Gabbardo rebate Trump: Brasil ganhou de 5 a 0 na resposta ao coronavírus
João Gabbardo, ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, não gostou das críticas feitas hoje pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao combate à pandemia do novo coronavírus no Brasil.
Segundo Trump, se os norte-americanos tivessem adotado respostas como a de brasileiros e suecos contra a covid-19, seu país poderia ter dois milhões de mortes. No UOL Entrevista de hoje, porém, Gabbardo afirmou que o Brasil teve uma resposta mais rápida à pandemia que os Estados Unidos. A conversa foi conduzida pelos colunistas Carla Araújo e Josias de Souza, do UOL.
"Se compararmos o atendimento e a resposta que os Estados Unidos deram, que Nova York deu no atendimento das pessoas com coronavírus, ganhamos de 5 a 0. Em Nova York, as pessoas morriam porque não tinha respirador, os médicos definiam quem deveria ir para o respirador. Foram criados protocolos para definir quem poderia ter benefício melhor e as outras pessoas ficaram sem acesso. Não é possível que os Estados Unidos possam propor que o Brasil teve um atendimento e uma resposta inadequada", disse Gabbardo, que hoje integra a equipe especial de combate à pandemia do governo de São Paulo.
O Brasil se preparou e enfrentou a epidemia de uma forma muito mais qualificada que os Estados Unidos. Eu lembro que, nos Estados Unidos, o pessoal de hospitais usava saco de lixo como EPI, e o presidente dizia que tinha conseguido 8 milhões de máscaras. Naquela época, compramos 240 milhões de máscaras. Os dados dos EUA são maiores que o nossos, mas a mortalidade do Brasil para cada 100 mil habitantes é muito menor que dos EUA.
No Brasil, atualmente a mortalidade relacionada à covid-19 é de 16,2 óbitos a cada 100 mil habitantes. E relação aos americanos, este número fica em 33,08.
No entanto, o médico reconheceu que os norte-americanos levam uma vantagem sobre o Brasil: o número de testes realizados.
"Os EUA conseguiram testar muito mais pessoas que nós, ficaram com letalidade menor. Quanto mais testagem fizer, maior será o denominador de casos confirmados e letalidade baixa. Letalidade não tem a ver com qualidade de atendimento. O Brasil não fez testes, a quantidade é insuficiente, está crescendo e teremos um aumento considerável da testagem nos próximos meses, o que vai fazer que a letalidade do Brasil caia bastante."
Projeções para o pico do contágio
Segundo Gabbardo, os cálculos feitos anteriormente indicam que o Brasil está se aproximando do pico do contágio.
"Imaginávamos que junho será o pior no Sul e no Sudeste — não tanto para o Norte, porque historicamente esse é o período em que, antes da epidemia, acontecia o aumento de internações para doenças respiratórias agudas. Agora, são três ou quatro semanas que nos separam da expectativa do maior número de casos, por isso fazíamos aquela projeção", explicou.
Para o médico, o principal obstáculo nas projeções feitas pelo Ministério da Saúde ainda no início da pandemia era a falta de informações e dados a respeito do novo coronavírus. Por isso, muitos modelos se mostraram conflitantes.
"Tínhamos dentro do ministério o comitê técnico, especialistas, tínhamos cenários diferentes, (mas) não havia consenso do que poderia acontecer. Cenários que foram influenciados por estudos do Reino Unido que apresentavam casos e óbitos gigantescos. Se nada for feito, sem tomar medida de isolamento, se deixarmos a vida correr, as pessoas vão estar imunizadas, a epidemia terminaria rápido — isso é verdade, mas teríamos tantas pessoas doentes simultaneamente que teríamos igual aconteceu o colapso no norte da Itália, na Espanha e nos EUA. Evitamos esse colapso", disse.
"Em Manaus e Belém, tivemos alguns dias em que isso ocorreu, mas de maneira geral essas cidades já tinham déficit de leitos e foi rapidamente controlado. Eu achava que teríamos um número um pouco menor que estamos tendo, achava que ficava por volta de 30 mil; (mas) era uma projeção sem base científica, porque tudo dependia das medidas que seriam tomadas. Quanto menor a intensidade de isolamento, maior seria o número de casos e óbitos. Ficamos em uma forma regular de distanciamento social, cumprimento das medidas e principalmente porque pudemos completar a estrutura de saúde. Um médico que trabalhou nos EUA que veio pro Brasil como voluntário em São Paulo disse que é um outro mundo a forma que atendemos aqui comparado com o que ele atendeu nos EUA. Não podemos desmerecer todo o trabalho que foi feito."
Participaram dessa cobertura Anaís Motta, Emanuel Colombari, Flavio Costa, Gustavo Setti e Talyta Vespa (redação) e ainda Diego Henrique de Carvalho (produção)
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