Publicitário alvo da PF recebeu R$ 87 mil de deputados bolsonaristas
Resumo da notícia
- Ao todo, quatro deputados federais da base de apoio ao presidente Bolsonaro contrataram empresas de Sérgio Lima
- Os deputados tiveram o sigilo bancário quebrado pelo STF
- PGR e PF investigam relação de todos com a organização, financiamento e divulgação de manifestações contra a democracia
- Publicitário e deputados confirmam contratos, dizem não haver nenhuma ilegalidade e negam envolvimento com as manifestações
Alvo de uma ação de busca e apreensão em operação da Polícia Federal nesta semana que investiga a organização, financiamento e divulgação de manifestações antidemocráticas, o publicitário Sérgio Lima recebeu ao menos R$ 87.700 da cota parlamentar de quatro deputados da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na Câmara nos últimos seis meses.
Todos esses parlamentares tiveram o sigilo bancário quebrado nesta terça-feira (16) pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), ao lado de outros seis deputados e um senador.
De acordo com a prestação de contas e notas fiscais apresentadas pelos parlamentares e disponíveis no portal de transparência da Casa, Bia Kicis (PSL-DF), General Girão (PSL-RN), Aline Sleutjes (PSL-PR) e Guiga Peixoto (PSL-SP) contrataram os serviços de empresas do publicitário para cuidar de suas redes sociais. Os gastos foram declarados como "divulgação de mandato parlamentar" e são legais, permitidos pelo regimento interno da Câmara.
Os quatro são investigados no mesmo inquérito de Lima, que é o criador da identidade visual e articulador da "Aliança pelo Brasil", partido político que o presidente Bolsonaro pretende fundar. Todos negam qualquer irregularidade ou participação em atos contra a democracia (leia mais abaixo).
Cada parlamentar tem direito a uma cota mensal independente dos salários, incluindo o dos funcionários do gabinete, que varia entre R$ 30.788,66, no Distrito Federal, e R$ 45.612,53, em Roraima. O valor é destinado a despesas do mandato, como passagens aéreas, conta de celular e divulgação de mandato.
Segundo um policial que atua no caso, os deputados são suspeitos de ajudar a financiar e divulgar as manifestações antidemocráticas. O publicitário, por sua vez, é suspeito de atuar na divulgação das manifestações.
A investigação sobre manifestações de rua que pedem o fechamento do Congresso Nacional, do STF, intervenção militar e um AI-5 — ato institucional mais duro da ditadura brasileira (1964-1985)— é conduzida pela PF, depois de aberta pela PGR (Procuradoria-geral da República).
Segundo a PGR, uma das linhas de apuração busca esclarecer se parte dos investigados, entre eles influenciadores e ativistas, articulou-se com parlamentares e outras autoridades com prerrogativa de foro no STF para financiar e promover atos que se enquadram em práticas tipificadas como crime pela Lei de Segurança Nacional.
Na segunda (15), no âmbito do mesmo inquérito sobre protestos antidemocráticos, a ativista Sara Winter, do grupo bolsonarista "300 do Brasil", foi presa após operação da PF.
"Arbitrariedade e totalitarismo"
Quem mais gastou com os serviços de redes sociais prestados por empresas do publicitário com a cota parlamentar foi o deputado General Girão, com R$ 51.800 desde dezembro do ano passado, quando virou cliente de Lima. Naquele mês, o deputado pagou R$ 10.800 à S8 Sampa Agência de Propaganda —o publicitário afirma ao UOL que deixou a agência em dezembro, mas na Receita Federal, porém, ele ainda consta como sócio.
Em janeiro e fevereiro, os serviços da S8 custaram ao gabinete de Girão R$ 11.400 e R$ 7.400, respectivamente. De março a maio, último mês com a prestação de contas disponível no portal, o gabinete do deputado pagou R$ 7.400 à Inclutech Tecnologia da Informação, outra firma da qual Lima aparece como sócio.
Em resposta à reportagem, tanto Girão quanto Lima confirmam a prestação dos serviços nas redes sociais e negam qualquer envolvimento com os protestos antidemocráticos.
De acordo com a assessoria de imprensa de Girão, os serviços de Lima são referentes "a acompanhamento e análise de pautas políticas, elaboração e manutenção do site do deputado, relatórios diários de notícias (clipping) e atualização mensal de SEO no site", com relatórios diários, e seguem em curso.
Sobre a quebra de sigilo e as investigações da PGR, Girão afirma que não foi notificado e "buscará todas as medidas cabíveis para se contrapor a um ato que configura mais uma atitude de arbitrariedade e totalitarismo".
Em conversa por WhatsApp com a reportagem, o publicitário afirma que respeita as instituições brasileiras, confia na Justiça e tem a tranquilidade de dizer que possui uma relação comercial entre clientes e prestador de serviços com os deputados. "Nego peremptoriamente qualquer financiamento, divulgação ou organização de atos que sejam antidemocráticos", afirma ele sobre as investigações. Lima diz que está a disposição das autoridades para esclarecimentos.
"Iniciativa pacífica"
Outra cliente da Inclutech na Câmara, a deputada Aline Sleutjes investiu R$ 10 mil em março nos serviços da empresa, mas diz que se decepcionou. "Os serviços foram prestados somente no mês de março de 2020", diz. "Infelizmente, não tivemos os resultados esperados, nem o alinhamento da equipe contratada."
Sobre a quebra de sigilo, Sleutjes afirma que ficou sabendo do caso pela imprensa e que não foi notificada pelo STF, mas que está à disposição da Justiça.
"Nunca financiei nenhuma ação ou manifestação antidemocrática. Minha presença em manifestações, em Brasília, foram para apoiar o governo do presidente Jair Bolsonaro, em iniciativas pacíficas, livres e democráticas pois, além de ser vice-líder do governo, sou patriota, de direita e cidadã, e tenho o direito de me expressar e apoiar o governo", afirma ao UOL.
"Tivessem pedido eu abria"
O deputado Guiga Peixoto (PSL-SP) pagou, de março a maio, R$ 6.500 por mês à Inclutech. Ele foi um dos parlamentares que tiveram o sigilo bancário quebrado pelo STF. "Não tenho nada a esconder, tivessem pedido eu abria", afirma. Sobre a contratação dos serviços de Sérgio Lima, Peixoto afirma que suas redes sociais cresceram muito desde sua empresa as assumiu, e diz que o serviço é muito bom. "fiquei amigo dele, sem dúvida", diz.
"Eles acompanham meu mandato e fazem a divulgação nas minhas redes sociais", afirma Peixoto. "Fazem tudo para mim, as postagens, tudo. Eu apenas entro e acompanho o que esta sendo feito."
Sobre a investigação da PGR, ele diz que está tranquilo. "Não apoio e jamais apoiarei qualquer manifestação antidemocrática". afirma. "Desde o começo da pandemia, quando a Câmara aprovou a votação remota, eu estou na minha casa em Tatuí [no interior de SP], não fui à Brasília ou a qualquer protesto, jamais financiei nada disso."
Procurada pela reportagem por meio da sua assessoria de imprensa para falar sobre o gasto de R$ 6.410 feito por seu seu gabinete no mês de março com a Inclutech e sobre a investigação da qual é alvo, a deputada Bia Kicis não respondeu.
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