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Após tour, Bolsonaro fala em "decreto" para liberar trabalho sem isolamento

Bolsonaro fala com vendedor de churrasquinho em Taguatinga - Reprodução
Bolsonaro fala com vendedor de churrasquinho em Taguatinga Imagem: Reprodução

Hanrrikson de Andrade e Igor Melo

Do UOL, em Brasília e no Rio

29/03/2020 12h59Atualizada em 29/03/2020 22h58

Na contramão do ministro da Saúde, que reforçou ontem a importância de os brasileiros ficarem em casa para barrar o novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro (Sem partido) anunciou hoje que estuda liberar o retorno às atividades de trabalhadores formais e informais que precisam "levar sustento" para casa.

"Estou com vontade de baixar um decreto amanhã. Toda e qualquer profissão legalmente existente ou aquela que é voltada para a informalidade, se for necessária para levar sustento para seus filhos, para levar um leite para seus filhos, arroz e feijão para sua casa, vai poder trabalhar".
Bolsonaro, contrariando o Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde.

O presidente da República não informou que profissão se encaixaria na categoria "necessária para levar sustento para os filhos", nem qual seria excluída desse critério.

A fala ocorreu após visitar diversos pontos do Distrito Federal neste domingo, desrespeitando as orientações não apenas das autoridades de saúde do Brasil, mas do mundo, que pedem para evitar aglomerações e contato próximo.

Segundo projeções do ministério da Saúde, se os contatos sociais não forem reduzidos no Brasil, os casos de coronavírus devem duplicar a cada três dias. Segundo dados oficiais, o país tem 3.904 infectados pelo coronavírus e 111 mortos. Mas os números reais são muito maiores, já que muitos infectados não têm sintomas e não há testes para todos.

Erro já feito pela Itália

Ao incentivar a volta ao trabalho, Bolsonaro:

Em Milão, a prefeitura da cidade, governada pela centro-esquerda, minimizou a crise e incentivou, com apoio de donos de restaurantes, a circulação dos cidadãos. O país se tornou ícone do descontrole da covid-19.

O coronavírus está obrigando diversos países, e não só o Brasil, a frear suas atividades econômicas. E o desemprego é uma ameaça enfrentada por países mais ricos e mais pobres. Para manter renda e evitar empobrecimento em massa, países tão diferentes como EUA e Peru estão investindo em distribuição de renda para a população.

Por aqui, o Congresso aprovou R$ 600 para trabalhadores informais — medida que ainda precisa ser aprovada pelo Senado.

Insight

Mas apesar dos riscos de manter as pessoas circulando, das experiências negativas no exterior e das alternativas em debate no mundo, Bolsonaro hoje afirmou que teve "um insight" e insiste em incentivar a exposição dos brasileiros ao coronavírus.

Durante a visita a trabalhadores informais no Distrito Federal, ele rebateu o questionamento sobre a pertinência de seu passeio.

"Eu também estou trabalhando. Considero essa minha atividade um serviço. Estou do lado do povo para saber os problemas deles", argumentou. "Eu estou na linha de frente com meus soldados. Sou general, mas estou na linha de frente. Se tiver que fazer de novo, farei", disse em outro momento.

Bolsonaro diz que vai enfrentar pandemia "como homem, não como moleque"

Demonstrando irritação, Bolsonaro voltou a fazer referência —sem citar nomes— à disputa com governadores como João Doria (PSDB), de São Paulo, e Wilson Witzel (PSC), do Rio de Janeiro, que vêm adotando medidas de interrupção de atividades para conter a propagação do vírus —como fechamento de estabelecimentos comerciais e cancelamento de aulas em escolas e universidades. O presidente disse que quem estiver "trabalhando de casa" vai ser posto de férias ou demitido se a situação continuar.

"Não podemos tratar esse assunto com demagogia, disputa eleitoral. Tem que tratar com seriedade. Temos que cuidar da vida e do emprego", disse. "Vai enfrentar como homem, pô. Não como moleque. Vamos enfrentar o vírus como realidade, todos nós vamos morrer um dia", afirmou.

Ele também criticou a decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que o proibiu de adotar medidas contra o isolamento social e suspendeu a validade de trechos de dois decretos que classificavam igrejas e casas lotéricas como atividades essenciais, garantindo o funcionamento mesmo com orientações contrárias de estados e municípios.

"Botei [em decreto] também as casas lotéricas, a primeira instância derrubou. Vai começar a guerra de liminares. Tenho certeza que a maioria dos juízes não daria essa liminar. [O juiz que deu] Não tem problema nenhum, o salário cai na conta todo mês", criticou.

"Tenho que assumir riscos", diz Bolsonaro sobre medidas

O presidente ainda afirmou que não pode "ficar em cima do muro" ou se preocupar "com o politicamente correto" na gestão da crise do coronavírus. Em diversos momentos da entrevista a repórteres na entrada do Palácio do Alvorada, sua residência oficial, ele disse que apesar "do problema do vírus", é preciso preservar os empregos.

"Como chefe que sou tenho que assumir riscos, para o bem ou para o mal. Tenho que tomar decisão. Não posso ficar em cima do muro. Não posso me furtar de assumir posições. Eu vou para o meio do povo. Quem me critica não vai. Eu vou porque eu sou povo, estou do lado do povo brasileiro. E assim no meu entender tem que se comportar um chefe de Estado", afirmou.