Líderes que apoiaram impeachment de Dilma ganham afagos de Lula no Nordeste
A viagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Nordeste revelou que o discurso de "golpe" contra Dilma Rousseff, em 2016, ficou para trás. Durante as duas semanas em que esteve na região, Lula se encontrou com diversos apoiadores do impeachment da ex-presidente, destacando a lealdade de muitos políticos que foram, em outro momento, criticados pelo voto a favor do afastamento da petista.
Dilma, por sinal, não acompanhou o ex-presidente em nenhuma das agendas no Nordeste. Lula passou por Pernambuco, Piauí, Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte e Bahia.
O percurso começou em Pernambuco, com encontro com o governador Paulo Câmara (PSB). Em 2016, ele não só apoiou como liberou quatro secretários à época —que eram deputados federais licenciados— para votarem a favor do impeachment.
No Maranhão, Lula se reuniu com José Sarney e sua filha Roseana, além de Edison Lobão (todos do MDB). No Senado, Lobão votou a favor da saída definitiva de Dilma, enquanto o clã Sarney apoiou o impeachment e teve o ex-deputado federal Sarney Filho (PV) indicado como ministro do Meio Ambiente no governo Michel Temer.
No Ceará, o ex-senador Eunício Oliveira (MDB) também foi afagado por Lula, mesmo tendo sido a favor do impeachment. No estado, ainda teve conversa com o senador e pré-candidato pelo PSDB à Presidência, Tasso Jereissati.
No Rio Grande do Norte, não foi diferente: se reuniu com o ex-senador Garibaldi Alves (MDB), um histórico adversário político da governadora Fátima Bezerra (PT).
Olho em 2022
Com exceção de Jereissati, todos os outros encontros de Lula tiveram o objetivo de buscar uma aproximação para fisgar um apoio em 2022. No caso do MDB, por exemplo, há uma forte resistência da ala fora do Nordeste em apoiar o ex-presidente.
Em Natal, Lula foi questionado por um jornalista sobre o porquê da conversa com a família Alves, diante da divergência com o PT local e o voto a favor do impeachment em 2016. "A gente não pode ter medo de dizer sempre a verdade, doa a quem doer. É importante lembrar que Garibaldi foi presidente do Senado na minha gestão, foi ministro da companheira Dilma e MDB foi parceiro nosso por muito tempo", disse.
Nessa visita, eu não posso pensar com o fígado. Eu preciso pensar de forma civilizada em como é que a gente vai manter relações com as forças políticas desse país se ganhar as eleições. Vim conversar como uma pessoa civilizada, que teve apoio recíproco durante os meus mandatos. Por enquanto não conversamos sobre política.
Lula, ex-presidente
Em São Luís, Lula foi mais explícito. "Eu não posso querer voltar para disputar a eleição pensando em me vingar. Só tem algum sentido voltar a um cargo se eu tiver um compromisso, na minha consciência, de que a prioridade não é me vingar. E, quando um não quer, dois não brigam", afirmou.
Necessidade de aliados
Para a cientista política Luciana Santana, da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) e do Observatório das Eleições, a viagem de Lula foi pensada justamente para atrair lideranças de fora do PT e até de fora da esquerda para viabilizar sua candidatura em 2022.
Ele quer dizer com isso que, para vencer, você precisa de aliados, mesmo que tenham sido inimigos ou que tenham estado em espaços opostos, em outros momentos, como no caso do processo de impeachment da Dilma.
Luciana Santana, cientista política da Ufal
Ela lembra que o contexto, hoje, é muito diferente de 2002, quando ele fez a aliança com o PL e teve como vice o empresário José Alencar.
"Hoje claramente ele é o principal nome que poderia fazer frente a Bolsonaro, e sabe que precisa ter ali uma aliança ampla de apoios, que compreendam partidos de vários aspectos ideológicos. Foi isso que ele veio fazer no Nordeste, e é o que vai fazer em outros estados", afirmou.
Por fim, ela diz que o ex-presidente tem conhecido poder de articulação política e mais que nunca vai usá-lo até o início da campanha.
"Lula é um político nato, tem uma habilidade política impressionante. E isso tem a ver com toda trajetória política dele desde lá atrás, no movimento sindical; tem a ver com as derrotas que ele teve como candidato à Presidência, como presidente. Então ele sabe melhor do que ninguém as ações que devem ser adotadas para ter êxito", completa.
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