Bolsonaro veta criminalizar fake news ao revogar Lei de Segurança Nacional
Com quatro vetos, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou hoje a Lei nº 14.197, que revoga a LSN (Lei de Segurança Nacional) e adiciona ao Código Penal uma parte especial relativa aos crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Entre os vetos de Bolsonaro, o mais crítico se refere a um artigo que criminalizaria a promoção e financiamento de campanha de disseminação de fake news que comprometesse o processo eleitoral. O texto enviado pelo Congresso previa pena de 1 a 5 anos de reclusão para a prática.
Bolsonaro é atualmente um dos investigados no inquérito das fake news que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) por, entre outros motivos, difundir uma série de informações falsas e sem provas contra as urnas eletrônicas.
Os vetos de Bolsonaro serão analisados pelo Congresso Nacional em 30 dias e podem ser derrubados em caso de maioria absoluta na Câmara dos Deputados e no Senado. O texto aprovado pelo presidente entra em vigor em 90 dias.
Havia uma expectativa de um veto ao trecho que revoga a LSN sob orientação de parte da ala militar do governo, mas Bolsonaro optou por extinguir a lei criada ainda na Ditadura Militar.
Os trechos vetados pelo chefe do Executivo versam sobre:
- Promoção e financiamento de fake news no processo eleitoral
- Possibilidade de ação penal privada subsidiária em casos de crimes contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral
- Dos crimes contra a cidadania, como o atentado a direito de manifestação
- Casos de aumento de pena nos crimes previstos do texto se cometidos por funcionários públicos ou militares, ou ainda com "violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo
Por outro lado, Bolsonaro aprovou outros trechos considerados importantes da nova lei, como a dos crimes contra a soberania nacional e contra as instituições democráticas, que preveem penas para atos como "abolição violenta do Estado Democrático de Direito", "golpe de estado" e "interrupção do processo eleitoral". Veja texto completo aqui.
Entre as principais mudanças do novo texto em relação à LSN está a retirada da previsão dos crimes de calúnia e difamação contra os presidentes dos três Poderes federais.
A Lei de Segurança Nacional foi sancionada em 1983 pelo último presidente do regime militar, João Figueiredo. Recentemente, voltou a ganhar destaque porque foi aplicada pelo Ministério da Justiça contra críticos do presidente Bolsonaro.
Justificativas de Bolsonaro
Para vetar o trecho que trata sobre fake news, Bolsonaro justificou que o dispositivo contraria o interesse público "por não deixar claro qual conduta seria objeto da criminalização, se a conduta daquele que gerou a notícia ou daquele que a compartilhou (mesmo sem intenção de massificá-la), bem como enseja dúvida se o crime seria continuado ou permanente, ou mesmo se haveria um 'tribunal da verdade' para definir o que viria a ser entendido por inverídico a ponto de constituir um crime punível" pelo Código Penal.
Além disso, segundo o governo, "a redação genérica tem o efeito de afastar o eleitor do debate político, o que reduziria a sua capacidade de definir as suas escolhas eleitorais, inibindo o debate de ideias, limitando a concorrência de opiniões, indo de encontro ao contexto do Estado Democrático de Direito, o que enfraqueceria o processo democrático e, em última análise, a própria atuação parlamentar."
Sobre o veto à previsão de aumento de pena, Bolsonaro justificou: "A despeito da boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público, uma vez que viola o princípio da proporcionalidade, colocando o militar em situação mais gravosa que a de outros agentes estatais, além de representar uma tentativa de impedir as manifestações de pensamento emanadas de grupos mais conservadores".
O governo também considerou que haveria dificuldade de caracterizar, no momento da ação, o que seria uma "manifestação pacífica" como estipulado pelo Congresso na conduta "atentado a direito de manifestação'. A justificativa do veto diz que essa imprecisão geraria "insegurança jurídica" para forças de segurança e poderia resultar em uma atuação "aquém do necessário".
Em relação aos partidos políticos poderem fazer denúncias, o veto é justificado sob o argumento de que a medida "levaria o debate da esfera política para a esfera jurídico-penal".
Veja na íntegra os trechos vetados pelo presidente:
"Art. 359- O Promover ou financiar, pessoalmente ou por interposta pessoa, mediante uso de expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada, campanha ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos capazes de comprometer o processo eleitoral: Pena: Reclusão de 1 (um) a 5 (cinco) anos e multa."
Art. 359-Q. Para os crimes previstos neste Capítulo [dos crimes contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral], admite-se ação privada subsidiária, de iniciativa de partido político com representação no Congresso Nacional, se o Ministério Público não atuar no prazo estabelecido em lei, oferecendo a denúncia ou ordenando o arquivamento do inquérito.
Art. 359-S. Impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. § 1º Se resulta lesão corporal grave: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. § 2º Se resulta morte: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.
Art. 359-U. Nos crimes definidos neste Título [dos crimes contra o estado democrático de Direito], a pena é aumentada: I - de 1/3 (um terço) se o crime é cometido com violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo; II - de 1/3 (um terço), cumulada com a perda do cargo ou da função pública, se o crime é cometido por funcionário público; III - de metade, cumulada com a perda do posto e da patente ou da graduação, se o crime é cometido por militar.
*Com informações da Estadão Conteúdo e Reuters.
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