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Apoiadores recebem Lula com bonecos de pano, cerveja, choro e reza no ABC

Boneco de pano Lula, vendido a R$ 50 em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC - Eduardo Knapp/Folhapress
Boneco de pano Lula, vendido a R$ 50 em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL, em São Bernardo do Campo

09/11/2019 19h18

Resumo da notícia

  • Ato parou o centro da cidade de São Bernardo do Campo
  • Pessoas se apertavam entre árvores, capôs de carros e em muros
  • Lideranças políticas foram tietadas, como Freixo e Haddad
  • Público reclamou do preço da cerveja, entre R$ 10 e R$ 12

Quem andava pelas ruas do centro de São Bernardo do Campo, na Região Metropolitana de São Paulo, custava a entender a movimentação atípica e a quase onipresente cor vermelha nas camisas das pessoas que andavam na mesma direção.

Lula!" Lula!", gritava um homem sem camisa em uma sacada de uma das casas da região. O nome do ex-presidente, libertado na tarde de sexta (8) da prisão em Curitiba, seria a palavra mais falada do dia —em forma de prece, louvor e animação.

Quem estava de carro precisava de paciência para chegar ao sindicato, onde foi estacionado um trio elétrico para o discurso do ex-presidente, no mesmo local em que ele falou em abril de 2018 antes de se entregar à Polícia Federal.

Com trânsito bloqueado nos quarteirões próximos, as ruas estavam paradas. Tudo que a Polícia Militar, presente no local, conseguia informar é que havia "gente demais". No auge da lotação, às 15h, enquanto Lula discursava, levava-se mais de uma hora para atravessar cerca de um quarteirão.

As falas do ex-presidente eram recebidas como mensagens divinas por grande parte dos presentes. Não foram raros os momentos de choro, euforia e devoção em meio a gritos de "eu te amo" e "meu presidente".

Lula estava à vontade, conseguia arrancar aplausos do público a cada 5 minutos. "Eu queria ver ele num debate com o [presidente Jair] Bolsonaro! Não ia sobrar nem o pó", afirmou o comerciante Carlos Alexandre, que ostentava um boné de Fidel Castro e uma camisa com o rosto da ex-primeira-dama Marisa Letícia.

A vontade de chegar perto de Lula era tão grande que as pessoas encontravam espaço onde não tinha, se apertando entre árvores, capôs de carros e em cima dos muros. Mas o ex-presidente não foi o único disputado.

Apalpados e assediados

Quase todos os apoiadores que estavam em cima do trio elétrico foram tietados ao descer do carro com pedidos de selfie, puxões e declarações de amor. O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), um dos mais aclamados, levou um apertão nas nádegas enquanto passava na multidão rumo ao prédio. "Eu sou apaixonada por você", declarou uma militante.

Fernando Haddad também ouviu sua parcela de "lindo" e "gostoso" em meio à multidão. O tratamento lembrava o de fãs de um astro de rock: ao tentar deixar o evento, ao fim da tarde, o carro do ex-candidato do PT à Presidência foi parado e os militantes, de maioria jovem, pediram que ele descesse. Depois de alguns minutos Haddad atendeu ao pedido, mas a aglomeração aumentou tanto que ele teve de correr de volta para o prédio do sindicato, entrando pela garagem.

Era um público heterogêneo, de famílias com crianças no colo e grupos de amigos a representantes de comitês petistas de diversos lugares e diferentes sindicatos. Havia uma forte presença jovem. "Eu só consegui fazer faculdade porque meus pais melhoraram de vida no governo Lula. Para pessoas como eles, era um sonho. Fui a primeira da minha família a ter um diploma", afirmou Karla Camargo, 24, recém-formada em direito e filiada ao PT. Junto aos amigos, ela entoava gritos de "o presidente voltou", "Lula, presente, vai ser meu presidente" e outros ligados à juventude petista.

"Preço da direita"

Ao redor do sindicato e dentro do prédio vendia-se de tudo: bandeiras do Lula e do PT, camisetas e broches de diversos tipos, livros de José Dirceu e do revolucionário russo Liev Trotsky, jornal do PCO ("edição histórica", anunciava o vendedor) e até bonecos de pano de Lula com a faixa presidencial, estes vendidos a R$ 50. "Meio salgado, eu sei. Mas não quis barganhar, hoje o momento vale", afirmou Flavia Lombini, que comprou um dos brinquedos.

As camisas eram vendidas por R$ 35. Os rostos de Lula e da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), assassinada no ano passado, eram as que mais saíam. Os broches, vendidos a R$ 3, também saíram muito, em especial os de repúdio ao fascismo e com mensagens como "AI-5 nunca mais".

"O homem mal saiu da cadeia e já movimenta mais a economia que o ministro [Paulo Guedes]", brincou o ambulante Marcelo Arantes. Como todo evento público, não faltavam ambulantes de bebidas e carrinhos de cachorro-quente.

Arantes estima que tenha faturado entre R$ 350 e R$ 400. "Pessoal tá com sede." O movimento não agradou a todos: muitos reclamavam do preço da cerveja, vendidas entre R$ 10 e R$ 12. "Isso é preço para a direita", reclamou uma cliente. "O mercado cobrou R$ 6 para todo mundo, moça", respondeu o vendedor.

"O Lula tá solto e a gente tá preso?"

Depois do discurso de Lula, sem que ninguém mais assumisse o microfone, a maioria dos presentes se dissipou, lotando as barraquinhas de comida e bares próximos. Dentro do sindicato, o ex-presidente decidiu receber alguns militantes. Uma fila enorme e demorada se formou. "O Lula tá solto e a gente tá preso?", brincou a militante Jéssica Alves, que esperava há mais de uma hora à frente da sala onde ele estava.

Na rua as coisas estavam um pouco mais animadas. O Coletivo Democracia Corinthiana deixou o clássico com o Palmeiras de lado e começou a tocar na rua músicas políticas e sambas conhecidos, entrelaçados habilmente com a música da campanha presidencial de 1989, hit do dia. Também teve espaço a marchinha corintiana "Doutor Eu Não Me Engano" adaptada com o nome do presidente Jair Bolsonaro e sem o "corintiano" da letra original.