Impeachment: Controladoria de Crivella indica pressão para ampliar contrato
A extensão do prazo dos contratos que embasam o pedido de impeachment do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB), foi possível graças à assinatura da controladora-geral do município, Márcia Andréa dos Santos Peres. Em documento assinado em 17 de dezembro do ano passado, ao qual UOL teve acesso, a controladora informa à prefeitura que a CGM (Controladoria-Geral do Município) não teve tempo hábil para a análise dos documentos, dada a urgência requerida para que o processo de renovação tivesse um desfecho. Desta forma, Márcia abre mão da análise técnica e diz "não ter ressalvas para a lavratura dos termos em questão", concedendo, assim, a prorrogação do contrato solicitada pelos consórcios.
Um estudo detalhado dos números apresentados pelas empresas, assim como uma investigação de possíveis dívidas dessas empresas com a prefeitura, não foram realizados pela CGM. A controladora-geral do município afirma, no documento, confiar em análise técnica que teria sido feita em dezembro pela Subsecretaria de Projetos Estratégicos.
A CGM tem como funções "o controle contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial das entidades da Administração Direta, Indireta e Fundacional", de acordo com o site da prefeitura.
Convocada para depor amanhã na Câmara dos Vereadores, Márcia precisará explicar aos parlamentares o porquê de ter consentido a prorrogação sem ter analisado o desequilíbrio financeiro alegado pela empresa em dois contratos de concessão do mobiliário urbano. Ela também terá que responder sobre a pressão que indica ter sofrido para que a renovação acontecesse.
O texto do documento assinado por Márcia vai ao encontro do depoimento do ex-procurador-geral do município Antonio Carlos de Sá, que afirmou que o prefeito pediu celeridade na análise desses contratos.
De acordo com o autor da denúncia contra Crivella, o fiscal Fernando Lyra Reis, a prorrogação dos contratos é ilegal e teria causado danos aos cofres públicos.
Análise teria sido feita em um dia
A análise feita pela Subsecretaria de Projetos Estratégicos, no entanto, teria sido feita em tempo recorde. O órgão recebe o documento do gabinete do prefeito no dia 11 de dezembro, para que fosse feita a análise. No mesmo dia, o documento é encaminhado à CGM, que abre mão da sua averiguação no dia 17.
Menos de 24 horas depois, no dia 18 de dezembro, Márcia assina uma resolução em que fala sobre a exploração de publicidade por concessionárias em áreas públicas. Em seu texto, ela ressalta que a Secretaria Municipal de Fazenda é responsável em relação aos valores não quitados por essas empresas.
O UOL procurou a Prefeitura do Rio para comentar o teor do documento e explicar o porquê do pedido de urgência relatado por Márcia Andréa. Em nota, o governo municipal disse apenas que Márcia só irá se pronunciar durante seu depoimento à Comissão Processante do Impeachment.
A reportagem também pediu à prefeitura mais explicações quanto à análise feita na Subsecretaria de Projetos Estratégicos em apenas um dia. A Prefeitura do Rio, no entanto, não se manifestou sobre este tema.
Testemunhas de Crivella faltam a depoimento
No último dia 13, as oito testemunhas de defesa arroladas por Crivella (PRB) para depor faltaram à sessão que faz parte do processo de impeachment aberto contra o chefe do Executivo municipal.
De acordo com o advogado de defesa de Crivella, Alberto Sampaio, a base governista acredita que as testemunhas só possam ser ouvidas depois de concluídos os depoimentos indicados pela acusação --na sessão dedicada às testemunhas de acusação, no dia 10 deste mês, duas delas faltaram, o que deu base a esta interpretação jurídica.
No entanto, Sampaio afirmou que não houve uma ação orquestrada para que todas as testemunhas faltassem no mesmo dia. "Foi uma grande coincidência", respondeu a ser questionado quanto ao porquê das dez ausências simultâneas.
A presidência e a relatoria da comissão processante do impeachment, no entanto, entendem que essa foi uma estratégia da defesa de Crivella para ganhar mais tempo e desacelerar as investigações contra ele.
Entenda o pedido de impeachment
De acordo com o pedido de impeachment, o prefeito renovou no fim de 2018 um contrato com duas empresas, sem licitação. A medida teria beneficiado as concessionárias Adshel e Cemusa, ambas controladas por grupos estrangeiros.
As duas empresas tinham direito de explorar anúncios em pontos de ônibus e outdoors por 20 anos --o contrato havia sido firmado em 1999 e acabaria neste ano.
Depois desse período, os mobiliários urbanos passariam a pertencer ao município. Crivella teria, então, renovado a concessão sem licitação, o que causou prejuízos aos cofres públicos, segundo argumentou a denúncia.
O argumento da defesa do prefeito é que extensão dos contratos não provocou prejuízo ao município.
No dia em que a Câmara aprovou o processo, Crivella afirmou que a abertura do impeachment "não faz o menor sentido". "Houve a denúncia de um funcionário que trabalha há mais de 20 anos na prefeitura e que, só agora, depois que foi exonerado do cargo que exercia por sua chefe, ele resolveu entrar com pedido de impeachment.", afirmou.
Se Crivella for cassado, o presidente da Câmara, Jorge Felippe (MDB), assumirá temporariamente a prefeitura. Isso porque o vice-prefeito eleito da cidade, Fernando Mac Dowell, morreu no ano passado, fazendo de Felippe o primeiro na linha sucessória do município.
O resultado da votação pela abertura de processo de impeachment mostrou, em números, a perda de apoio do prefeito na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. É o quarto pedido analisado pela Casa desde 2016 para que ele tenha o mandato cassado, mas apenas o primeiro a ser acolhido. Com a Câmara cheia, foram 35 votos favoráveis ao impeachment, mais que o dobro do registrado em duas votações anteriores, em 2018.
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