Impeachment: tribunal misto aceita denúncia e manda Witzel deixar palácio
Por 10 votos a 0, o tribunal misto que julga o impeachment do governador afastado Wilson Witzel (PSC) aceitou a denúncia aprovada pela Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) e dará prosseguimento ao processo. Ele é acusado de crime de responsabilidade por participação em um esquema de corrupção na área da saúde. Segundo investigações do MPF (Ministério Público Federal) e do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro), houve desvios em grande parte dos contratos emergenciais firmados para o enfrentamento da pandemia de covid-19.
Além do prosseguimento da denúncia, o tribunal misto também aprovou por unanimidade o corte de 33% no salário de Witzel. A comissão foi formada por cinco desembargadores do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), escolhidos por sorteio, e cinco deputados estaduais eleitos na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
Por 6 votos a 4, o tribunal ainda aprovou o despejo do governador do Palácio Laranjeiras, sua residência oficial, onde permaneceu com a família mesmo depois de ter o afastamento determinado por decisão do ministro Benedito Gonçalves, relator de seu processo no STJ (Superior Tribunal de Justiça), em agosto. A Alerj também o afastou do cargo por seis meses em 23 de setembro, quando aprovou por unanimidade a abertura do processo de impeachment.
Como votaram os membros do tribunal:
- Waldeck Carneiro (PT), relator: pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- Carlos Macedo (Republicanos): pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- Dani Monteiro (PSOL): pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- José Carlos Maldonado de Carvalho: pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- Teresa de Andrade Castro Neves: pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- Ines da Trindade Chaves de Melo: pela aceitação da denúncia, corte do salário e despejo do palácio
- Chico Machado (PSD): pela aceitação da denúncia, corte do salário e contra o despejo do palácio
- Alexandre Freitas (Novo)*: pela aceitação parcial da denúncia, corte do salário e contra o despejo do palácio
- Fernando Rocha: pela aceitação da denúncia, corte do salário e contra o despejo do palácio
- Maria da Gloria Bandeira de Mello: pela aceitação da denúncia, corte do salário e contra o despejo do palácio
*Votou pelo recebimento parcial da denúncia, excluindo as alegações sobre a contratação da Iabas
A partir de agora, Witzel é formalmente denunciado. O relator tem dez dias para publicar o acórdão com seu voto. Em seguida, os advogados de Witzel terão 20 dias para apresentar sua defesa prévia e solicitar a elaboração de novas provas - como a oitiva de testemunhas e a realização de perícias.
"Processo político", alega Witzel
Após o final da sessão de hoje, o governador afastado disse ter a "consciência tranquila".
"Trata-se de um processo político para me desgastar, especialmente pela esquerda e por bolsonaristas extremistas, mas tenho confiança de que deputados e desembargadores farão um julgamento justo para o bem da democracia", escreveu ele no Twitter.
Witzel se diz vítima de perseguição por ter rompido politicamente com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a quem se associou durante a campanha eleitoral de 2018.
O advogado José Roberto Sampaio, um dos responsáveis pela defesa de Witzel, afirmou que a denúncia sobre o suposto vínculo do governador com a contratação da Iabas é genérica.
"Não pode Witzel estar à frente de todos os atos que são de incumbência do estado. A acusação é genérica. Há um esquema na saúde e Witzel está envolvido por causa de sua relação pessoal com alguns empresários, mais especificamente Mario Peixoto. E diz também que teria recebido contrapartida porque sua esposa teria sido contratada por empresas ligadas a Mario Peixoto. Indo a fundo, em relação à Iabas, o que foi descoberto até agora? Em relação à pessoa de Witzel, nada."
"Crimes que ceifaram vidas"
Segundo membro do tribunal misto a votar, o desembargador José Carlos Maldonado de Carvalho fez duras críticas à gestão de Witzel. Segundo ele, há indícios de crimes cometidos pelo governador, que teriam resultado na morte de pessoas por falta de atendimento em meio à pandemia da covid-19.
Da análise das narrativas e das provas até aqui há por certo, ao meu sentir, há indícios relevantes da prática de crimes que em razão da covid-19 ceifaram inúmeras vidas
Desembargador José Carlos Maldonado de Carvalho
Ainda segundo ele, não há motivos para rejeitar sumariamente a denúncia. "A longa narrativa da defesa não tem o condão de comprovar cabalmente quaisquer das causas condutoras de absolvição sumária", argumentou.
Críticas ao "outsider" da política
O deputado estadual Alexandre Freitas lembrou que Witzel se elegeu com o discurso de combate à corrupção, mas, em sua visão, não cumpriu o prometido ao assumir o cargo.
"Me parece que contra o denunciado pesa muito mais do que o alivia o fato de ser um outsider da política, ante as expectativas e esperanças de lisura e retidão depositadas sobre os ombros daquele que se elegeu afirmando que seria um combatente contra a corrupção e a ladroagem que ocorreram no estado. Que sob sua administração mudou de nome, de rosto e de CNPJ, mas não mudou de modus operandi e de volúpia", disse.
Apesar das críticas, Freitas abriu uma divergência sobre a amplitude da denúncia. Em sua visão, não há elementos para vincular Witzel com a contratação da OS (Organização Social) Iabas para a construção e operação de sete hospitais de campanha para vítimas de covid-19 —apenas dois saíram do papel, e o estado gastou R$ 256 milhões antes de qualquer leito estar em funcionamento.
Ele defendeu que o processo só desse sequência às denúncias referentes à requalificação da OS Unir, assinado diretamente por Witzel, e aos pagamentos por empresas ligadas ao empresário Mario Peixoto para o escritório de advocacia da primeira-dama Helena Witzel —para a PGR (Procuradoria-Geral da República), eles representam um pagamento dissimulado de propina para Witzel.
A desembargadora Ines da Trindade Chaves de Melo também lembrou o discurso de "outsider" feito por Witzel durante a campanha.
Wilson Witzel não era um outsider da política, pelo contrário. Foi eleito sob esse slogan, mas segundo depreende-se desses autos, mostra-se exímio conhecedor das relações políticas perpetradas nesse estado, diante de sua proximidade com antigos personagens do Rio de Janeiro, como, a exemplo, Mario Peixoto
Desembargadora Ines da Trindade Chaves de Melo
Divergência sobre despejo do palácio
Enquanto a admissibilidade da denúncia foi aprovada pelo tribunal misto por unanimidade, houve uma divisão no plenário em relação ao despejo do governador, mas ele acabou aprovado por 6 votos a 4.
Votaram favoráveis à medida os deputados Waldeck Carneiro (PT), Carlos Macedo (Republicanos), Dani Monteiro (PSOL), bem como os desembargadores José Carlos Maldonado de Carvalho, Teresa de Andrade Castro Neves e Ines da Trindade Chaves de Melo. Os desembargadores Fernando Foch e Maria da Gloria Bandeira de Mello, e os deputados Chico Machado (PSD) e Alexandre Freitas (NOVO) votaram contra.
Com a decisão, Witzel será notificado para que deixe o local em até dez dias depois da publicação do acórdão com o voto do relator.
Fernando Foch abriu divergência sobre o despejo de Witzel do Palácio Laranjeiras. Segundo ele, "residir no Palácio Laranjeiras não é um ato de exercício do governo do Rio de Janeiro".
O magistrado ainda destacou que o pedido não constava na denúncia feita originalmente pelos deputados estaduais Luiz Paulo (sem partido) e Lucinha (PSDB).
"Não se pode surpreender quaisquer das partes. Acho que isso surpreenderia o denunciado", argumentou.
A desembargadora Teresa de Andrade Castro Neves, por sua vez, defendeu que Witzel seja retirado do Palácio Laranjeiras. Segundo ela, é um "contrassenso a permanência na residência oficial" que ele continue no prédio mesmo afastado do cargo. "[O despejo] É consequência lógica o afastamento dele do governo", avaliou.
Próximos passos
O relator Waldeck Carneiro afirmou que já tem pronta uma lista de pessoas que deseja convocar para depoimentos —providência que precisa de aprovação da maioria dos membros. Entre elas, está o próprio governador Wilson Witzel.
"Não vou adiantar os nomes, mas tenho uma relação de pessoas que vou propor que sejam ouvidas. Entre elas, o governador", disse.
Perguntado pelos jornalistas, ele também confirmou que figuram nessa lista o ex-secretário de Saúde Edmar Santos, que chegou a ser preso preventivamente em meio às investigações, o empresário Edson Torres —que confessou ter entregado valores em dinheiro vivo a Witzel— e representantes das OSs Iabas e Unir.
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