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Saúde centraliza e cidades não conseguem comprar insumos, dizem prefeitos

Eduardo Macário, secretário substituto de Vigilância em Saúde, e Élcio Franco, secretário-executivo adjunto do Ministério da Saúde - Júlio Nascimento//PR
Eduardo Macário, secretário substituto de Vigilância em Saúde, e Élcio Franco, secretário-executivo adjunto do Ministério da Saúde Imagem: Júlio Nascimento//PR

Carolina Marins e Gabriela Sá Pessoa

Do UOL, em São Paulo

20/05/2020 04h00

A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) rebateu a declaração do secretário-executivo adjunto do Ministério da Saúde, Élcio Franco, de que estados e municípios são os responsáveis pela compra de respiradores e demais insumos necessários ao enfrentamento do novo coronavírus.

Gilberto Perre, secretário-executivo da FNP, disse que a pasta do governo federal centralizou todas a compras de equipamentos e, por isso, estranhou a fala do dirigente da Saúde.

"O governo tem centralizado as compras de respiradores. Uma série de episódios aconteceu por todo o país em que vários municípios tentaram fazer a aquisição e tiveram muitas dificuldades", afirmou Perre ao UOL.

Em entrevista coletiva a jornalistas anteontem, Franco disse que a aquisição de respiradores não era responsabilidade do Ministério da Saúde e que a pasta atuava "apenas reforçando" as ações de governadores e prefeitos.

"É uma demanda extra ao ministério, que não tinha a expertise para aquisição de respiradores e EPIs (equipamentos de proteção individual), uma vez que era uma tarefa atribuída a estados e municípios. Estamos apenas reforçando, ajudando, os estados e municípios no enfrentamento à covid", relatou o executivo do Ministério da Saúde.

"Pela estrutura tripartite, caberia aos estados e municípios equipar os seus hospitais", acrescentou.

FNP cita ofício enviado pelo ministério

Para contestar a fala do governo federal, a Frente Nacional de Prefeitos cita um ofício enviado pelo ministério em 19 de março à empresa Leistung Equipamentos LTDA. No documento, o governo federal pede informações sobre a disponibilidade de respiradores pulmonares e requisita todo o estoque da empresa, tanto o que já estava disponível para entrega como o que seria produzido até setembro.

"No Brasil nós estamos vendo essa distopia federativa, onde o governo federal ora busca centralizar, ora cobra a descentralização. É preciso ter harmonia na tomada de decisão e diálogo permanente para que isso não aconteça. No fim, quem sofre com isso é o cidadão lá na ponta", diz Perre.

Segundo o dirigente da FNP, os prefeitos procuraram alternativas, como buscar respiradores no exterior ou consertar equipamentos quebrados.

Embates com estados e municípios

No fim de março, ainda sob a administração de Luiz Henrique Mandetta, o Ministério da Saúde proibiu a exportação de ventiladores pulmonares e também requisitou toda a produção nacional dos equipamentos. A atitude gerou reações e conflitos com os estados e municípios.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ameaçou entrar na Justiça para garantir o fornecimento dos equipamentos, caso a medida fosse necessária. Anteontem, Doria reclamou que o estado não recebeu equipamentos do governo federal. Mais tarde, a capital paulista recebeu 20 respiradores da pasta.

No Recife, a Prefeitura foi à Justiça e conseguiu uma decisão favorável do TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região), para impedir a requisição de respiradores e garantir o fornecimento dos equipamentos à capital de Pernambuco.

No entanto, após negociação com o governo federal, a Prefeitura desistiu da ação, com a resposta de que o fornecimento dos aparelhos estava garantido. Segundo a administração, a entrega está prevista para esta semana.

Um dia após o ofício federal, a Prefeitura de Cotia, na grande São Paulo, entrou com um pedido de liminar na Justiça requisitando a produção da empresa Magnamed. A Guarda Municipal foi convocada pelo vice-prefeito da cidade, Almir Rodrigues, para ir até a fábrica e saiu de lá com 35 equipamentos. O município, porém, teve de devolver os ventiladores a pedido do Ministério Público Federal.

No Amapá, a União acionou a Justiça para recolher 25 respiradores comprados pelo Estado. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) chegou a denunciar a ação nas redes sociais.

O governo do Ceará recebeu ontem mais de 100 toneladas de insumos vindos da China e aguarda mais carregamentos nas próximas semanas.

Posicionamento do Ministério da Saúde

Em nota enviada ao UOL, o Ministério da Saúde disse não faltar apoio aos estados e municípios, "que são os responsáveis pela compra dos insumos".

"Devido ao cenário de emergência em saúde pública por conta da pandemia do coronavírus, o Ministério da Saúde utilizou o seu poder de compra para fazer as aquisições em apoio aos gestores locais do Sistema Único de Saúde (SUS). E, assim, fortalecer a rede pública de saúde no enfrentamento à doença em todos os estados do país."

E acrescenta: "diante da situação de emergência em saúde pública por conta da pandemia de coronavírus, a lei 13.979/2020 prevê que a pasta pode requisitar administrativamente equipamentos e insumos necessários ao enfrentamento da doença, como os respiradores, usados no tratamento de pacientes graves. A medida busca regular o sistema, garantindo que todos os estados sejam abastecidos conforme o princípio constitucional da equidade. Até o momento, o Ministério da Saúde recebeu e entregou 861 respiradores pulmonares para reforçar 14 estados no combate à covid-19".

"Cabe registrar que o Ministério da Saúde repassou mais de R$ 5 bilhões diretamente aos estados e municípios. Também distribuiu 83 milhões de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), habilitou 3.810 leitos de UTI para tratar exclusivamente pacientes com coronavírus, locou e distribuiu 530 leitos de UTI completos com instalação rápida para todo o país e distribuiu 8,5 milhões de testes de diagnóstico", finaliza a nota oficial.