Terra natal de Lira leva dois terços de verba de ministério contra enchente

A capital Maceió (AL), terra natal do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), ficou com dois terços da verba específica para a prevenção de enchentes do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional no ano passado.

O que aconteceu

A pasta comandada por Waldez Góes (PDT) reservou R$ 52,7 milhões para a Prefeitura de Maceió para um projeto de contenção de encostas em 2023. O valor foi destinado ao município em outubro, mas nenhuma obra foi iniciada até agora com essa verba.

Os recursos correspondem a 67% dos R$ 78,4 milhões empenhados no ano passado pelo ministério para a ação "apoio à realização de estudos, projetos e obras dos entes federados para contenção ou amortecimento de cheias e inundações e para contenção de erosões marinhas e fluviais".

Sem mortes em decorrência das chuvas no ano passado, Maceió foi beneficiada com a maior parte das verbas, enquanto nenhuma cidade do Rio Grande do Sul foi contemplada por essa ação do ministério. O estado gaúcho —que registrou nos últimos dias ao menos 95 mortes— já havia somado 54 óbitos em 2023 por causa de um ciclone extratropical.

O UOL localizou essa ação específica do ministério voltada à prevenção de enchentes a partir de 2022, último ano da gestão de Jair Bolsonaro (PL). Na ocasião, a rubrica dispunha de R$ 21,4 milhões. Nada, porém, foi gasto até hoje.

No primeiro ano da gestão Lula (PT), os recursos passaram para R$ 78,4 milhões —desse total, apenas R$ 3 milhões foram pagos. Neste ano, serão R$ 219 milhões, segundo o Portal da Transparência, mas nada foi repassado até agora.

Questionada sobre os critérios para a divisão dos recursos, a assessoria de imprensa do ministério afirmou, em nota, que as verbas foram empenhadas após a apresentação de propostas pelos municípios seguidas "pelo seu enquadramento técnico".

Lira foi o quinto candidato a deputado federal mais votado em Maceió em 2020, com 15.662 votos, mas se articula para influenciar a eleição para o comando de sua terra natal neste ano. A assessoria de Lira foi procurada pessoalmente, por telefone e email, mas não retornou. Os esclarecimentos serão incluídos, caso sejam enviados.

Sem detalhes sobre gastos

No site do governo federal que detalha a aplicação de recursos de parcerias com os municípios, não há detalhamento sobre o que será feito com o dinheiro destinado para a Prefeitura de Maceió.

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O site exibe apenas uma tabela com 11 localidades que seriam beneficiadas. Entre elas, está a Grota do Pau D´Arco, no bairro Jacintinho, que foi atendida no fim do ano passado.

"Moradores de mais um bairro de Maceió agora podem viver com mais tranquilidade após a finalização de uma nova obra de proteção de encostas finalizada", afirmou em novembro a Secretaria Municipal de Comunicação. Para essa obra, não houve gastos com verba do ministério.

A assessoria de imprensa da prefeitura enviou nota afirmando que os recursos do ministério ainda não estão disponíveis. "O convênio prevê que o município entregue os projetos até outubro de 2024. Ato contínuo serão realizadas a licitação, contratação, execução e posterior desembolso dos recursos conforme as medições".

"Paralelamente o município está investindo R$ 150 milhões em obras de contenções. Elas são realizadas em dezenas de áreas de risco e têm contribuído para a queda substancial no número de deslizamentos", completou.

No ano passado, Alagoas sofreu com as chuvas em julho, mas a capital não foi a mais atingida.

O município mais afetado foi Matriz da Camaragibe, seguido por Marechal Deodoro, São Miguel dos Milagres, União dos Palmares e Rio Largo. Nenhuma dessas cidades foi contemplada pela ação de prevenção do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional no ano passado.

Em 2023, a pasta também empenhou recursos para Icapuí (CE), de 20 mil habitantes (R$ 7,5 milhões), seguido de Tibau do Sul (RN), de 16 mil habitantes (R$ 5,6 milhões). Nada relativo a esses empenhos foi gasto até agora.

O estado de Santa Catarina, que vem sendo castigado pelas chuvas nos últimos anos, ficou com apenas R$ 3 milhões. Ainda assim, os recursos foram destinados por força de uma decisão judicial que obrigou a realização de obras numa comunidade indígena.

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Quatro ações de prevenção contra chuvas do ministério não tiveram empenhos em 2023. Mesmo assim, receberam R$ 40,8 milhões. O motivo é que o governo se valeu dos chamados "restos a pagar" de anos anteriores, ou seja, recursos que estavam reservados mas pendentes de serem aplicados.

Elas são: apoio a sistemas de drenagem urbana em municípios sujeitos a inundações; estudos, projetos e obras para contenção de erosões; obras preventivas de desastres e obras de contenção de encostas.

Pragmatismo marca relação de Lira com prefeito de Maceió

A relação de JHC, João Henrique Caldas (PL), prefeito de Maceió, com Arthur Lira é pragmática. Atualmente, eles estão juntos para rivalizar o poder com o MDB do presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Victor, e da família de Renan Calheiros.

O presidente da Câmara dos Deputados apoiou JHC em 2020 apenas no segundo turno. Depois, emplacou a prima Jó Pereira (PSDB) como secretária de Educação da capital.

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O pai de JHC, o ex-deputado João Caldas, é quem fez a ponte entre o prefeito e Lira. Em 2011, uma mensagem de JHC em rede social registra um encontro entre Caldas e o pai de Lira, o ex-senador Benedito de Lira (PP), o Biu.

Atualmente a reeleição tranquila que se avizinha para JHC vive um impasse: a escolha da vice-candidatura. Se depender do prefeito e de Caldas, ele será o senador Rodrigo Cunha (União Brasil-AL). Com isso, a mãe do prefeito, suplente do senador, ganha um mandato no Senado.

No entanto, Arthur Lira é contra esse movimento. Ele quer emplacar a prima Jó ou o ex-vereador Davi Davino (PP).

JHC não precisa tanto assim do apoio do presidente da Câmara para se reeleger. Mas não é inteligente brigar com ele agora e perder um apoio valioso em 2026. Isso travaria o apoio de Lira a uma eventual candidatura de JHC ao governo do estado. Com uma possível saída de JHC para concorrer, o vice assumiria.

*Colaborou Carlos Madeiro, colunista do UOL em Maceió (AL)

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