Com improviso e sem lideranças, clã Bolsonaro tenta lançar liga da direita
Com problemas técnicos e sem nomes icônicos do setor, como Kim Kataguiri e Joice Hasselman, a nova direita brasileira se reuniu no último sábado (8) em um resort de luxo na turística Foz do Iguaçu (PR). Era a autoproclamada "Cúpula Conservadora das Américas", organizada com o objetivo de espalhar pelo hemisfério a onda 'bolsonarista' e combater a esquerda na região.
Inicialmente, a reunião havia sido programada para 28 de julho, mas foi adiada a três dias da data. A previsão inicial de público, 3.000 pessoas, foi revista para 1.500 e confirmada ambiciosa demais. Houve pouco mais de 500 participantes no evento em que a entrada era gratuita.
“Mais de 500 é sucesso, porque Foz é uma cidade com a passagem muito cara pra você chegar. É um ponto turístico, os hotéis também costumam ser mais caros. A gente veio aqui muito mais pelo simbolismo da tríplice fronteira do que das (pelas) facilidades para angariar um grande público”, afirmou Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), organizador do evento.
Com camisetas estampando Bolsonaro e Olavo de Carvalho, jovens faziam fila para tirar foto com Eduardo. O filho do presidente eleito circulou entre mesas em que eram vendidos livros de escritores de direita e peças com estampas sarcásticas da marca Camisetas Opressoras.
Mas as referências à direita pop se limitavam ao vestuário. O MBL (Movimento Brasil Livre), de jovens liberais que cresceram nas redes sociais com a campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff, só foi representado por alguns membros do braço regional do grupo no Paraná. Não houve Mamãe Falei, Kim ou outras lideranças nacionais do movimento.
A lista de notáveis ausentes é maior: não vieram Paulo Guedes, Alexandre Frota ou Janaina Paschoal.
Evento do PSL
Entre os nomes políticos, além de Eduardo Bolsonaro, estava a cúpula do PSL, incluindo o presidente Luciano Bivar (PE) e o deputado federal Delegado Waldir (GO), recém-alçado ao posto de articulador do governo de transição na Câmara Federal. Também eleito pelo partido para a Câmara, o Luiz Philippe Orleans e Bragança também marcou presença.
Com boa parte dos 52 deputados federais eleitos pelo PSL presentes, a ausência de Joice Hasselmann não passou despercebida. Na semana, ganhou repercussão nacional as desavenças entre ela e Eduardo Bolsonaro, depois de terem vazado conversas em um grupo de Whatsapp.
“A gente estava lavando a roupa suja, mas não vejo isso como sendo prejudicial para a governabilidade do Jair Bolsonaro”, afirmou o filho do presidente eleito durante o evento.
De acordo com o deputado, o encontro custou cerca de R$ 300 mil, financiados pela Fundação Indigo, criada pelo PSL com recursos do fundo partidário.
Conexão falha
Dois dos momentos mais esperados do evento foram marcados por problemas de conexão. Jair Bolsonaro, do Rio de Janeiro, e Olavo de Carvalho, dos EUA, participaram do evento por videoconferência, com ligações que falhavam, caíam e precisavam ser reconectadas.
“Teve um pouco [de problema], mas o recado foi dado", minimizou Eduardo Bolsonaro.
Depois de reconectar o Skype, Olavo de Carvalho apareceu no vídeo e gerou aplausos da plateia.
O áudio era ruim, e o professor foi informado do problema depois de alguns minutos no ar. Os ajustes não funcionaram, e o som continuou picotado. Nada que comprometesse o entendimento e o entusiasmo da plateia ao ouvir o filósofo tido como guru da nova direita brasileira.
“O regime militar (1964-1985) combateu as guerrilhas, mas nada fez no campo cultural”, discursou. “Ele estava iludido pela ideia de que o perigo estava na luta armada, e que a ‘esquerda pacífica’ era pacífica. A luta armada foi apenas o boi de piranha. Na esquerda, todo mundo sabia que os guerrilheiros iriam morrer, e que eles eram o boi de piranha para oferecer para o governo, enquanto o resto da boiada atravessava, entrando nas universidades, na mídia e tudo mais", teorizou Olavo.
Reforçar a presença da direita no discurso, na academia e no pensamento, aliás, é uma preocupação da cúpula, que dedicou uma das quatro mesas do evento à Cultura. Os outros temas eram Segurança, Economia e Política.
“Conservadora nos costumes, mas liberal na economia”, definia um dos cartazes do evento, frase repetida em muitos discursos. Entre críticas inflamadas à esquerda e cenas de improviso que marcaram a campanha de Bolsonaro, a cúpula tinha ares de convenção de negócios.
Projeção internacional
O "das Américas" que compõe o nome da "Cúpula Conservadora" fazia-se representar por nomes de países como Cuba, Venezuela e Colômbia.
O exilado cubano Orlando Gutierrez e o oposicionista venezuelano Roderick Navarro, em meio a elogios à eleição de Bolsonaro no Brasil, falaram como o regime dos irmãos Castro, em Cuba, e de Hugo Chávez e Nicolás Maduro, na Venezuela, causaram estragos em seus países.
Eduardo Bolsonaro aproveitou o gancho e sugeriu que o Brasil seja a sede de um tribunal para julgar “crimes contra a humanidade” cometidos pelo regime cubano.
A cúpula também teve representantes do liberalismo econômico chileno: o economista Carlos Gomez, o acadêmico Francisco Javier Leturia Infante e o candidato derrotado a presidente do país José Antonio Kast.
Da Colômbia, veio a senadora conservadora María Fernanda Cabal Molina. “Um comunista no poder significa milhões de mortos em uma sociedade”, decretou Molina, após críticas à atuação de forças de esquerda no continente, em especial às guerrilhas das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), hoje desarmada.
No lado brasileiro, o espírito “conservador nos costumes, mas liberal na economia” foi retomado pelos irmãos Abraham e Arthur Weintraub. Os dois fazem parte da equipe de transição do futuro governo Bolsonaro, e Abraham deve ser o número dois da Casa Civil, assumindo a secretaria-executiva da pasta. Ambos também têm se dedicado à elaboração da proposta de reforma da previdência que o presidente eleito pretende levar a votação no ano que vem.
“Um pouco da contribuição que a gente pode dar é como vencer o marxismo cultural nas universidades”, observou Abraham Weintraub. “Como a gente ganha essa batalha? Não sendo chato. Ser conservador não significa que a gente anda de Del Rey e terno velho. A gente tem que ser mais engraçado que os comunistas, tem que ganhar a juventude, com humor e inteligência.”
Surpresas programadas
Ao fim do evento, mais surpresas ensaiadas.
Sentado na cama desarrumada de um quarto, Jair Bolsonaro apareceu no centro de imagens desenquadradas, aparentemente transmitidas de um telefone celular.
“Ou mudamos agora o Brasil, ou o PT volta, com muito mais força do que tinha”, afirmou o presidente eleito, também muito aplaudido pelo público
Pouco depois, o grand finale: Eduardo Bolsonaro se ajoelha e, diante das câmeras, pede a noiva em casamento, a psicóloga Heloísa Wolf. O casamento já estava programado e ela já havia aceitado.
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