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Dodge: PGR deve ter autonomia e não pode responder ao governante de plantão

Do UOL, em São Paulo*

10/06/2020 11h25Atualizada em 10/06/2020 13h39

A ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge falou hoje, ao UOL Entrevista, sobre a importância da autonomia e independência para que o órgão trabalhe adequadamente e disse que é dever de todo procurador zelar por isso. Leonardo Sakamoto, colunista do UOL, conduziu a conversa.

"As pessoas de um modo geral devem achar estranho falar em valores tão vagos, parecendo tão distantes da realidade, como independência e autonomia. Isso significa defender a Constituição, quando uma lei é inconstitucional e vimos muitas, muitas vezes aprovadas nos parlamentos estaduais e no parlamento federal", explicou ela.

Esta é a primeira entrevista que Dodge concede desde que deixou a chefia da PGR (Procuradoria-Geral da República), cargo que ocupou entre 2017 e 2019, indicada pelo então presidente Michel Temer (MDB).

Ainda sobre o papel do Ministério Público Federal, ela acrescentou que "é preciso apontar erros em políticas públicas que sejam estruturalmente discriminatórias, que não sejam efetivamente inclusivas de todas as pessoas e é preciso reprimir aqueles que cometem infrações."

"Para o Ministério Público fazer isso adequadamente, levando todas as questões que devem ser decididas ao conhecimento do Judiciário, só pode fazer bem, em plenitude, se tiver independência e autonomia, se não tiver que responder ao governante de plantão", continuou.

Ela lembrou que estes valores são uma novidade trazida pela Constituição de 1988 e disse que "nunca é demais" celebrar diariamente a Constituição brasileira.

Defesa de extensão do mandato

Durante a entrevista, Dodge defendeu que o mandato do procurador-geral da República seja estendido - atualmente, são dois anos, com a possibilidade de recondução.

Ela avaliou que o tempo é curto para fazer "tudo o que pode ser feito" e lembrou que em outros países o período em que os procuradores passam no cargo é maior.

"Me parece, e eu defendo esta ideia há algum tempo, me parece que estender o tamanho do mandato do procurador-geral vedando recondução seria alternativa que socorre melhor a ideia de independência e autonomia. Na maioria dos países o mandato é longo, como em Portugal, de 8 anos. No Brasil é de dois anos. Por experiência própria, é um período curto para fazer tudo o que se pode ser feito", avaliou.

"Discussões políticas são saudáveis"

Dodge afirmou que as discussões políticas na PGR têm mais elementos saudáveis do que nocivos, mas que é preciso sempre respeitar a Constituição.

"A sociedade brasileira é plural, e é importante que as instituições também reflitam essa pluralidade. Nós não queremos que a democracia seja o regime da ideia única", afirmou.

Segundo Dodge, as correntes dentro do Ministério Público são as mesmas que compõem a sociedade, porém o que não é negociável é o comprometimento com a Constituição.

"O nosso norte, a nossa referência, é esta lei que controla o funcionamento da própria instituição, e o nosso compromisso é atuar como fiscais da Constituição", declarou.

* participaram desta cobertura Afonso Ferreira, Fabio de Mello Castanho, Flávio Costa, Stella Borges e Talyta Vespa (redação) e Diego Henrique de Carvalho (produção)