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Bolsonaro não combate corrupção nem controla governo, diz demitido da ABDI

Tales Faria e Antonio Temóteo

Do UOL, em Brasília

05/09/2019 20h11Atualizada em 06/09/2019 08h58

Em entrevista exclusiva ao UOL, o presidente demitido nesta semana da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), Guto Ferreira, saiu atirando.

Ele se declara decepcionado com o governo Jair Bolsonaro por não cumprir a promessa de campanha de priorizar o combate à corrupção. Também critica o ministro da Economia, Paulo Guedes (a quem diz admirar), por não dar atenção à indústria e à retomada do desenvolvimento.

Ferreira foi exonerado do cargo por Bolsonaro nesta quarta-feira (4) após afirmar, em entrevista à revista Veja, que o secretário lhe fez "pedidos não republicanos".

Em conversa com o UOL, Guto Ferreira volta a atacar seu chefe, o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa. Desta vez com novas acusações: Costa teria pedido que a agência arcasse com parte do custo de período sem agenda. A ABDI teria comprado uma passagem com escala em Dubai, com duração de quatros horas e, segundo Ferreira, Carlos da Costa teria solicitado um período de 12 a 24 horas.

Ferreira diz que ainda aparecerão outras denúncias "com provas documentais" contra seu ex-chefe.

"O problema passa a acontecer quando sou pressionado a manter um período do secretário em uma cidade do Oriente Médio, que eu não concordo, porque não existia agenda ou justificativa. Quando você tem uma viagem no serviço público é preciso apresentar uma agenda. Se não é apresentada a agenda não há como viajar", diz.

Mensagens comprovariam o relato

Ferreira afirma que possui mensagens sobre o caso e que denunciou o episódio dentro do Ministério da Economia, mas que "nada foi feito".

O ex-presidente da ABDI também diz que, quando Bolsonaro cogitou transferir a ABDI do Ministério da Economia para o Ministério de Ciência e Tecnologia, Carlos da Costa solicitou uma manifestação pública contrária à medida.

"Eu disse que não poderia fazer isso porque era uma negociação do presidente. E a resposta que me chega do secretário [Carlos da Costa] é assim: 'esta é uma decisão da equipe econômica e não do presidente da República'. Existe, para mim, um problema claro de identificação da equipe econômica com o presidente Bolsonaro", afirma.

Para ele, Bolsonaro não controla seu governo. "Existem três governos independentes", afirma. O primeiro, do próprio presidente, o outro, da equipe econômica, e o terceiro, do ministro da Justiça, Sergio Moro.

"Para mim foi uma grande decepção a não apuração do caso. Maior decepção que a não apuração, que seria me colocar frente a frente com o secretário, é ouvir que eu menti", disse.

Procurado pela reportagem, o Ministério da Economia afirmou que Ferreira não apresentou quaisquer provas de ilegalidades que teriam sido praticadas por Costa.

"Foram mostradas a alguns servidores do ministério algumas trocas de mensagem de aplicativo de celular, nas quais não se detectaram ilicitudes até o momento", disse a pasta.

Segundo o ministério, foi solicitado à assessoria de controle interno, no dia 2 de setembro, que "tomasse providências necessárias ao devido esclarecimento dos fatos noticiados, de modo a que se possa avaliar adequadamente eventuais desconformidades e riscos à integridade associados aos temas noticiados".

A pasta informou ainda que pediu uma ação de controle à CGU (Controladoria-Geral da União).

O governo Bolsonaro teve início em 1º de janeiro de 2019, com a posse do presidente Jair Bolsonaro (então no PSL) e de seu vice-presidente, o general Hamilton Mourão (PRTB). Ao longo de seu mandato, Bolsonaro saiu do PSL e ficou sem partido até filiar ao PL para disputar a eleição de 2022, quando foi derrotado em sua tentativa de reeleição.