CFM dirá que 'feto sofre' ao recorrer de liminar de Moraes sobre aborto

O CFM (Conselho Federal de Medicina) vai recorrer ainda esta semana de uma decisão do STF que suspendeu uma resolução da entidade que impedia a realização de uma técnica preparatória do aborto em gestações com mais de 22 semanas, mesmo em caso de estupro — como prevê a lei.

O que aconteceu

Um dos argumentos do CFM é que a chamada assistolia fetal traz sofrimento ao feto. "Não é um procedimento simples e isento de sofrimento", argumenta o conselho em nota. "É injetada no coração do feto uma solução de cloreto de potássio e de lidocaína. Num ser já formado, essa substância agirá causando a sua morte."

O conselho dirá que, com 22 semanas, o feto pode sobreviver fora do útero. "Toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida desde o momento da concepção, não podendo ser privada da vida arbitrariamente", diz o CFM.

A autarquia defende que a resolução só muda a vida para mulheres com gestação superior a 22 semanas. Nesse caso, o bebê seria encaminhado para adoção após o parto.

O conselho também dirá que sua resolução foi amparada em estudos científicos. Eles defenderão que o documento é amparado pela Constituição, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela a Convenção Americana de Direitos Humanos.

A assistolia fetal é indicada pela OMS (Organização Mundial da Saúde). A entidade recomenda a técnica porque ela evita que o feto seja retirado do útero ainda com sinais vitais. A avaliação é que também previne desgaste emocional das pacientes e das equipes médicas.

"As mulheres sofrem"

Ainda falta consenso sobre o momento em que a vida começa, diz especialista. "Mas a gente só se preocupa com o feto e se esquece das meninas e mulheres que foram violentadas", diz Daniela Pedroso, psicóloga que há 27 anos atende mulheres vítimas de violência sexual.

Falta esclarecimento às mulheres. "Com educação sexual, ninguém precisaria chegar às 22 semanas de gestação", diz Pedroso. "A gente falha em mostrar a elas que é possível buscar ajuda imediata após violência. A gente também precisa de campanhas que ajudem a detecção precoce dessas gestações."

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Negar o aborto previsto em lei também é violento. "É um ato de tortura, um sofrimento psicológico", diz a especialista.

Elas chegam extremamente abaladas, com um sentimento de que interromper a gestação é a melhor dentre as piores opções. São pessoas com sentimentos difusos, como medo, vergonha e culpa.
Daniela Pedroso, psicóloga

Por que elas demoram pra chegar ao hospital? Imagina contar para a mãe que foi estuprada. Muitas vezes o crime acontece dentro de casa.
Daniela Pedroso, psicóloga

Moraes derrubou resolução

O ministro Alexandre de Moraes, durante sessão plenária do STF
O ministro Alexandre de Moraes, durante sessão plenária do STF Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

O CFM tem até o dia 31 para recorrer. Aprovado em abril pela autarquia, o documento que proíbe a assistolia fetal foi derrubado em 17 de maio por uma liminar do ministro Alexandre de Moraes.

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Os argumentos do CFM serão avaliados a partir da sexta-feira. É quando a decisão de Moraes começa a ser analisada pelos outros ministros do STF em sessão virtual. O TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região já havia se manifestado favorável à norma do CFM.

Moraes derrubou a resolução após a suspensão de duas médicas em São Paulo. As profissionais do Hospital Vila Nova Cachoeirinha foram punidas pelo Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) por realizarem o método vetado pelo conselho federal.

Com a decisão, o ministro suspendeu a instauração de novos procedimentos administrativos como base na resolução do CFM.

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