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STF proíbe aproximação de Reis e alvos da PF à Praça dos Três Poderes

Lucas Valença, Rafael Neves e Stella Borges

Do UOL, em Brasília e São Paulo

20/08/2021 10h36

Na decisão em que autoriza o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra o deputado bolsonarista Otoni de Paula (PSC-RJ), o cantor Sérgio Reis e outros alvos, o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou que os investigados "pretendem utilizar-se abusivamente dos direitos de reunião, greve e liberdade de expressão, para atentar contra a Democracia, o Estado de Direito e suas Instituições", "inclusive atuando com ameaça de agressões físicas".

O ministro cita uma manifestação da PGR (Procuradoria-Geral da República) que sustenta que os investigados "têm convocado a população, através de redes sociais, a praticar atos criminosos e violentos" de protesto às vésperas do feriado da Independência do Brasil, comemorado em 7 de setembro, durante uma suposta manifestação e greve de "caminhoneiros".

No documento de 22 páginas, o ministro determinou ainda que os investigados fiquem proibidos de circular até um quilômetro de raio da Praça dos Três Poderes, dos ministros do STF e de senadores. A restrição não se aplica ao deputado, "em razão da necessidade do exercício de suas atividades parlamentares".

Além de Otoni e Sérgio Reis, o ministro também determinou instauração de inquérito contra Marco Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, Eduardo Oliveira Araújo, Wellington Macedo de Souza, Antônio Galvan, Alexandre Urbano Raitz Petersen, Turíbio Torres, Juliano da Silva Martins e Bruno Henrique Semczeszm. O UOL tenta localizar a defesa dos citados. O deputado Otoni disse que não irá recuar "um milímetro" em relação aos seus posicionamentos.

Segundo o ministro, as manifestações, as quais classificou como "criminosas e antidemocráticas", estão sendo programadas para a proximidade do feriado "e os investigados estão se valendo de publicações em redes sociais para instigar os seus seguidores, e tentar coagir a população brasileira em geral, a atentar contra o Estado Democrático de Direito brasileiro e suas Instituições republicanas, inclusive com incentivo a atos expressos de ameaça e violência física".

Condutas criminosas decorrentes do abuso e desvio no exercício de direitos constitucionalmente previstos não podem ser impunemente praticadas para atentar, coagir, desrespeitar ou solapar a Democracia, o Estado de Direito e suas Instituições Trecho de decisão do ministro Alexandre de Moraes

Moraes aponta que, conforme manifestação da PGR, o objetivo dos investigados, é dar um "ultimato" no presidente do Senado, invadir o prédio do STF, "quebrar tudo' e retirar os magistrados dos respectivos cargos "na marra".

"Não trata de mera retórica política de militante partidário, mas, sim, de atos materiais em curso conforme acima descrito, que podem atentar contra a Democracia e o regular funcionamento de suas Instituições", destacou a PGR.

Moraes ordena que investigados sejam ouvidos

Moraes ordenou ainda que os investigados sejam ouvidos pela Polícia Federal e a expedição de ofício às empresas responsáveis por redes sociais para que bloqueiem os perfis de titularidade dos envolvidos, e a proibição de se comunicarem entre si e de participarem de eventos em ruas e monumentos no Distrito Federal.

A decisão do ministro foi assinada eletronicamente na última quarta-feira (18).

Alexandre de Moraes também ressalta que os direitos de reunião, greve e liberdade de expressão, "não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas e criminosas".

"O exercício da liberdade de expressão não se reveste de caráter absoluto, não permitindo a organização de empreitadas criminosas, travestidas de reuniões não pacíficas onde se pretenda a utilização de coação, força e violência para atingir objetivos ilícitos", afirma.

Bloqueio de Pix

Outra medida autorizada por Moraes foi o bloqueio de uma chave Pix pela qual os investigados vinham angariando doações. Segundo a PGR, o dinheiro era revertido para um grupo chamado "Coalização Pro-Civilização". A entidade é presidida por Alexandre Petersen, um dos alvos da operação de hoje.

De acordo com a PGR, esta associação é responsável pelo domínio do site "Brasil Livre", que vinha convocando bolsonaristas para atos contra o STF em 7 de setembro. A ordem de Moraes é para que a chave Pix e a conta bancária vinculada a ela sejam bloqueadas em até 24 horas.

Ataques ocorreram em julho

Segundo Alexandre de Moraes, o início dos ataques ao STF ocorreu em 7 de julho deste ano, quando, durante uma transmissão ao vivo intitulada "vamos fechar o Brasil", o caminhoneiro Marcos Antônio Pereira, "incitou seguidores" a "partirem pra cima" dos senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL), presidente e relator da CPI da Covid, respectivamente.

O magistrado também lembra que, no dia seguinte, o mesmo caminhoneiro incitou apoiadores a "exigir" a exoneração dos 11 ministros do Supremo, pedindo, portanto, o fechamento do STF, algo que pode ser enquadrado como crime.

"Na ocasião, diz ter feito um contato com 'o agronegócio', que irá 'apoiar sua causa', e que pretende 'levantar empresários' para 'custear a viagem' de populares até a capital federal e que tem a pretensão de 'salvar o país dessa carniça podre chamada ministros podres do STF'", lembrou o magistrado.

Segundo Moraes, a gravidade dos fatos investigados foi "amplamente exposta" pela PGR. Como exemplo, o ministro cita uma fala de Sérgio Reis: "(...) enquanto o Senado não tomar essa posição, [os manifestantes irão] ficar em Brasília e não [sairão] de lá até isso acontecer. Uma semana, dez dias, um mês e os caras bancando tudo, hotel e tudo, [sem gastas] um tostão. E sem em 30 dias [o Senado não destituir os ministros do Supremo, os manifestantes irão] invadir, quebrar tudo e tirar os caras na marra".

No despacho, o ministro também narra que o cantor Sérgio Reis "sugere que o movimento conta com apoio financeiro" para instalar manifestantes contra o Poder na capital federal.

"Seria, em tese, uma forma de forçar os senadores a aprovarem o afastamento dos magistrados", afirma Moraes.

Outro lado

O UOL entrou em contato com os investigados que não se manifestaram publicamente sobre a operação. Entre eles, Antônio Galvan não deu resposta pública, mas a Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja), órgão do qual é presidente, negou qualquer relação com ataques às instituições da democracia.

Além disso, a associação afirmou não ter laços com as manifestações planejadas para o dia 7 de setembro. Em nota, a Aprosoja disse que "não financia e tampouco incentiva a invasão do STF (Supremo Tribunal Federal) ou quaisquer atos de violência contra autoridades, pessoas, órgãos públicos ou privados em qualquer cidade do país".

Já Zé Trovão e Turíbio gravaram um vídeo no Instagram (veja aqui) afirmando que não são "bandidos, mas sim trabalhadores" e que estão fazendo "tudo dentro das quatro linhas da Constituição".

A defesa de Juliano Martins disse que os "fatos não condizem com a verdade, tratando-se de mera especulação sem quaisquer provas, o que restará comprovado durante a instrução processual". Segundo as advogadas, ele está colaborando com as investigações.

Defesa de Otoni

O advogado do deputado Otoni de Paula (PSC-RJ), Marcelo Brunner, disse ao chegar à Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro que o parlamentar não irá depor hoje. Ele afirmou que irá lutar para fazer valer o que determina a lei em relação a depoimentos de autoridades.

"No caso de presidente da República, vice-presidente, deputado federal e etc é ajustado entre a autoridade policial e a autoridade a ser ouvida dia e hora [para o depoimento]", afirmou Brunner.

A prerrogativa consta no artigo 221 do Código de Processo Penal, que faculta a autoridades o direito de agendar o momento em que prestarão esclarecimentos à Justiça.

Marcelo Brunner fez coro com Otoni de Paula e também fez críticas ao STF por conta da operação de hoje. "Vivemos tempos sombrios na nossa nação. Rui Barbosa, o maior jurista que tivemos, disse que a pior ditadura é a ditadura de toga. Não estou me referindo a ninguém especificamente", disse.

Ainda segundo o advogado, o parlamentar se mantém tranquilo, apesar de estar "irritado e chateado" com a operação. Questionado sobre o ministro Alexandre de Moraes — que já foi atacado por Otoni e autorizou a operação de hoje — ele questionou as ações do STF.

"O devido processo legal infelizmente vem sendo ignorado por um ou dois membros da nossa corte suprema", criticou.

* Colaborou Rayanne Albuquerque, do UOL, em São Paulo