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Rio: Sobram vagas para profissionais de saúde em hospitais de campanha

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Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

30/04/2020 16h03

No Rio de Janeiro, uma conta ainda não fecha: há previsão de novos leitos de hospitais de campanha, mas não há profissionais de saúde suficientes para trabalhar. Das cinco mil vagas oferecidas pela prefeitura para médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas atuarem nas novas unidades, somente 1.240 foram preenchidas - ou seja, 25% das vagas. Uma ausência de 3.700 profissionais.

A categoria mais ausente é a dos médicos. Segundo informações da Rio Saúde, empresa pública responsável pela contratação, para alguns cargos, o número de inscritos é suficiente, mas a ausência de médicos impede a contratação dos demais profissionais. "Sem eles, não é possível completar as equipes", explicou a empresa.

De acordo com relatos colhidos pelo UOL, receio de calote, falta de estrutura, salários abaixo do piso, são alguns dos motivos que justificam a baixa procura pelas vagas.

"Muita gente tem medo de estrutura de trabalho absolutamente precária e de calote [que a prefeitura não arque com os salários]. O profissional fica muito exposto e o médico especificamente é muito facilmente responsabilizado, independente de ter ou não estrutura", opinou um médico que não terá o nome revelado.

O presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Alexandre Telles, confirmou que a categoria desconfia da gestão da Rio Saúde e outras Organizações Sociais que administram unidades de saúde.

"Falta credibilidade. Desde 2017 há atraso de salários. Recentemente, só conseguimos pagamento de salários e outros benefícios entrando na Justiça. Foram mais de R$ 300 milhões para regularizar. Essa situação é real. Precisamos também de uma liminar para garantir o oferecimento de EPIs (equipamentos de proteção individual). Eles [os hospitais] não estavam fornecendo de forma adequada, obedecendo as recomendações da Anvisa. Existe escassez desse tipo de material. Através de vistorias, percebemos que tinha lugar mandando os profissionais guardarem por mais de 30 dias as máscaras e outro equipamentos".

Uma técnica de enfermagem ouvida pela reportagem, que já trabalha em um hospital do município, alegou que o salário oferecido para trabalhar nos hospitais de campanha, está abaixo do piso.

"Eles estão oferecendo salário de R$ 1.200 para os técnicos, além do adicional de 40% de insalubridade - o dá R$ 1.680 bruto para contrato de 30h semanais. No entanto, o piso da categoria é de R$ 1.600, fora o adicional. Ou seja, o mínimo que teriam que oferecer é R$ 2.240 para os técnicos. É um risco muito alto. O salário não compensa a pressão, o estresse e o risco de contágio".
Nas redes sociais, inúmeros técnicos de enfermagem comentam sobre a recusa das vagas.

"Eu fui chamada para um contrato de três meses e recusei. Não vou me arriscar por tão pouco", disse outra profissional da área nas redes sociais.

Outra questão levantada pelos técnicos é que a RioSaúde não está em dia com o INSS, o que faz com que os trabalhadores fiquem sem garantia de auxílio doença em caso de afastamento. A RioSaúde confirmou o problema ao UOL.

"Todos foram descontados e têm o pedido de auxílio doença indeferido pelo INSS. Não vale aumentar as chances de se infectar, precisar ser afastado e depois ter não dinheiro para pagar as contas e comer", disse outro profissional.

Fisioterapeutas também alegam que os salários são incompatíveis com o mercado.

"O piso já é uma porcaria, fora que querem organizar uma escala como a da enfermagem: 12/36h. Trabalha 12h, descansa 36h. Só que nós fisioterapeutas temos carga horária máxima de 30h/ semana com horários fixos. Então não dá. Você prefere aumentar sua carga horária na instituição que já trabalha ou ir para uma dessas da prefeitura sem garantias?", questionou uma fisioterapeuta.

Hospitais de campanha

Desde o começo da pandemia de coronavírus, o governo municipal anunciou dois hospitais de campanha para ampliar a oferta de leitos no Rio devido ao aumento de internações. Um deles é o hospital Ronaldo Gazolla, na zona norte da cidade, que foi transformado em uma unidade exclusiva para casos de covid-19, referência na cidade. O segundo é o hospital de campanha do Rio Centro, na zona oeste, que começa a funcionar amanhã com a abertura de 100 novos leitos.

Além disso, a prefeitura faz também contratações para o Hospital Federal de Bonsucesso, na zona norte, e o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, na Ilha do Fundão, que também terão leitos dedicados ao enfrentamento do coronavírus. Devido a baixa procura para integrar as equipes das unidades, a prefeitura informou que "para os médicos as inscrições foram prorrogadas até que todos os postos de trabalho sejam preenchidos."

De acordo com a prefeitura, foram contratados até o momento 303 médicos, de um total de 1.201 vagas; 158 enfermeiros de um total de 957 postos e 506 técnicos de enfermagem, de um total de 2.278. Em nenhum dos casos, o número de profissionais chega a 50% das vagas oferecidas. No entanto, a prefeitura garante que há inscritos suficientes com exceção dos médicos. "Os profissionais estão sendo chamados progressivamente para apresentação da documentação e efetivação das contratações, conforme cronograma de abertura de leitos", informou a Rio Saúde através de nota.

Sobre as críticas dos profissionais aos salários oferecidos, a Rio Saúde ainda não se manifestou.