Marido de secretária do Amazonas lucrou com venda de respiradores, diz CPI
O marido da secretária de Comunicação do Amazonas, Daniela Assayag, foi um dos beneficiários da compra suspeita de superfaturamento de 28 respiradores inadequados em uma loja de vinho em plena pandemia do novo coronavírus.
Os documentos foram apresentados pelo deputado estadual Delegado Péricles Nascimento (PSL), presidente da CPI aberta na Assembleia Legislativa do estado para apurar gastos irregulares da gestão do governador Wilson Lima (PSC) na área da saúde. Ele os entregou à PF (Polícia Federal).
De acordo com documentos, o empresário e médico Luiz Carlos Avelino Júnior, marido de Daniela Assayag, é um dos sócios da Sonoar, uma das empresas que participaram do esquema de compra de ventiladores pulmonares que não serviam para tratar pacientes da covid-19.
A empresária Renata Mansur, presa na terça-feira durante deflagração da Operação Sangria, apresentou à PF outros documentos da venda de sua participação na Sonoar, que corresponde a 50% da firma, ao marido de Daniela Assayag.
A reportagem acessou os documentos que mostram que Avelino Júnior goza "de direitos e prerrogativas como sócio da Sonoar", desde o dia 1º de janeiro deste ano. A compra suspeita dos aparelhos foi efetivada em abril.
A secretária nega que ela e o marido tenham participado de qualquer ilegalidade (leia mais abaixo).
Conhecida por ter sido repórter da TV Globo em Manaus, Daniela Assayag é uma das mais próximas auxiliares do governador Wilson Lima, que fez carreira como apresentador de televisão. A jornalista foi chefe do político em um programa de uma TV local.
Apontado pela PF e pela PGR (Procuradoria Geral da República) como líder do esquema, Lima teve os bens bloqueados por decisão do ministro Francisco Falcão, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Operação Sangria
A PF descobriu que a Sonoar comprou os respiradores por quase R$ 1,1 milhão e os revendeu por R$ 2,48 milhões para a FJAP Cia Ltda, a adega contratada sem licitação pelo governo amazonense.
Pela venda dos aparelhos, a adega recebeu R$ 2,96 milhões dos cofres públicos do Amazonas. Essa dupla operação de compra e venda foi realizada em um intervalo de duas horas e meia no dia 8 de abril.
Logo depois, os donos da distribuidora de vinhos enviaram R$ 2,2 milhões para a conta de uma empresa americana no exterior, em uma ação que caracteriza lavagem de dinheiro, de acordo com a PGR.
O UOL revelou em abril, com exclusividade, que os aparelhos foram adquiridos com sobrepreço que ultrapassava os 300%. Em outra reportagem, mostrou que o governo ignorou uma proposta mais barata.
Secretária participou de reunião
O presidente da CPI revelou ainda que a secretária de Comunicação participou de uma reunião de caráter técnico da Susam (Secretaria de Saúde do Amazonas) que definiu os parâmetros para a compra dos respiradores.
"A fraude se inicia com a Sonoar. O pedido [do governo] era de 28 respiradores. E por que só 28? Porque era o que a Sonoar conseguia com seus fornecedores de outros estados. Todo esse interesse e a participação da secretária de comunicação na reunião de 3 de abril é pelo fato de a Sonoar pertencer ao marido dela", disse Nascimento.
Em depoimento prestado à CPI da Saúde, o ex-secretário estadual de Saúde Rodrigo Tobias afirmou que a pasta sofria "ingerências". Ele confirmou a participação de Daniela Assayag na reunião.
A demissão de Tobias foi anunciada pelo governador Wilson Lima no dia 8 de abril, mesmo dia em que a compra superfaturada de respiradores foi efetivada. Ele foi substituído por Simone Papaiz, presa na terça-feira.
Para a PGR, uma organização criminosa se instalou no governo do Amazonas e se aproveitou do momento de calamidade para desviar recursos públicos. A PF chegou a pedir a prisão do governador do Amazonas, mas o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Francisco Falcão negou.
Outro lado
Em entrevista coletiva, realizada ontem e acompanhada pelo UOL, a secretária de Comunicação do Amazonas, Daniela Assayag, respondeu por ela e pelo marido as acusações feitas pelo presidente da CPI.
Assayag confirmou que o marido tinha contrato de compra de parte da sociedade da Sonoar até maio deste ano. Porém, negou que ele seja sócio da empresa porque o negócio não teria sido efetivado, já que não foi paga a segunda parcela da compra.
Daniela Assayag declarou que o marido decidiu pelo distrato "diante de tudo isso que estava sendo feito" e que lhe teria faltado dinheiro para efetivar a compra.
A secretária afirmou que Luiz Carlos Avelino Júnior cedeu a parte que lhe cabia a uma outra empresária, porém o contrato de cessão só foi lavrado em cartório no dia 5 de junho.
Para a secretária, as acusações feitas contra ela e o marido no âmbito da CPI da Saúde "são mentirosas e de cunho político."
A secretária afirmou ainda que ela e o marido "não receberam nada" e que as contas bancárias dos dois estarão à disposição da PF e da CPI da Saúde.
"Estou aqui para falar sobre a acusação mentirosa que foi feita hoje a meu respeito. Não faço e não fiz parte de nenhum negócio feito de forma ilícita dentro do governo", disse durante a coletiva.
Assayag confirmou sua presença na reunião na Susam. "Fui para sugerir velocidade na resolução do problema para que nós da comunicação pudéssemos dar respostas mais rápidas".
O deputado estadual Delegado Péricles Nascimento (PSL), presidente da CPI, rebateu hoje as declarações de Daniela Assayag e disse que as justificativas da secretária são inverossímeis.
O UOL enviou questionamentos por email à secretária Daniela Assayag, mas assessoria do governo afirmou que eles seriam respondidos na coletiva.
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