma pragmática, me mostra que a negociação do terreno já vinha se alongando há algum tempo”. Ele falou que não discutiu o preço do terreno, de R$ 7 milhões, porque ele já estaria abaixo do esperado.

Ele também recebeu especificações sobre o edifício do instituto, que deveria ter museu, garagem subterrânea e até um mini-hotel.

"Fui um pato", diz suposto laranja

Alguns meses depois, outros pedidos de pagamento acabaram surgindo, segundo Gusmão. Um deles foi no valor de R$ 800 mil, a serem pagos a Glaucos da Costa Marques, que detinha os direitos de compra e venda do terreno. Costa Marques também é réu no processo sob a acusação de ser laranja na compra de um apartamento, pela Odebrecht, para Lula em São Bernardo do Campo (SP), vizinho ao imóvel onde reside o ex-presidente. Outro pagamento citado pelo empresário foi um de R$ 234 mil para o escritório de Roberto Teixeira. 

“Eu disse: ‘mas isso não estava no combinado’. E aí, o que aconteceu, excelência? A contragosto, eu acabei fazendo isso [pagando Roberto Teixeira]. Por dois motivos. Primeiro porque eu já havia gasto R$ 7 milhões. Segundo porque, nesse período, percebi que o Roberto Teixeira tinha uma intimidade muito grande com a família do ex-presidente. Eu fiquei com medo de que alguma negativa minha inviabilizasse o negócio”, pontuou.

Por meio de um funcionário da Odebrecht, Teixeira ainda teria pedido mais uma quantia em dinheiro no valor de R$ 192 mil, que deveria ser paga pelo dono da DAG à corretora responsável pela negociação do terreno. Demerval recusou-se a pagar em dinheiro e ofereceu um cheque administrativo, que foi recusado. “E, para minha surpresa, está aqui escrito [em documentos de Marcelo Odebrecht] que R$ 192 mil saíram da ‘fábrica de dinheiro’ [como ele chama a Odebrecht] para pagar o Instituto Lula”.

Gusmão negou conhecer Glaucos da Costa Marques e disse que esteve com Teixeira em algumas ocasiões em 2010 para tratar da compra do terreno. Segundo o dono da DAG, Teixeira usava o nome de Lula para pressionar pelo andamento mais rápido da transação, mas nunca disse que o ex-presidente tinha conhecimento do imóvel ou concordava com a compra. O empresário negou também saber se o terreno seria parte de acertos de propina entre a Odebrecht e agentes políticos, como Lula e Palocci. 

O empresário disse que toda a transação caiu por terra após uma visita do ex-presidente ao terreno, em 2011. Segundo Gusmão, Lula não gostou do local e desistiu de levar a sede do instituto para o endereço, na zona sul de São Paulo. O dono da DAG contou que conseguiu convencer a Odebrecht a recomprar o terreno. A negociação envolveu uma terceira empresa, a AFC Participações, que ficou com R$ 7,5 milhões. A DAG recebeu R$ 7,2 milhões da Odebrecht por meio da AFC.

“Doutor, se o senhor me perguntasse na época, eu afirmaria que esse terreno era meu. Hoje, com o desenrolar desse processo, vendo a quantidade de pagamento feitos à minha revelia, que eu não tinha a menor ciência, por fora, o que eu posso dizer ao senhor é que eu fui enganado. Hoje eu entrei aqui como laranja nesse processo e hoje eu vejo que eu fui um pato. Isso que eu fui”, disse Gusmão a Moro.

Sobre o interrogatório de Gusmão, o advogado Cristiano Zanin Martins, um dos defensores de Lula, disse que ele “afasta o uso de qualquer valor proveniente da Petrobras ou de contabilidade paralela da Odebrecht do cenário da compra do terreno, desmentindo as afirmações de Marcelo Odebrecht e a versão do Ministério Público”. “Além disso, levanta a possibilidade de que valores desta contabilidade paralela tenham sido desviados por executivos da empresa e atribuídos a terceiros", conclui.