PF: Abin paralela abastecia 'grupo dos malucos' com fake news contra STF
Investigadores da Polícia Federal afirmam que a disseminação de informações falsas envolvendo ministros do STF e seus familiares era realizada de forma intencional pelo policial federal Marcelo Bormevet em um grupo chamado "grupo dos malucos".
O que aconteceu
A existência do grupo evidencia a "plena ciência dos interlocutores da desarrazoada desinformação produzida", segundo relatório da PF. O trecho se refere ao grupo utilizado para difundir informações falsas ligadas a ministros do STF e seus familiares. A informação consta em um relatório do órgão sobre a operação para apurar desvios na Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e a atuação do "gabinete do ódio" sob o governo Bolsonaro.
A PF indica trecho de diálogos interceptados entre o policial federal Marcelo Araújo Bormevet e o militar Giancarlo Gomes Rodrigues. Segundo o documento, as conversas indicam "ações clandestinas" contra o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, que tinham como objetivo "desacreditar o processo eleitoral".
Servidores em exercício da Abin controlavam perfis e grupos para disseminar "desinformação para atacar adversários e instituições". O documento da Polícia Federal, porém, não detalhou em quais plataformas esses grupos funcionavam.
Ministros no alvo de informações falsas
Barroso foi alvo do grupo que tentava criar "informações inverídicas" a seu respeito, de acordo com o órgão. "As ações clandestinas direcionadas para desacreditar o processo eleitoral, nesta trilha, destacam a conexão das investigações em curso perfazendo a estrutura paralela que se apropriou da Abin como um das engrenagens de organização criminosa de maior amplitude", diz o documento.
O questionamento da urna eletrônica era reiterado, apontam as investigações. De acordo com o documento da PF, colocar o funcionamento das urnas em xeque era "mantra reiterado" nas "ações de desinteligência".
Bormevet determinou, segundo a PF, que o subordinado Giancarlo "mandasse bala" para "sentar o pau" no assessor do ministro Barroso. A partir de uma publicação no X, antigo Twitter, sobre urnas eletrônicas e de declarações de um perfil denominado "Kim Paim", o relatório da PF diz que Bormevet determinou a Giancarlo que atacasse o assessor do ministro. Os ataques, segundo a PF, seriam também pelo fato de o ministro também estar à frente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), à época.
A PF disse ainda que as ações de "desinteligência" envolvem a "construção de relações inexistentes". Com o objetivo de "atacar instituições e opositores", a PF mostra diálogos em que os servidores Giancarlo e Bormevet combinam a criação de um conteúdo falso que envolveria a mulher de Barroso com a empresa responsável por prestar serviços ao TSE. A PF classificou a conversa como "associações esdrúxulas, sem qualquer fundamento lógico".
Mensagens rastreadas e descritas no documento fazem menção a um suposto sobrinho de Barroso. No diálogo, Bormevet sugere um conteúdo sobre como o ministro Luiz Fux e um suposto escritório da família de Barroso teriam se unido para blindar um banco que estaria envolvido em um calote milionário. Depois, Giancarlo diz "vou ler primeiro e jogo lá", referindo-se ao "grupo dos malucos".
"Preciso que você ache o vínculo do sobrinho/Barroso", diz uma das mensagens trocadas em meio ao conteúdo referente ao banco. Em um dos prints ele afirma: "Não sei se o sobrinho é o sobrinho do Barroso mesmo". Em outro momento, Bormevet escreve para Giancarlo Rodrigues: "Várias reportagens afirmam que ele é sobrinho sim do Barroso, não tem como jogar nos sistemas porque daria muita bandeira e estou sem aquele sistema alternativo". Bormevet diz ainda: "Senta o dedo para a galera".
Em outro momento, os diálogos entre Bormevet e Giancarlo citam o ministro Fux. O subordinado do policial federal diz que mandaria uma "thread" no dia seguinte com informações falsas. "Esse fio tem que ser puxado. Se eles publicam, abre o caminho para gente trabalhar", diz Bormevet nos diálogos apresentados em relatório da PF.
Produção de 'desinformação'
O órgão aponta que os investigados tinham ciência de suas ações, em especial, a produção de desinformação "sem qualquer lastro com a realidade". Isso ocorria, de acordo com os investigadores, tanto por meio da difusão de desinformação com apoio de "vetores de propagação cooptados" quanto por meio de grupos de redes sociais.
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Quero receberObjetivo da desinformação era "o de atingir o máximo de pessoas possíveis". De acordo com o documento da PF, o objetivo era "fazer um thread". O documento da PF afirma que a difusão de desinformação era realizada por "vetores cooptados como o sr. Richard Pozzer" (divulgava notícias falsas em suas redes sociais. Veja abaixo)
Familiares dos ministros também foram alvos das ações, indica a PF. Segundo o documento, os atos não se restringiam exclusivamente aos ministros, mas também "contra familiares dos membros da mais alta corte de Justiça". As ações direcionadas aos ministros da Suprema Corte em razão do exercício de suas funções além de atos de embaraçamento de investigações, também perfazem atos que atentam contra o livre exercício do Poder Judiciário.
Polícia Federal, em relatório
PF mira ex-integrantes da Abin
A PF prendeu quatro pessoas na manhã desta quinta-feira (11). Eles são suspeitos de integrar a Abin paralela sob o governo Bolsonaro. É a quarta fase da Operação Última Milha. O inquérito revelou que eles atuavam no "gabinete do ódio". O grupo disseminava notícias falsas e incitava ataques contra autoridades e jornalistas.
A pedido da PF, o ministro Alexandre de Moraes autorizou buscas em relação a sete investigados:
- Mateus de Carvalho Sposito: assessor no Ministério das Comunicações no governo Bolsonaro e é suspeito de também atuar para o "gabinete do ódio".
- José Matheus Sales Gomes: ex-assessor do Palácio do Planalto, apontado como um dos principais integrantes do "gabinete do ódio", foi alvo de busca e apreensão.
- Daniel Ribeiro Lemos: assessor legislativo, Daniel Ribeiro Lemos, que trabalha para um deputado do PL. Ele é suspeito de auxiliar na estrutura do "gabinete do ódio".
- Richards Dyer Pozzer: divulgava notícias falsas em suas redes sociais e chegou a publicar ataques contra senadores da CPI da Covid.
- Rogério Beraldo de Almeida: influenciador que também divulgava notícias falsas em suas redes sociais repassadas pelos agentes da Abin.
- Marcelo Araújo Bormevet: levado para a Abin por Ramagem para comandar um órgão de inteligência.
- Giancarlo Gomes Rodrigues: militar do Exército que trabalhava na Abin subordinado a Bormevet.
Retirada de sigilo
Moraes disse não ver mais necessidade de manter o caso em sigilo. "No caso dos autos, embora a necessidade de cumprimento das numerosas diligências determinadas exigisse, a princípio, a imposição de sigilo à totalidade dos autos, é certo que, diante da realização das diligências pela Polícia Federal, não há necessidade de manutenção da total restrição de publicidade", afirmou o ministro.
A PF diz que políticos e jornalistas foram espionados pela estrutura paralela da Abin. Entre eles, estaria o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Também estão na lista Rodrigo Maia (então presidente da Câmara dos Deputados), os deputados federais Kim Kataguiri e Joice Hasselmann, e os senadores Alessandro Vieira, Omar Aziz, Renan Calheiros e Randolfe Rodrigues. As jornalistas Mônica Bergamo e Vera Magalhães também aparecem na lista.
Os elementos condensados na representação policial revelaram que a estrutura infiltrada na Abin representava apenas uma célula de uma organização criminosa mais ampla, voltada ao ataque de opositores, de instituições e de sistemas republicanos, com atuação que não se restringia às investigações relacionadas à referida Agência Brasileira de Inteligência.
Alexandre de Moraes, ministro do STF
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