TRF-4 burlou o STF no caso Lula? Advogados opinam
Resumo da notícia
- O TRF-4 desconsiderou decisão do STF sobre alegações finais
- Para advogados, o tribunal contrariou decisão superior
- Lula deve recorrer com base em decisão semelhante proferida em agosto
O TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) decidiu ontem aumentar a pena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do sítio de Atibaia. A decisão só foi possível porque os desembargadores aproveitaram uma brecha deixada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que em outubro decidiu que réus devem se defender por último em um processo, o que não aconteceu com Lula (PT).
Para entender a polêmica, que deve resultar em um recurso do ex-presidente ao STF, o UOL conversou com quatro advogados constitucionalistas especializados em direito penal.
Qual foi a brecha deixada pelo STF?
Em 27 de agosto, o STF anulou uma sentença do então juiz Sergio Moro que condenou o ex-presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, na Lava Jato. O processo voltou à 1ª instância porque o réu não pôde se defender depois das acusações que havia recebido, como aconteceu com Lula no caso do sítio.
Em outubro, o Supremo voltou ao tema, quando decidiu que as alegações finais dos réus precisam ser apresentadas depois de quem delatou. Os ministros, no entanto, adiaram outro julgamento (em data ainda não definida) para decidir em quais situações pode haver anulação de sentença em casos em que o existam réus delatores e delatados.
Uma dessas situações é quando o réu sofre prejuízo pelo fato de ter se manifestado simultaneamente ao delator. "Será que a nova regra valeria para aquela data em diante ou retroativa? Isso não foi decidido até agora", afirma a advogada Vera Chemim.
"A partir do momento em que deixaram essa janela aberta, o TRF-4 decidiu utilizá-la", afirma a especialista. "Eles pontuaram bastante que não teria havido prejuízo ao Lula, uma interpretação que coube aos desembargadores."
O TRF-4 agiu bem?
Para o advogado Eduardo Tavares, o tribunal regional errou ao interpretar que não houve prejuízo ao réu.
"O dever do Estado não é achar um culpado, mas garantir que o Ministério Publico prove a culpa ou o réu prove sua inocência. Quando inverto a ordem e a defesa fala antes da acusação, tem-se um prejuízo."
O advogado Conrado Gontijo concorda. "O TRF-4 contrariou uma orientação dada pelo Supremo. O prejuízo que o desembargador diz que não existiu está caracterizado com o fato de que todos apresentaram juntos suas alegações, um rito que não é aquele que o STF entendeu."
O advogado Adib Abouni acredita que "o TRF-4 foi contra uma decisão do STF, o que possivelmente será reformado porque é um afronta a um entendimento superior". "O Supremo deu uma orientação no caso Bendine, mas a lógica dessa decisão foi contrariada no caso do sítio."
Por que os desembargadores decidiram assim?
Para Abouni, as instâncias inferiores usam dois pesos e duas medidas para decisões do Supremo. "Quando é para prender, eles acatam as decisões imediatamente, mas se é em favor do réu, eles interpretam a decisão."
Ele cita as prisões em segunda instância. "Quando o Supremo decidiu em 2016 que a prisão poderia acontecer antes do fim do processo, todas as instâncias acataram."
Para Tavares, o clima político estabelecido no Brasil nos últimos anos influencia as decisões em torno da operação Lava Jato. "Esse clima de insegurança entre esquerda e direita contaminou a Lava Jato. Os aplausos e as críticas afetam a decisão de quem julga."
O que acontece agora?
Os advogados acreditam que o ex-presidente recorrerá da decisão. A advogada explica que a defesa de Lula tem algumas opções, como recorrer ao TRF-4 ou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), mas que "a melhor delas" é uma reclamação constitucional.
"É diferente de um recurso extraordinário, que discute uma afronta a um artigo da Constituição. Não é o caso. Uma ação constitucional considera que uma decisão do Supremo foi desrespeitada."
Segundo Abouni, se a defesa de Lula for ao STF, os ministros poderão aproveitar o julgamento para decidir em quais situações poderá haver anulação de sentença.
"Como na época as condições não eram matéria do recurso julgado, os ministros não decidiram. O Supremo precisa ser provocado sobre o assunto, e este pode ser o momento."
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