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10 meses

Ministro cita terraplanistas e diz que absolver Bolsonaro seria dar pirueta

Do UOL, em Brasília, São Paulo e Rio

29/06/2023 11h23Atualizada em 29/06/2023 13h35

O ministro Floriano de Azevedo Marques Neto, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), votou pela condenação a inelegibilidade por intenções eleitoreiras do então presidente Jair Bolsonaro (PL) ao convocar uma reunião com embaixadores em 2022. Além de citar terraplanistas, ele diz que absolver Bolsonaro seria "dar uma pirueta", em crítica ao voto de Raul Araújo.

O que aconteceu

Ele absolveu o vice, Walter Braga Netto (PL).

Durante todo o seu voto, Floriano rebateu e criticou argumentos citados pelo ministro Raul Araújo.

O que de demais grave pode existir que acusar, buscando repercussão internacional, três ministros da mais alta Corte de serem asseclas de terroristas e criminosos? O que haveria de mais abusivo que amesquinhar a nação, apresentando-a como uma República bananeira ou fazer pior: fazer vingar outros objetivos inconfessáveis?
Raul Araújo, ministro do TSE

Ele também citou jurisprudência anterior de discurso de candidato disseminando desinformações sobre as urnas ser "causa caracterizadora de abuso de poder para encarregar à inelegibilidade".

A referência era o caso da cassação do ex-deputado estadual Fernando Francischini (PL-PR), que perdeu o mandato por disseminar mentiras sobre as urnas eletrônicas.

Floriano disse que ter um entendimento contrário no caso do ex-presidente seria "dar pirueta sem ter nenhuma demonstração que os precedentes não se aplicam".

Se um candidato a deputado estadual, que fala as mesmas inverdades que o presidente da República, é censurado e tornado inelegível, como essa Corte vai decidir que o mesmo teor do discurso já classificado como desinformação não é suficiente?
Floriano de Azevedo Marques Neto

Floriano também afirmou que não é porque Bolsonaro não teve êxito em desincentivar eleitores a votar que não se caracteriza a gravidade de suas declarações. "Nós estamos analisando o evento e as intenções do agente no evento. Se ele mal sucedeu nessa estratégia não é uma questão relevante", afirmou.

Uma pessoa pode ser terraplanista, fazer parte de clube da borda infinita, mas não pode pregar isso como professor em escola pública.

"A performance [na reunião] patenteou-se menos como chefe de Estado e mais como comportamento típico de campanha eleitoral", afirmou o ministro em seu voto no julgamento de Bolsonaro. Dessa forma, ele disse que o ex-presidente "quebrou a liturgia do cargo".

Floriano também argumentou que "a apresentação e o conteúdo" do encontro, onde o então presidente reciclou mentiras sobre o processo eleitoral, "confere abuso e desvio de finalidade", além de propaganda eleitoral irregular.

O magistrado criticou o uso do Palácio do Alvorada para abrigar a reunião e apontou que o encontro foi combinado às pressas, "não se tratou de evento inserido na agenda das relações institucionais externas brasileiras".

Não digo que não caiba ao presidente da República realizar reuniões de trabalho no Alvorada, porém é incompatível com o argumento que a reunião se tratou de mero ato regular ao fazer-se de improviso na residência oficial.
Ministro Floriano de Azevedo Marques Neto

Para Floriano, Bolsonaro adotou quatro linhas no discurso que reforçam o seu teor eleitoral, deixando de lado a sua função como presidente da República.

O ministro elencou que isso inclui: autopromoção de sua imagem como candidato, a tentativa de associar seus adversários a características negativas, uma tentativa de se tornar um "mártir" e um candidato antissistema e, por fim, e mais grave, a tentativa de desqualificar o sistema eleitoral brasileiro e assim desincentivar eleitores a participarem do pleito.

"Analisando linha a linha o discurso apresentado pelo primeiro investigado [Bolsonaro], me convenci que ele teve claro objetivo eleitoral. Não no sentido apenas de questionar o processo eleitoral sem provas ou evidências consistentes, mas angariar proveitos eleitorais em desfavor de seus concorrentes", afirmou.

Assim, Floriano seguiu o parecer do relator Benedito Gonçalves quanto à gravidade da reunião com os representantes internacionais e pontuou que o evento em si é suficiente para apontar a gravidade da conduta do então presidente.

Entretanto, para o ministro as lives realizadas por Bolsonaro anteriores ou posteriores às eleições de 2022, ou mesmo a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres, são "marginais" para o caso em análise agora no TSE.

Como está o julgamento

Na última terça-feira (27), o relator Benedito Gonçalves foi favorável à condenação de Bolsonaro, mas defendeu que o vice na chapa com o ex-presidente em 2022, Walter Braga Netto, não seja penalizado com a inelegibilidade.

Gonçalves afirmou que Bolsonaro "flertou perigosamente com o golpismo" e defendeu a inclusão da minuta golpista encontrada na casa de Anderson Torres por entender que os casos têm relação entre si.

Primeiro a votar na sessão de hoje (29), o ministro Raul Araújo discordou do relator e votou pela absolvição de Bolsonaro.

Araújo descartou o principal argumento do voto de Benedito, de que outras provas, como a minuta, demonstram um contexto de conduta ilícita. Para Raul, sem a minuta, a atitude não teria sido tão grave, embora tenha visto um teor eleitoral na reunião de Bolsonaro com embaixadores.

O ministro, porém, afirmou que nem tudo dito no evento era inverdade, citando que Bolsonaro exprimiu a opinião dele sobre as instituições e a proposta do chamado voto impresso. "[As falas são] censuráveis não por seu conteúdo, mas por configurar propaganda eleitoral antecipada", afirmou.

Terceiro a votar, Floriano de Azevedo Marques Neto seguiu o relator e apontou intenções eleitoreiras de Bolsonaro ao convocar a reunião. Rebatendo Raul, o ministro relembrou a cassação do ex-deputado Fernando Francischini para defender a inelegibilidade do ex-presidente e disse que ter um entendimento contrário agora seria dar uma "pirueta".

Floriano também afirmou que não é porque Bolsonaro não teve êxito em desincentivar eleitores a votar que não se caracteriza a gravidade de suas declarações. "Nós estamos analisando o evento e as intenções do agente no evento. Se ele mal sucedeu nessa estratégia não é uma questão relevante (...) Uma pessoa pode ser terraplanista, fazer parte de clube da borda infinita, mas não pode pregar isso como professor em escola pública."

No momento, o placar está com 3 votos favoráveis e 1 contrário pela condenação de Bolsonaro.

A sessão de hoje foi suspensa e será retomada amanhã a partir das 12h para a conclusão dos votos.

Entenda o trâmite do julgamento

A primeira fase, da leitura do relatório e do parecer, foi concluída na semana passada.

Segunda etapa: a leitura do voto de Benedito Gonçalves, que já foi concluída.

Depois de Benedito, já votaram: Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares. Amanhã votam Cármen Lúcia, Nunes Marques e, por último, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE.

Qualquer ministro pode pedir vista e suspender o julgamento. Se isso ocorrer, o caso deve ser devolvido em até 60 dias para retomada da discussão.

*Participam da cobertura

Do UOL, em Brasília: Leonardo Martins e Paulo Roberto Netto

Do UOL, em São Paulo: Caíque Alencar, Isabella Cavalcante, Stella Borges e Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, no Rio: Lola Ferreira

Colaborou Tiago Minervino, em São Paulo