Bolsonaro estreia no Nordeste amparado em obras para blindar ataques
O presidente Jair Bolsonaro (PSL) visita o Nordeste pela primeira vez desde que assumiu o Palácio do Planalto, há cinco meses, em viagem hoje ao Recife e a Petrolina, em Pernambuco. Tradicionalmente ligada ao PT e ao lulismo, a região foi a única na qual Bolsonaro teve menos votos que o concorrente Fernando Haddad (PT) no segundo turno.
A imagem do presidente na região continua não sendo das melhores. Pesquisa Ibope/CNI de abril, a mais recente disponível, mostra que o Nordeste é onde Bolsonaro tem a pior avaliação de sua atuação como presidente e de seu governo. Na região, 40% avaliam Bolsonaro como ruim ou péssimo, 58% dizem não confiar nele e 55% desaprovam seu modo de governar.
No entanto, os territórios a serem explorados e os anúncios previstos para obras de infraestrutura foram cuidadosamente pensados na tentativa de reverter a situação e acalmar quaisquer ânimos acirrados. A investida também acontece uma semana após as primeiras grandes manifestações contra o governo federal e em meio a divergências da própria direita quanto à necessidade de atos pró-Bolsonaro no domingo (26).
O primeiro compromisso do presidente será a portas fechadas no Instituto Ricardo Brennand, no Recife, sem a entrada de público externo no museu. Pela manhã, Bolsonaro participa de reunião do conselho deliberativo da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) com governadores do Nordeste. Junto ao anfitrião, Paulo Câmara (PSB), é esperado que todos os demais governadores da região compareçam ao encontro, além dos de Minas Gerais e Espírito Santo --integrantes da atuação da Sudene.
O grupo irá discutir e lançar o Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste, documento com metas de médio prazo que reúne 880 propostas dos governos estaduais. O presidente deve anunciar mais R$ 2,1 bilhões para o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, que totalizará em caixa R$ 25,8 bilhões para 2019. Na prática, o valor se converte em crédito do Banco do Nordeste para os setores produtivo, agropecuário, industrial e de turismo, entre outros.
Para o superintendente da Sudene, Mário Gordilho, a visita marca uma nova era na relação entre as partes. Isso porque seria a primeira vez que um presidente eleito participa de uma reunião do conselho deliberativo do órgão, disse.
"O presidente vai ficar muito satisfeito com o que vai encontrar aqui e posso dizer que da reação dos governadores também, porque comigo foi sensacional", afirmou.
Em janeiro, em entrevista ao SBT, Bolsonaro declarou esperar que os governadores nordestinos não viessem pedir dinheiro a ele, porque "o presidente deles está em Curitiba", ao se referir ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso na capital paranaense pela Operação Lava Jato.
A intenção da Presidência da República agora é demonstrar que Bolsonaro está disposto a conversar com os governadores --oito dos nove pertencem a partidos opositores-- e interessado em diminuir a desigualdade social da região. Assim, se houver hostilidades, o Planalto espera ser mais por parte da população do que pelos políticos.
Ferrenho crítico de Bolsonaro, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), afirmou ao UOL considerar a visita do presidente como um ato importante.
"Considero que é um gesto político de buscar atender as demandas da região. Nesse sentido é positivo da parte dele. Esperamos que haja um compromisso", afirmou, também criticando quem acha que o presidente não deveria fazer a visita. "Acho que o direito e o dever dele de visitar os estados devem ser respeitados, não deve ter essa visão de que não pode deixar."
Contudo, do ponto de vista de gestão, Dino diz que o governo até agora não apresentou avanços em políticas públicas, e não só para o Nordeste. "De um modo geral o governo não tem atendido demanda nenhuma. Destes cinco meses, não dá para responder nem que sim, nem que não, porque o governo está muito paralisado; então não é algo específico do Nordeste. Estamos nessa expectativa de que, em razão desse plano, acabe essa inércia", explicou.
O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, disse que o encontro servirá para discutir medidas que podem ser mais bem trabalhadas pelo governo federal com foco na geração de emprego e renda.
"Vou defender uma integração maior entre os próprios estados nordestinos e entre a região como um todo e o Brasil. Esse processo se daria através do investimento em infraestrutura de transportes, incluindo rodovias, ferrovias, portos e aeroportos regionais", ponderou.
Na quarta (22), Bolsonaro recebeu em café da manhã cerca de cem senadores e deputados federais do Nordeste, ao lado de líderes do governo no Congresso Nacional. A intenção foi obter uma atualização dos pleitos dos parlamentares e ajustar a fala do presidente para Pernambuco.
"Tem que ser mudada [a menor participação do Nordeste no Produto Interno Bruto] como? Com obras de infraestrutura, com licenciamentos mais ágeis, buscando realmente a vocação regional de vocês", falou o presidente.
Maior autonomia para a Sudene, mais recursos para o Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), a retomada das obras da ferrovia Transnordestina e a conclusão da transposição do rio São Francisco serão novamente alvos de cobrança, alerta o coordenador da bancada nordestina, deputado federal Júlio César (PSD-PI). Na lista de reclamações estão a reforma da Previdência e bloqueios de verbas para a educação, em parte revertida nesta semana.
A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), encampa o Nordeste como prioridade, e ela própria deve partir em turnê pela região em junho. "Vamos trabalhar e mostrar que este governo vai ser o melhor governo da história para o Nordeste. O mais sério e comprometido", afirmou.
O deputado federal Julian Lemos (PSL-PB) defende que a atual gestão do Planalto conseguirá desmobilizar a oposição "para inviabilizar o governo". "Se o governo Bolsonaro achar petróleo ali, eles vão ser contra. Tudo o que Jair fala, eles dão declaração contrária", falou sobre os governadores da região.
"O Jair vai para lá para levar, e eles vão para pegar. Aí quem é que não quer?", criticou. "Se fosse Haddad [presidente] e o Brasil estivesse em guerra, eles iam estar dizendo que estava bom. [...] O Bolsonaro está há cinco meses [na Presidência] e o povo quer que ele transforme isso em Miami."
Apesar dos esforços, a avaliação do cientista político e professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) Adriano Oliveira é que a visita deve gerar poucos dividendos a Bolsonaro perante o eleitorado local.
"A vinda não terá tanta influência, porque ele busca popularidade, mas o eleitor nordestino continua lulista, principalmente por conta da crise econômica", disse. "Eu vejo mais como algo que ele queira sugerir, de que é amigo dos nordestinos."
À tarde, Bolsonaro segue para Petrolina, no semiárido pernambucano, onde estreia em um palanque no Nordeste como presidente. Ele deverá discursar na entrega um conjunto habitacional do programa Minha Casa, Minha Vida.
É esperado ainda que haja anúncio de linha de crédito da Caixa Econômica Federal para produtores de fruticultura irrigada no Vale do São Francisco e de início da duplicação de trechos da BR-428, além da construção de dois viadutos na cidade.
O atual prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (PSB), é filho do líder do governo no Senado, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), cuja família tem longa carreira política em Pernambuco.
Miguel Coelho elogiou à reportagem a disposição de Bolsonaro em conhecer a realidade da população no Nordeste. Ele disse ser essencial "tirar essa pecha de que a região não votou no Bolsonaro" e ressalta não haver outro caminho para o desenvolvimento a não ser por meio de parcerias com a União.
"Esse discurso tem que acabar", reforça. Questionado sobre o impacto dos governos do PT na população, o prefeito se apressa a dizer que "o reconhecimento de Lula não se apaga".
Bezerra Coelho classifica a visita de Bolsonaro como oportunidade para a "retomada do desenvolvimento" e mostrar experiências que vêm dando certo há décadas, como as da fruticultura irrigada no meio do sertão.
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