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Tucano, governador do RS critica PSDB pela demora em analisar caso de Aécio

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite - Divulgação/Facebook/Eduardo Leite
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite Imagem: Divulgação/Facebook/Eduardo Leite

Beatriz Montesanti

Do UOL, em São Paulo

17/08/2019 04h04

Eleito sobre um discurso de renovação e um "apoio crítico" ao presidente Jair Bolsonaro, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), põe panos quentes em algumas das polêmicas que envolvem o atual presidente e reserva críticas à própria legenda.

Para o tucano, o atraso do PSDB em debater internamente os rumos de candidatos investigados por corrupção, principalmente o de Aécio Neves, irá afastar o eleitorado, prejudicando as ambições do partido para as próximas eleições.

"A população, especialmente a partir do que se observou na Lava Jato, clama por comportamento ético mais rigoroso na política, e com toda a razão. Se o PSDB não promover essa alteração de comportamento em relação a seus próprios filiados, certamente terá perdido por definitivo a conexão com o sentimento das ruas", diz em entrevista ao UOL.

Aos 33 anos, Leite é o mais jovem governador atualmente em exercício. Ele foi eleito com uma pequena margem -- 54%, ante 46% do opositor José Ivo Sartori (MDB)-- após seu bom desempenho à frente da prefeitura de Pelotas (RS), entre 2013 e 2016. Nas eleições de 2018, recebeu 90,3% dos votos de seu município natal.

Assumiu um estado quebrado, com salários de servidores há meses atrasados e um déficit previdenciário exorbitante. Desde janeiro, implementa medidas para reverter a situação: o objetivo, segundo ele, é colocar os salários em dia até o final do ano. Para tanto, leva a cabo um programa de privatizações e pretende reformar as estruturas de carreira do serviço público do estado.

O governador critica a retirada dos estados e municípios da reforma da Previdência que corre no Senado. Em contrapartida, sua gestão já se movimenta para apresentar à Assembleia Legislativa uma reforma local, se adiantando à possível desaceleração das atividades parlamentares a partir do ano que vem, devido às eleições municipais.

Eduardo Leite avalia seus primeiros 100 dias de governo no RS

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"Acho um erro grosseiro que estados e municípios estejam fora [da reforma], porque é importante manter uma unidade do sistema previdenciário, uma unicidade de sistema no Brasil", argumenta.

Boa parte do que se deseja com a reforma da Previdência não é o benefício fiscal que ela promoverá para a União e eventualmente para os estados, é também os benefícios econômicos que advirão de uma previsão da melhor qualidade fiscal dos governos no Brasil. Ou seja, ela serve também para injetar confiança do setor privado para investir no Brasil, seguro de que o país não irá quebrar. E a exclusão de estados e municípios gera uma dúvida nesse sentido.

Críticas ao PSDB

O governador é exigente com as práticas de seu próprio partido. Leite se preocupa que a morosidade do PSDB em determinar o destino de seus membros investigados por corrupção -como é o caso do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG)- possa prejudicar as pretensões futuras da sigla. Aécio é réu por acusações de corrupção e obstrução de Justiça e pode ser expulso da legenda.

"Não defendo expulsão sumária de ninguém. Não pode dizer 'expulse-se'. Eu acho que tem que abrir o processo. O que não me deixa confortável é que o partido até aqui não tenha aberto a discussão internamente. O que há de registro sobre as condutas é grave, especialmente no caso do ex-senador Aécio Neves, e que merece debate interno", defende.

É muito importante que isso se estabeleça e haja o rigor que as pessoas esperam que um partido político tenha em relação a esses tipos de caso. E eu tenho a expectativa de que o partido agora com a renovação também que houve em sua direção, com o estabelecimento do Conselho de Ética, da estrutura na verdade, do Código de Ética do partido, que haja esse debate sob a liderança do presidente da sigla, Bruno Araújo.

Em entrevista ao UOL publicada na terça (13), Araújo afirmou que o Código de Ética do PSDB está em fase de registro em cartório. Posteriormente, segundo ele, tanto o caso de Aécio Neves quanto o da deputada Tereza Nelma (AL), que desobedeceu o fechamento de questão do partido na votação da Previdência, serão debatidos na Comissão de Ética da legenda.

Eleito deputado federal, Aécio Neves é réu por acusações de corrupção e obstrução de Justiça - Pedro Ladeira - 10.jul.2019/Folhapress - Pedro Ladeira - 10.jul.2019/Folhapress
Eleito deputado federal, Aécio Neves é réu por acusações de corrupção e obstrução de Justiça
Imagem: Pedro Ladeira - 10.jul.2019/Folhapress

Governador mantém discurso de "apoio crítico"

No geral, Leite tece elogios à agenda econômica e de segurança de Jair Bolsonaro, enquanto contemporiza algumas das declarações mais polêmicas do presidente, em meio a um processo no qual o PSDB tenta se descolar paulatinamente do bolsonarismo.

"Eu acho que do ponto de vista econômico tem sido acertada a condução. A reforma da Previdência é de fato uma prioridade, a equipe econômica disponível pelo presidente é de excelente qualidade e tem trabalhado os temas que precisam ser trabalhados", diz.

Durante a campanha eleitoral, o gaúcho seguiu a estratégia de outros políticos encurralados pelo antipetismo e adotou o que foi batizado por eles de "apoio crítico": espécie de adesão com ressalvas à empreitada bolsonarista. O presidente bateu o opositor Fernando Haddad (PT) em 407 das 497 cidades do Rio Grande do Sul.

Em junho, Eduardo Leite recebeu o presidente Jair Bolsonaro na cidade Santa Maria - Alan Santos/PR - Alan Santos/PR
Em junho, Eduardo Leite recebeu o presidente Jair Bolsonaro na cidade de Santa Maria (RS)
Imagem: Alan Santos/PR

Como então, o governador critica hoje a pauta de costumes de Bolsonaro, os ataques aos direitos humanos, às liberdades individuais, e à liberalização do porte de armas. No final de julho, chamou de "lamentável" a declaração do presidente sobre a morte do pai do presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz.

"Eu fiz a declaração do voto no Bolsonaro, especialmente considerando que não poderíamos deixar voltar ao poder o modelo que quebrou o Brasil, que é responsável pela recessão econômica. Um modelo conduzido pelo PT. O que não significa minha adesão integral às ideias defendidas pelo presidente", diz.

Na última semana, Bolsonaro esteve em Pelotas para a inauguração de trechos da rodovia BR-116. Na ocasião, afirmou que o Rio Grande do Sul poderia se tornar "um novo estado de Roraima" caso a esquerda vença as eleições na Argentina -- uma referência aos imigrantes venezuelanos que chegaram ao Brasil pelas fronteiras do Norte, fugindo da crise econômica.

Leite estava em São Paulo e não acompanhou o presidente no evento. Mais tarde, afirmou à imprensa local que cidadãos de qualquer país dispostos a empreender e gerar riqueza serão bem-vindos em seu estado.

Mas ele não vê, por exemplo, gravidade nas declarações feitas recentemente pelo presidente aos governadores do Nordeste, nem entende como ameaça às relações institucionais entre as esferas de governo.

"Eu li a manifestação do presidente e entendi que ele reforça que, por dever de lealdade, os governadores ao trabalharem uma política pública ou qualquer investimento em parceria com o governo federal façam o registro de que o federal está envolvido. Acho que é legítimo buscar o reconhecimento da parceria federal. Claro que não é o caso de haver qualquer tipo de retaliação por divergências políticas", afirma.

Tenho tranquilidade de que isso vai se ajustar, na operação, na prática, no dia a dia. Não tem como o presidente ignorar que os brasileiros que vivem naquele estado, seja ele qual for, são também o seu povo, assim como os governadores também não podem ignorar a importância de trabalhar em parceria com o governo federal, especialmente com toda a relevância que tem, de ordem política e econômica, o governo central em nosso sistema federativo.

Leite faz coro às afirmações do correligionário João Doria, governador de São Paulo, de que o PSDB não deve ser oposição.

"Não é meu papel ser crítico ao governo federal. Temos que trabalhar em conjunto por nossas comunidades. E o partido também não é o caso de ser oposição. Deve opor-se àquilo que eventualmente ferir a nossa visão de mundo, da política e da forma como devem ser conduzidas as questões no Brasil."

3.jun.19 - O governador de São Paulo, João Doria, e Eduardo Leite, durante encontro no Palácio dos Bandeirantes - Marcello Fim/Ofotográfico/Folhapress - Marcello Fim/Ofotográfico/Folhapress
3.jun.19 - O governador de São Paulo, João Doria, e Eduardo Leite, durante encontro no Palácio dos Bandeirantes
Imagem: Marcello Fim/Ofotográfico/Folhapress

Em ascensão

Eleito na esteira da renovação, Leite elogia a chegada de jovens ao mundo político. Ressalta que não se trata de uma questão de mudança geracional, mas de práticas. "Conheço gente nova que faz politica de jeito velho. E conheço gente de mais idade que faz política de jeito jovem, novo", diz.

Apesar do discurso e da boa avaliação, assegura não pretender concorrer à reeleição do estado, por ser contra a prática no modelo político atual.

Há uma fragmentação eleitoral muito grande de partidos políticos, nós temos 30 partidos representados no Congresso, sete partidos representados aqui na Assembleia Legislativa, essa fragmentação tão grande coloca, numa hipótese de reeleição, o gabinete do governador, ou do prefeito, do presidente, como um espaço de negociação política para a reeleição, e acaba botando o governo como refém dessas negociações políticas, que na verdade interessam mais ao projeto político do que ao projeto do estado, do município, do Brasil.

Fez o mesmo em Pelotas, quando recusou a prefeitura para alçar voos mais altos. Ainda assim, ajudou a eleger sua então vice-prefeita, Paula Mascarenhas (PSDB). "Houve a oportunidade ali da continuidade de um projeto, mas com uma saudável mudança que é a troca do comandante, a troca do comando."

Quanto ao seu futuro político pós-governo, é evasivo: "Reservo os próximos passos da política às circunstâncias que vierem à frente. Não projetava concorrer a governador do estado em 2018, mas as circunstâncias se apresentaram, fui demandado, aceitei o desafio para contribuir com meu estado. Vou concluir esse desafio ao final de 2022 e veremos o que se apresenta para o futuro".