'Falta de compostura': entidades jornalísticas criticam ameaça de Bolsonaro
Entidades jornalísticas e de defesa dos direitos humanos criticaram o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por ter dito a um repórter do jornal O Globo que teria vontade de "encher tua boca com uma porrada". Bolsonaro intimidou o jornalista ao ser perguntado sobre os depósitos feitos pelo policial militar aposentado e ex-assessor Fabrício Queiroz na conta bancária da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Durante visita à Catedral de Brasília, Bolsonaro foi questionado sobre o motivo dos depósitos feitos a Michelle. O presidente então reagiu à pergunta: "Minha vontade é encher tua boca com uma porrada, tá". O jornal "O Globo" repudiou o ataque a seu profissional.
O presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), Paulo Jeronimo, afirmou que falta compostura a Bolsonaro.
"Mais uma vez o presidente Jair Bolsonaro choca o país com seu comportamento grosseiro. Ao ser perguntado por um repórter do jornal "O Globo" sobre os sucessivos depósitos feitos pelo PM aposentado Fabrício Queiroz na conta bancária de sua esposa, o presidente respondeu afirmando que tinha vontade de "encher de porrada a boca" do jornalista, em declaração gravada", afirmou o presidente da ABI.
"Tal comportamento mostra não apenas uma inaceitável falta de educação. É, também, uma tentativa de intimidação da imprensa, buscando impedir questionamentos incômodos."
Por sua vez, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) afirmou, em nota que "o discurso hostil e intimidatório. de Bolsonaro contra a imprensa vem incentivando sua militância a assediar jornalistas nas redes sociais nos últimos meses, inclusive com ameaças de morte e agressões aos profissionais e a seus familiares."
O comunicado é assinado também pelas entidades Artigo 19, Conectas Direitos Humanos, Observatório da Liberdade de Imprensa da OAB e Repórteres sem Fronteiras. O teor completo da nota pode ser lido aqui.
Bolsonaro não responde a repórteres
Após a ameaça, os repórteres questionaram se a declaração do presidente era direcionada a toda imprensa ou apenas ao repórter que fez a pergunta. "Isso é uma ameaça presidente?", questionaram. Bolsonaro não respondeu e deixou o local em seguida.
Bolsonaro seguiu para o Palácio da Alvorada. Os jornalistas, entretanto, foram proibidos pelos militares de seguir para o espaço reservado à imprensa na entrada na residência oficial do presidente da República.
A reportagem do UOL pediu por e-mail que a Secom (Secretaria de Comunicação Social) do Ministério das Comunicações, que responde pela Presidência da República, se manifestasse sobre a intimidação do presidente ao jornalista. A Secom informou que o "Planalto não comentará" a declaração de Bolsonaro.
Sempre que passa pela Catedral nos fins de semana, o chefe do Executivo para e cumprimenta apoiadores. Como poucas pessoas estavam no local, ele permaneceu na Catedral por apenas cinco minutos.
Os depósitos de Queiroz a Michelle Bolsonaro
Queiroz e Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente, são investigados pelo Ministério Público do Rio por suposta rachadinha em seu gabinete na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro). A prática envolve a devolução de parte dos salários por servidores.
A investigação foi deflagrada pouco após as eleições de Bolsonaro à Presidência e de Flávio ao Senado a partir de relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) que identificou movimentações suspeitas de 74 servidores e ex-servidores da Alerj.
Entre elas, constava a "movimentação atípica" de R$ 1,2 milhão em uma conta no nome de Queiroz entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. Segundo o Coaf, as movimentações bancárias seriam "incompatíveis com a atividade econômica" de Queiroz e grande parte era feita em dinheiro.
Entre as transações, foi identificado um cheque no valor de R$ 24 mil favorecendo a então futura primeira-dama Michelle Bolsonaro. À época, Bolsonaro afirmou que o cheque era parte de uma dívida de R$ 40 mil que o ex-assessor tinha com ele. O dinheiro não foi declarado em seu Imposto de Renda.
Neste mês, reportagem da revista Crusoé revelou que Queiroz fez outros depósitos em cheque na conta de Michelle. Ao todo, o ex-assessor Queiroz e a mulher dele, Márcia Aguiar, repassaram R$ 89 mil para a conta de Michelle Bolsonaro entre 2011 e 2016 —antes portanto de o marido assumir a Presidência da República.
A defesa de Flávio Bolsonaro tem negado a prática de qualquer irregularidade.
Intimidação a jornalista ocorreu após aglomeração
A ameaça ao repórter ocorreu após Bolsonaro fazer uma visita à quadra 103 da Asa Norte, bairro de Brasília. A quadra residencial possui um conjunto de prédios que pertencem ao governo e são ocupados por militares.
Questionado pelos jornalistas, o presidente não esclareceu porque visitou o local. Os moradores da área se aglomeraram na prumada de entrada do prédio em que o Bolsonaro estava.
Ao deixar o local, ele posou para fotos com crianças, adultos e idosos, provocando uma grande aglomeração.
O uso de máscara e o distanciamento social são recomendados pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pelo Ministério da Saúde como principais medidas —juntamente com a correta higienização das mãos— para diminuir a disseminação do novo coronavírus.
Leia a nota do jornal "O Globo"
Nota do jornal O GLOBO sobre o ataque do presidente Jair Bolsonaro a um de seus repórteres:
"O GLOBO repudia a agressão do presidente Jair Bolsonaro a um repórter do jornal que apenas exercia sua função, de forma totalmente profissional, neste domingo.
Em cobertura de compromisso público do presidente, o repórter solicitou que ele se pronunciasse sobre reportagens da revista Crusoé e do jornal Folha de S.Paulo que, no início deste mês, informaram que o ex-assessor de Flávio Bolsonaro Fabrício Queiroz e a mulher dele depositaram cheques no valor de R$ 89 mil na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Anteriormente, o presidente havia prestado uma informação diferente sobre os valores.
Bolsonaro, então, em manifestação que foi gravada, não respondeu à pergunta e afirmou a vontade de agredir fisicamente o repórter.
Tal intimidação mostra que Jair Bolsonaro desconsidera o dever de qualquer servidor público, não importa o cargo, de prestar contas à população.
Durante os governos de todos os presidentes, o GLOBO não se furtou a fazer as perguntas necessárias para cumprir o papel maior da imprensa, que é informar os cidadãos. E continuará a fazer as perguntas que precisarem ser feitas, neste e em todos os governos."
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