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SUS usa meditação para tratar estresse e ansiedade; aprenda técnicas

A enfermeira Camila Serra, 33, e o marido, Fernando Tadeu Serra, 31, educador físico, aprenderam a meditar em grupo especializado da Unifesp - Arquivo pessoal
A enfermeira Camila Serra, 33, e o marido, Fernando Tadeu Serra, 31, educador físico, aprenderam a meditar em grupo especializado da Unifesp Imagem: Arquivo pessoal

Camila Neumam

Do UOL, em Porto Alegre*

17/05/2015 06h00

Anos de bullying na infância e na adolescência tornaram a enfermeira paulista Camila Serra, 33, uma adulta ansiosa e com medo da reação alheia.

Ela se sentia incapaz de ser querida e chorava toda vez que se lembrava das zombarias que sofria na escola, em Santos (SP), por ter dislalia (conhecida como a "síndrome do Cebolinha"). O medo foi lhe consumindo ao longo do tempo, sendo transformado em fobia por aranhas, depressão e síndrome do pânico.

O antídoto para o seu medo constante veio com um tipo específico de meditação, aprendido no núcleo “Mente Aberta”, da Universidade Federal de São Paulo, pelo Sistema Único de Saúde. O curso de oito semanas é gratuito e voltado para pessoas de todas as idades com alto grau de estresse, ansiedade, depressão e dores crônicas.

Conhecida como "mindfulness" (traduzido como "atenção plena" em português), a técnica de meditação consiste em criar um estado psicológico no qual se permanece atento aos próprios pensamentos, sensações físicas e emoções no momento em que elas ocorrem. Aprende-se a parar de remoer o passado ou só pensar no futuro – que aumenta a ansiedade –, se concentrando no presente.

“Com a técnica eu aprendi que não sou obrigada a sentir aquilo de novo. A gente aprende a não deixar a nossa mente nos levar a situações complicadas, a perceber os nossos pensamentos e a nos questionar se queremos ficar sentindo aquilo”, disse Serra.

No curso da Unifesp, a enfermeira aprendeu que pode meditar até quando está tomando banho ou comendo. A técnica faz com que suas atividades diárias tenham foco e se tornem mais eficientes. “Quando a mente foge durante o banho, retomo o pensamento para o que estou fazendo e termino mais rápido. Quando como, eu olho para o alimento, sinto o gosto, a textura e o movimento da língua e percebo se estou comendo por comer ou porque gosto. Eu até parei de comer bacon porque senti muita gordura na boca. Você percebe que pode comer menos, o que facilita a digestão”, afirmou.

A meditação "mindfulness" vem do zen-budismo, mas ganhou espaço na medicina na década de 1970, nos Estados Unidos, pelo professor de medicina Jon Kabat-Zinn, da Escola Médica da Universidade de Massachusetts. Ao conhecer os benefícios da meditação budista, ele testou a técnica em seus pacientes que sofriam de estresse e dores crônicas. As respostas foram tão positivas que ele fundou uma clínica dentro da universidade. O conceito também se tornou popular na rede de saúde do Reino Unido.

SUS torna meditação laica

No Brasil, o conceito foi trazido pelo físico e budista irlandês Stephen Little na década passada, mas ainda é usado timidamente. Na Unifesp vem sendo aplicado desde 2011 em grupos de 30 pacientes ao mês. A maioria sofre de ansiedade, estresse, dor crônica e depressão.

“Já é possível verificar melhoras a partir da segunda sessão, mas elas ocorrem mais intensamente a partir da quarta ou quinta sessão”, afirma Marcelo Dermazo, coordenador do núcleo Mente Aberta.

O curso é composto de oito sessões, uma sessão por semana com duração de duas horas. Nelas são ensinadas técnicas de atenção na respiração, consciência corporal, caminhadas e movimentos do dia a dia, como lavar louça e preparar alimentos, focados no que está se fazendo.

Para a psicóloga Daniela Sopeski, que estudou a técnica da Inglaterra e hoje faz parte do grupo da Unifesp, o "mindfulness" é “um convite para acordar do modo automático de se comportar”.

“O 'mindfulness' é basicamente um treinamento mental cultivado por meio de uma atenção intencional a cada instante, rompendo preconceitos e julgamentos. É um incremento de bem-estar, de redução de estresse, dos sintomas depressivos. Mas é uma prática complementar que não substitui tratamentos nem deve ser feita por quem estiver em crise”, afirma.

Sopeski trouxe o conceito para a rede pública de Porto Alegre (RS) onde viu a técnica ser bem recebida pelos pacientes, embora tivesse que passar por algumas adaptações. “Apesar de vir do budismo, o 'mindfulness' chega à saúde com uma roupagem laica para se tornar mais inclusivo. No SUS há uma diversidade de religiões, por isso algumas pessoas usam outros termos que não seja meditação, mas técnicas de aliviar a tensão, de acalmar a mente ou atenção plena”, explica.

*A jornalista foi convidada do Congresso do Cérebro, Comportamento e Emoções