Topo

Comissão diz ter identificado ossada de sindicalista morto pela ditadura

Reunião da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), em Brasília - Divulgação
Reunião da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), em Brasília Imagem: Divulgação

Janaina Garcia e Eduardo Militão

Do UOL, em São Paulo e Brasília

03/12/2018 13h44Atualizada em 03/12/2018 14h11

A CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos) anunciou nesta segunda-feira (3), em Brasília, a identificação de mais um preso político morto pela ditadura militar (1964-1985) no Brasil. Trata-se do bancário e sindicalista Aluízio Palhano Pedreira Ferreira, que era dado, até hoje, como desaparecido político.

O anúncio foi feito durante o 1º Encontro Nacional de Familiares de Pessoas Mortas e Desaparecidas Políticas, promovido pela comissão –que é presidida pela procuradora federal Eugênia Gonzaga.

Ferreira era militante da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), grupo que tinha na luta armada uma das frentes de oposição ao regime. A VPR teve entre suas lideranças o capitão Carlos Lamarca, morto pela ditadura em 1971. Ferreira foi sequestrado em 1971 por agentes do Doi-Codi. Tinha 49 anos.

O sindicalista Aluízio Palhano Ferreira - Memórias da Ditadura/Divulgação - Memórias da Ditadura/Divulgação
O sindicalista Aluízio Palhano Ferreira
Imagem: Memórias da Ditadura/Divulgação

O caso do sindicalista foi um dos investigados pela Comissão da Verdade, criada no governo Dilma Rousseff (PT) para apurar mortes e desaparecimentos na ditadura militar brasileira.

De acordo com a CEMDP, a possibilidade de identificação era considerada “muito remota”. A mudança de perspectiva só ocorreria quando a investigação sobre Ferreira passou a ser incluída entre as identificações de ossadas remanescentes de uma vala clandestina no cemitério clandestino em Perus, na zona norte de São Paulo –para onde seriam levadas supostas vítimas da ditadura. A vala foi descoberta em 1990.

Segundo a CEMDP, o grupo de trabalho formado para investigar as ossadas de Perus identificou Ferreira. O dossiê com as conclusões sobre a identificação foi apresentado pela comissão à família do sindicalista.

A aposentada Márcia Ferreira Guimarães, 70, irmã do sindicalista Aluízio Palhano Pedreira Ferreira - Eduardo Militão/UOL - Eduardo Militão/UOL
A aposentada Márcia Ferreira Guimarães, 70, irmã do sindicalista Aluízio Palhano Pedreira Ferreira
Imagem: Eduardo Militão/UOL

Para irmã de sindicalista, família terá “direito ao luto”

Para a irmã do sindicalista, a aposentada Márcia Ferreira Guimaraes, 70, a identificação possibilitará que só agora a família tenha "direito ao luto".

De acordo com ela, os restos mortais serão cremados, e as cinzas, lançadas na Baía de Guanabara, no Rio. “O direito ao luto é muito importante: você fecha um ciclo. É um certo alívio, independentemente de a razão disso ser boa ou ruim”, definiu.

A aposentada se mostrou refratária a respeito dos efeitos da confirmação do assassinato do irmão sobre apoiadores atuais do regime militar ou de notórios torturadores que o marcaram.

“As pessoas são insensíveis e vão continuar insensíveis. Infelizmente, a história é essa”, avaliou.

O caso

A Comissão Nacional da Verdade concluiu que Ferreira, sequestrado por agentes da repressão no dia 9 de maio de 1971, em São Paulo, foi morto e desapareceu em decorrência de ações praticadas por agentes do Estado brasileiro.

A comissão ainda o classificou como um dos mais de 400 desaparecidos políticos do regime e recomendou que as investigações sobre as circunstâncias do caso não cessassem.

As investigações do caso apontaram indícios de que Ferreira teria sido entregue às forças de segurança pelo agente infiltrado José Anselmo dos Santos, o cabo Anselmo, intermediário de seus contatos com militantes da VPR no Brasil.

Segundo o relato de testemunhas, o sindicalista foi levado à sede do Doi-Codi, onde passou por sessões de tortura. À época, o órgão era comandado pelo então major Carlos Alberto Brilhante Ustra (morto em 2015).

De lá, Ferreira teria sido encaminhado à sede do Cenimar (Centro de Informações da Marinha), no Rio, e ao centro clandestino conhecido como “Casa da Morte de Petrópolis”, antes de ser novamente levado à capital paulista -- onde teria sido efetivamente morto após ser de novo submetido à tortura.