Bolsonaro usa Líbano para aproximar Temer do governo e rachar MDB
Resumo da notícia
- Teme lidera missão de ajuda humanitária em reconstrução da capital libanesa
- Governo poderia ganhar melhoria na diplomacia e aproximação com políticos veteranos
- Gesto preocupa lideranças de ala mais jovem do MDB
Depois de não conseguir viabilizar a candidatura à reeleição em 2018 e, nos anos seguintes, acabar preso duas vezes em operações da Lava Jato, Michel Temer (MDB), 79, recolheu-se em São Paulo. O ex-presidente apareceu pouco desde que foi substituído por Jair Bolsonaro (sem partido). O cenário deve mudar a partir de hoje (12), quando ele viaja ao Líbano na condição de chefe de missão diplomática.
A convite de seu sucessor, Temer vai liderar a ajuda humanitária do Brasil no processo de reconstrução da capital libanesa, Beirute, atingida por uma grande explosão na semana passada.
Na prática, o gesto de Bolsonaro tira o experiente emedebista do ostracismo e o recoloca no jogo político do país. Articuladores do governo entendem que, se o trabalho no Líbano for bem feito, Temer pode até mesmo ajudar a melhorar a imagem do Brasil no contexto internacional —área que tem sido muito criticada sob gestão do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
Já no cenário interno, segundo apurou o UOL, há uma avaliação feita por militares ligados à cúpula bolsonarista de que a cartada do presidente é uma demonstração de "cordialidade" e contribui para reforçar a ideia de um novo ciclo do governante, uma fase "paz e amor".
Segundo palavras de um dos militares ouvidos pela reportagem, seria uma relação "ganha-ganha". Ele disse que Temer estava "sem função política" em São Paulo, "cuidando de seu escritório de advocacia e escrevendo poesia". Distante do xadrez político de Brasília, o ex-presidente limitava-se a dar entrevistas a jornais e emissoras de TV para falar de assuntos como reformas e disputas de poder.
O convite a Temer é também mais um passo que Bolsonaro dá a fim de estreitar laços com a ala veterana do MDB. A tática interessa ao governo porque o partido desembarcou recentemente do centrão —bloco informal que, após distribuição de cargos e outros gestos do presidente, firmou-se como base de sustentação do Executivo dentro do Congresso Nacional.
Mal-estar dentro do MDB
A aproximação, no entanto, tem gerado ruídos dentro do MDB. Lideranças da chamada ala mais jovem, que hoje ocupam os principais postos de comando, temem que o ressurgimento de Temer possa criar um "cordão umbilical" entre a legenda e o governo Bolsonaro.
O vínculo, segundo apurou o UOL, poderia atrapalhar os planos eleitorais da sigla para os próximos anos e estabeleceria um contraponto em relação ao discurso de independência que marcou o desembarque do centrão. Esse é a leitura feita por alguns parlamentares emedebistas.
A convergência de interesses entre Bolsonaro e MDB foi costurada pelo presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, que é aliado do presidente.
Nos últimos meses, MDB se recusou a negociar cargos diretamente com Bolsonaro em troca de apoio, diferentemente do que fizeram siglas como PP, PL e PSD. O partido de Temer, por outro lado, tem colaborado com o Executivo em votações de pautas econômicas e sociais.
Comandante nacional do MDB, deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP), manifestou-se publicamente sobre a questão e não criticou Temer. No entanto, o parlamentar afirmou que a viagem do ex-presidente da República tem "caráter humanitário" e não se daria em razão de uma aproximação do partido com o governo.
Desde o início do governo Bolsonaro, Skaf tem funcionado como uma ponte entre o governante e empresários brasileiros.
Também de origem libanesa, o empresário paulista é próximo ao ex-presidente e influente na política paulista. Skaf é filiado ao partido e perdeu a disputa ao governo de São Paulo para João Doria (PSDB-SP), em 2018.
Antes das eleições, em fevereiro de 2018, a relação de Bolsonaro com Temer era mais ácida. O então deputado atacou o ex-presidente e disse que ele já "roubou muita coisa". A declaração foi feita em postagem que fazia uma análise sobre a intervenção militar no Rio de Janeiro, em 2018.
No início deste ano, Bolsonaro fez um afago a Temer e manteve Carlos Marun no conselho de Itaipu. Marun é ex-ministro da Secretaria de Governo foi um dos principais defensores das denúncias de corrupção de Temer e Eduardo Cunha (MDB-RJ).
"Eu comentei que a palavra do presidente tem muita força institucional, ele com a palavra dele faz a agenda do país. E fazer a agenda do país às 8h30, 9h, quando o dia está começando, é muito sério. Às vezes há uma contradição qualquer, uma palavra mais forte ou agressiva, e isso acaba pautando o dia inteiro. E coincidentemente, não creio que tenha sido fruto deste meu palpite, talvez eu tenha ajudado, porque tenho absoluta convicção de que mais gente propôs isso a ele, e em um dado momento ele parou de fazer aquela palavra. Ele tomou essa providência que é para o bem dele, portanto para o bem do país", disse Temer.
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