Ministério da Saúde foi avisado de Copa América só após anúncio da Conmebol
O Ministério da Saúde somente foi informado oficialmente sobre a realização da Copa América no Brasil depois de a Conmebol confirmar o país como nova sede do campeonato de futebol em suas redes sociais, o que aconteceu em 31 de maio. Brasil e Argentina decidem hoje à noite quem leva o título da competição.
Em resposta a pedido de LAI (Lei de Acesso à Informação), o ministério do governo Jair Bolsonaro (sem partido) explicou ter sido avisado sobre o evento no dia seguinte apenas, 1º de junho.
A pasta da Saúde foi questionada pela reportagem sobre o atraso da informação sobre a realização da Copa América e sobre o estudo de impacto do torneio. O ministério respondeu em nota que "coube à pasta avaliar os protocolos clínicos definidos pela Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) para a realização da Copa América no Brasil e monitorar, diariamente, o seu cumprimento", sem esclarecer se houve reunião com a CBF ou a Conmebol antes da confirmação do Brasil como sede (leia a íntegra mais abaixo).
A partida terá público de 5,5 mil pessoas depois de a prefeitura do Rio de Janeiro liberar 10% da capacidade do estádio do Maracanã, sede da final - após pressão dos argentinos, conforme publicado no blog do Rodrigo Mattos. Daniel Soranz, secretário de Saúde no governo de Eduardo Paes (PSD), assina o documento publicado no Diário Oficial do município.
Negociação e análises a jato
A confederação sul-americana de futebol confirmou o torneio em solo brasileiro após acerto direto com Bolsonaro.
Demorou menos de 24 horas, entre os dias 30 e 31 de maio, desde a recusa da Argentina em receber o evento devido à pandemia até o anúncio de sua transferência ao Brasil.
Segundo resposta dada pelo Departamento de Ciência e Tecnologia, do Ministério da Saúde, via LAI, o setor recebeu a informação de que o evento ocorreria no Brasil em 1º de junho. A partir daí, teve início a análise dos impactos de receber o evento durante o combate à pandemia.
Em 24 horas, no dia 2 de junho, a Coordenação de Evidências e Informações Estratégicas para Gestão em Saúde entregou um documento após pedido do gabinete do ministro, Marcelo Queiroga, intitulado "Inventário de Referências".
O levantamento, de acordo com a resposta do ministério, tinha como objetivo "identificar a produção científica sobre estratégias seguras de realização de eventos esportivos no contexto da pandemia".
Segundo o setor da Saúde, o trabalho consistia em realizar "triagem em busca de bases de dados ou sites institucionais com vistas à identificação de protocolos, recomendações, guias relativos à literatura cinzenta". Uma das bases de pesquisa foi o site Pub Med, onde são compilados estudos de literatura biomédica.
Apesar de ter feito a seleção de pesquisas, a coordenação alerta que o inventário "não realiza análise de resultados principais, tampouco a análise da qualidade de evidências, devido ao tempo exíguo à sua elaboração".
Em 8 de junho, houve reunião com diversos setores do governo na Casa Civil, ligada à Presidência da República. Além do Ministério da Saúde, participaram Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), Ministério da Justiça, entre outros, para alinhar as ações para realização do evento.
A Saúde cobrou que a Conmebol enviasse protocolo de recomendações médicas para a realização dos jogos e fizesse o monitoramento de novas variantes da covid-19 por meio de lista de passageiros das delegações. Na LAI, o ministério diz que os pedidos foram seguidos.
A Anvisa, também através de LAI, informou que teve contato com a Conmebol sobre as questões sanitárias ligadas ao evento. Em relação ao "sim" dado pelo governo Bolsonaro, disse que a autorização da Copa América ocorreu em "ritmos bastante atribulados e de maneira acelerada".
Especialistas avaliam: "Decisão amadora"
O neurocientista Miguel Nicolelis entende que a velocidade para o Brasil aprovar ser sede do torneio mostra "que foi feita de maneira absolutamente amadora, sem nenhuma preocupação sanitária".
Não se aceita um evento dessa magnitude em 24 horas. Só confirma tudo aquilo que viemos falando há meses, desde começo da competição.
Miguel Nicolelis, neurocientista
Até o dia 26 de junho, menos de duas semanas depois do início da competição, o Ministério da Saúde registrou 190 casos positivos de covid-19 entre as delegações e os prestadores de serviços do evento. No entanto, na nota enviada ao UOL por email ontem (9), a pasta informou um número menor: 175 casos.
"Importante destacar que a redução dos números se deve a exclusão de dados em duplicidade informados pela organizadora do evento. A Conmebol é responsável pela realização dos testes e pelo sequenciamento genético para análise de possíveis variantes", diz a nota do ministério.
A infectologista Ana Freitas Ribeiro, do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, de São Paulo, considera pequeno o intervalo de um dia para se avaliar os riscos de receber a Copa América em meio à pandemia.
"Difícil fazer qualquer tipo de inventário [nesse tempo]. Para fazer uma avaliação com mais cuidado, dados, precisa de ter um tempo maior, não em um dia. Tem que estimar riscos, considerando o nível da pandemia, especialmente de transmissão", pontua.
Para ela, a decisão é "um exemplo de um governo que não vem tendo atitudes de prevenção" à pandemia. "Elas são feitas antes. Com um dia, não se consegue prever se está adequado", diz.
"Não se pode dizer, do ponto de vista epidemiológico, que está tudo bem. Concretamente, não estava. Temos tido agora uma redução de transmissão em alguns estados, mas é algo dentro de patamares altos. Lá atrás era ainda maior."
Outro lado
Leia a íntegra da resposta do Ministério da Saúde ao UOL:
"O Ministério da Saúde informa que coube à pasta avaliar os protocolos clínicos definidos pela Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) para a realização da Copa América no Brasil e monitorar, diariamente, o seu cumprimento. Integram essa análise diária o acompanhamento de casos confirmados, testagem, vigilância genômica e intercorrências de saúde (traumas e clínicos) relatados pelos profissionais médicos afiliados à Conmebol distribuídos nas quatro sedes dos jogos.
"Entre 11 de junho e 08 de julho, foram realizados 28.598 testes de RT-PCR entre jogadores, membros das delegações e prestadores de serviços. Até o momento, 175 casos de covid-19 foram confirmados, sendo 37 entre jogadores e membros das delegações, 132 prestadores de serviços terceirizados e 6 Conmebol - staff que inclui arbitragem, médicos e equipe logística. A positividade de casos por covid-19 geral foi de 0,61%.
"Os casos de prestadores de serviços, delegações e jogadores foram confirmados em todas as sedes: Brasília (DF), Cuiabá (MT), Goiânia (GO) e Rio de Janeiro (RJ).
"Importante destacar que a redução dos números se deve a exclusão de dados em duplicidade informados pela organizadora do evento. A Conmebol é responsável pela realização dos testes e pelo sequenciamento genético para análise de possíveis variantes."
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