Bolsonaro suspende monitoramento de deslocamentos; SP quer ampliar sistema
Resumo da notícia
- O governo federal começaria a monitorar os deslocamentos das pessoas a partir de amanhã, mas desistiu
- Houve intervenção de Jair Bolsonaro, e o Ministério da Ciência e Tecnologia alegou necessidade de avaliar se há invasão de privacidade
- O recuo pode ter motivação política, pois aliados de Bolsonaro afirmam que o monitoramento é inconstitucional
- Já governo de SP ampliará o serviço a municípios menores. Hoje, apenas cidades com mais de 200 mil habitantes são acompanhadas
- O governo de São Paulo afirma que não tem acesso a nenhum dado pessoal
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) mais uma vez adotam caminhos diferentes na condução da crise da covid-19. Ontem, o Planalto desistiu de usar o sistema que monitora o percentual de pessoas que está aderindo ao isolamento social, algo que vinha sendo negociado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia com as operadoras de telefonia desde o começo do mês.
Na contramão dessa postura, o estado de São Paulo começou a usar o serviço a partir da quinta-feira da semana passada e agora há um esforço para ampliar sua utilização. Hoje, as 47 cidades paulistas com 200 mil moradores ou mais têm os deslocamentos da população acompanhados. A intenção é, ainda nesta semana, passar a monitorar municípios menores, com 30 mil habitantes ou mais.
O isolamento social é o principal pilar da política do governo paulista para segurar a expansão do novo coronavírus. As autoridades de saúde indicam que, se 70% das pessoas respeitarem a quarentena, os hospitais não vão entrar em colapso. A estratégia é complementada com a criação de leitos de enfermaria e UTI, incluindo três hospitais de campanha.
Desistência do governo federal em cima da hora
O plano inicial do governo federal era começar a usar a ferramenta de monitoramento amanhã utilizando um sistema que recebe mapas de calor indicando a adesão ao isolamento social. A estatística fornecida às autoridades de saúde sempre é do dia anterior. O acordo com cinco operadores de telefonia — Oi, Vivo, Claro, Tim e Algar — estava pronto, mas o presidente Jair Bolsonaro desautorizou o projeto.
Segundo o jornal O Globo, no último sábado (11) Bolsonaro ligou para o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, e determinou a suspensão do serviço. A justificativa para o adiamento foi verificar se o sistema não desrespeita o sigilo dos dados das pessoas
A explicação, porém, é questionável. No domingo anterior (5), o próprio site da Agência Brasil, de propriedade do poder Executivo, publicou que o país contaria com o monitoramento e ressaltou que as regras da Lei Geral de Proteção de Dados e do Marco Civil da Internet seriam respeitadas.
Mas a desistência do governo federal em cima da hora não foi o primeiro recuo envolvendo o monitoramento do isolamento social. Ainda em 27 de março, o ministro da Ciência e Tecnologia havia gravado um vídeo comemorando que o governo federal iria adotar esse tipo de serviço. Entretanto, ele apagou a gravação de suas redes sociais no mesmo dia, logo depois de o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, escrever no Twitter uma mensagem criticando esse tipo de monitoramento realizado por Doria, principal contraponto a seu pai na crise da covid-19.
Na sequência, parlamentares aliados de Bolsonaro e perfis de direita passaram a espalhar posts nas redes sociais, afirmando que o monitoramento era invasão de privacidade e desrespeitava o direito constitucional de ir e vir. Até a hashtag "DitaDoria" foi usada nas postagens.
São Paulo diz não ter acesso a dados de pessoas
Ciente das dúvidas lançadas em relação ao monitoramento, Doria tratou do assunto logo no discurso de abertura da entrevista coletiva que concedeu ontem. "Nunca o governo de São Paulo, nunca o governador de São Paulo desejou limitar, ou impedir, ou restringir o direito de ir e vir. Mas também não desejamos e não faremos nenhum estímulo para que as pessoas possam se aglutinar."
Na avaliação interna do governo estadual, o Planalto abortou o monitoramento por questões políticas. A leitura é que o clã Bolsonaro passou a criticar a iniciativa para atacar Doria e precisou desistir de um sistema confiável e efetivo de acompanhar deslocamentos porque politizou a situação.
Além disso, o governo de São Paulo refuta qualquer sugestão de que o sistema é invasivo ou desrespeita a privacidade. Inclusive permite acesso da imprensa à sala de monitoramento. Ela fica no gabinete de crise, que funciona numa ampla sala no segundo andar do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista.
O local tem 10 mesas redondas espalhadas numa área semelhante ao espaço de duas salas de aula de escola pública. Há também um balcão de café e grandes monitores. Maiores ainda são dois quadros que retratam momentos históricos da história de São Paulo.
No canto oposto às obras de arte, cientistas de dados, profissionais do Instituto de Pesquisas Tecnológicas e consultores de duas empresas acompanham os telões com as informações fornecidas pelas operadoras de telefonia. O porta-voz do grupo explica que as empresas operadoras de telefonia, responsáveis por informar se o isolamento está sendo respeitado, fornecem somente o dado bruto de percentual de pessoas cumprindo a quarentena.
Acrescenta que não é possível saber detalhes, como nome, idade, gênero e nem sequer se o telefone pertence a pessoa física ou jurídica. O máximo de detalhe revelado é o cumprimento do isolamento social por bairro — dado que não é divulgado por falta de autorização das operadoras de telefonia. Esse é o discurso oficial.
O governo de São Paulo explica ainda que o monitoramento é feito com base na localização do celular entre as 22 horas e 2 horas da manhã. O sistema usa as antenas de transmissão de sinal para triangular a posição do aparelho nesse intervalo e interpreta como o lugar em que a pessoa dormiu. Qualquer deslocamento em um raio superior a 200 metros no período seguinte é considerado um desrespeito à quarentena.
O contrato prevê manter o serviço por até três meses, mas caso a crise da covid-19 dure mais que esse período haverá negociação para ampliar o prazo.
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