Em derrota dupla de Bolsonaro, Pacheco e Rosa barram MP das fake news
Em derrota dupla para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e a ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Rosa Weber barraram hoje a MP (Medida Provisória) editada pelo chefe do Executivo federal que limita a retirada de conteúdos publicados nas redes sociais ao alterar o Marco Civil da Internet.
Pacheco decidiu devolver a MP ao governo enquanto Rosa decidiu pela suspensão do texto, atendendo a pedidos de ações no Supremo.
Segundo a MP assinada por Bolsonaro, as redes sociais não podem moderar por conta própria os conteúdos e excluir, suspender ou bloquear perfis ou postagens de acordo com as regras das empresas.
Para especialistas, a nova regra tem indícios de inconstitucionalidade e torna muito mais difícil combater as chamadas fake news (notícias falsas). Consequentemente, dificulta também o combate à desinformação.
Hoje, mais cedo, Bolsonaro afirmou que "fake news faz parte da vida" e defendeu não ser necessário que o governo crie uma forma de regular essa questão.
Pacheco considerou que MP traz "insegurança jurídica"
No plenário do Senado hoje à noite, Pacheco informou que já foi encaminhada ao presidente da República mensagem que "rejeita sumariamente e devolve a MP 1068 de 2021 que altera as leis [...] para dispor sobre o uso de redes sociais e declara o encerramento de sua tramitação no Congresso Nacional".
Pacheco disse ter considerado que a MP, ao ter eficácia imediata, permite prazo curto para adaptações e prevê imediata responsabilização pela inobservância de suas regras.
Em sua avaliação, isso "gera considerável insegurança jurídica aos agentes a ela sujeitos, conforme também salientam diversas manifestações da sociedade civil organizada, em especial parecer da OAB encaminhado a essa Casa".
Ainda, o presidente do Senado afirmou que o conteúdo normativo veiculado na Medida Provisória "disciplina, com detalhes, questões relativas ao exercício de direitos políticos, à liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, matérias absolutamente vedadas de regramento por meio do instrumento da Medida Provisória, conforme expressamente previsto pelo art. 62, § 1º, inciso I, alínea "a", da Constituição Federal".
Outros pontos citados por Pacheco foram que a MP traz disposições que "impactam diretamente no processo eleitoral [...] cuja disciplina por esta espécie normativa também encontra vedação [...] na Constituição Federal"; e já haver projeto de lei em tramitação no Congresso sobre o mesmo tema que busca instituir a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet.
Medida representa nova derrota de Bolsonaro
A medida representa uma derrota dura para o governo de Jair Bolsonaro. Isso porque a decisão de devolver uma MP raramente é tomada por ser considerada drástica no relacionamento do Legislativo com o Executivo. Em geral, quando o Congresso não concorda com uma Medida Provisória, os parlamentares deixam o texto perder a validade.
O presidente do Congresso Nacional tem a prerrogativa de devolver uma MP ao Executivo quando julgar que o texto não atende aos requisitos necessários previstos em lei.
Nos últimos dias, Pacheco disse que haveria uma "avaliação técnica, criteriosa", mas também já havia indicado a interlocutores e aliados que devolveria a MP.
Quando publicada, uma MP já tem força de lei, mas precisa ser aprovada, ainda que com mudanças, em até 120 dias pela Câmara e pelo Senado para que não perca a validade.
Além de ser uma derrota para o governo pela rejeição da análise do conteúdo da MP, a devolução significa mais uma derrota política de Bolsonaro pelo Senado e pelo próprio Pacheco.
Há pouco mais de duas semanas, o presidente do Senado havia arquivado por "falta de justa causa" o pedido de impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes, assinado por Bolsonaro e protocolado na Casa.
A rejeição por Pacheco em menos de uma semana após o pedido ser apresentado foi vista justamente como uma tentativa de esvaziar atos com pretensões golpistas e contra o próprio Moraes no Dia da Independência.
Embora tenha chegado ao comando do Senado com apoio do Palácio do Planalto, Pacheco tem reforçado falas e apoiado manifestos pró-democracia em plenário que o descolam de Bolsonaro nas últimas semanas.
Pacheco inicialmente resistiu à ideia de se criar a CPI da Covid no Senado e só aceitou a abertura da comissão após determinação do Supremo. No entanto, desde então, não tem dificultado as ações da oposição no colegiado —ele também foi alçado à presidência do Senado com o suporte do PT, por exemplo—, e deu aval à prorrogação dos trabalhos sem precisar ser tão pressionado.
Pacheco ainda afirma que nada pode fazer para agilizar no Senado a análise da indicação feita por Bolsonaro para que André Mendonça assuma a vaga em aberto no Supremo.
Por fim, o plenário do Senado derrubou uma Medida Provisória que tratava de minirreforma trabalhista, encampada pelos ministros Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência), com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Ministra do STF suspende MP
A ministra Rosa Weber, do STF, decidiu hoje pela suspensão da mesma Medida Provisória. A decisão atendeu a ações na Corte e aconteceu quase que ao mesmo tempo em que Pacheco anunciou a devolução do texto.
Dada a importância do tema, Rosa Weber também pediu ao presidente do STF, ministro Luiz Fux, que a liminar seja analisada pelo plenário da Corte, mas reforçou que a decisão não impediria uma eventual recusa do presidente do Congresso — Pacheco — à MP, o que acabou acontecendo.
"Ante o exposto, defiro o pedido de medida cautelar, ad referendum do plenário desta Corte — e para tanto estou a solicitar, nesta mesma data, ao presidente do STF [Luiz Fux], a inclusão destas ADIs em sessão virtual extraordinária —, para suspender, na íntegra, a eficácia da Medida Provisória 1.068/2021", escreveu Rosa no despacho.
Questionamentos ao texto
A MP foi publicada no último dia 6 —véspera dos atos bolsonaristas de 7 de setembro com cunho, em parte, anticonstitucional— e, desde então, sofria questionamentos de políticos, da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e de partidos políticos no STF.
Até a última sexta-feira (10), seis partidos haviam ajuizado ações diretas de inconstitucionalidade: PT (Partido dos Trabalhadores), Solidariedade, PSB (Partido Socialista Brasileiro), Novo, PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) e PDT (Partido Democrático Trabalhista). O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) tinha entrado com um mandado de segurança para suspender os efeitos da medida.
A PGR (Procuradoria-Geral da República) também emitiu parecer em que pediu ao STF a suspensão da MP.
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