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Bolsonaro usa 'literalidade' e parte para guerra de narrativas sobre vídeo

Hanrrikson de Andrade e Carla Araújo

Do UOL, em Brasília

12/05/2020 17h37

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se apegou à literalidade ao negar hoje as primeiras informações sobre o conteúdo do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril —quando teria pressionado Sergio Moro, sob ameaça de demissão, a trocar o comando da superintendência da Polícia Federal no Rio.

Esta é a versão, narrada pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, que está sendo investigada em inquérito do STF (Supremo Tribunal Federal). Segundo pessoas que viram o vídeo, o presidente citou suposta perseguição à sua família para justificar a necessidade de fazer mudanças em unidades regionais da PF.

Hoje, Bolsonaro partiu para a guerra de narrativas e, alinhando a estratégia de defesa em conjunto com os ministros Walter de Souza Braga Netto (Defesa), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), dobrou a aposta:

"Não existe, no vídeo todo, a palavra 'Polícia Federal' nem 'superintendência'. Não existe 'superintendente' nem 'Polícia Federal'. Essa interpretação vai da cabeça de cada um. Não tem a palavra 'investigação'."

Na prática, se o vídeo vier a público por decisão do ministro da Corte que conduz o inquérito, o decano Celso de Mello, a versão de Bolsonaro será colocada em confronto com o contexto de suas falas na reunião.

O levantamento do sigilo é justamente um dos pleitos dos advogados de Moro. Por esse motivo, aliados do presidente consideram que esta não foi uma movimentação fortuita.

Questionado se ele teria, durante a reunião ministerial de 22 de abril, atribuído suposta imposição de troca na PF à segurança da família, Bolsonaro negou novamente o teor das acusações e disse que a proteção aos filhos é assunto do Gabinete de Segurança Institucional.

"A preocupação minha sempre foi, depois com a facada, de forma bastante direcionada para a segurança minha e da minha família. Em Juiz de Fora, o Adélio cercou o meu filho no vídeo. No meu entender, talvez quisesse assassinar ele ali. A segurança da minha família é uma coisa. Não estou e nunca estive preocupado com a Polícia Federal. (...) A segurança da minha família é com o GSI."

A PF nunca investigou ninguém na minha família. Isso não existe no vídeo. Vocês [jornalistas] estão sendo mal informados.
Jair Bolsonaro

Segundo apurou o UOL, a orientação entre os ministros é para que seja mantida a "tranquilidade" em meio ao confronto de narrativas. Há o entendimento, corroborado por análises jurídicas, de que o vídeo não comprovaria tentativa de interferência na Polícia Federal.

De acordo com a avaliação de militares ouvidos pela reportagem, declarações mais exaltadas do presidente não devem ser consideradas com um acirramento da relação entre Bolsonaro e seus ministros. Dessa forma, o conteúdo do vídeo tende a ser relativizado.

Um general que não faz parte diretamente do governo, mas que convive e conhece bem os ministros palacianos, disse que até mesmo eventuais desentendimentos entre Bolsonaro e seus subordinados podem ter "discussões acaloradas e soluções pacíficas".

"Nos trabalhos de Estado-maior estimulamos a todos opinarem, apresentarem suas sugestões e ideias. As conversas são na maioria das vezes muito acaloradas. Até o momento em que o Comandante, Chefe ou mais antigo bate o martelo. A partir daí somos treinados a atuar como se aquela decisão fosse a de cada um, independentemente de concordarmos ou não."