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Vídeo: Virologista diz que há entendimento entre Prevent Senior e governo

Live com o virologista Paolo Zanotto e o diretor-executivo da operadora de saúde Prevent Senior - Reprodução/Youtube
Live com o virologista Paolo Zanotto e o diretor-executivo da operadora de saúde Prevent Senior Imagem: Reprodução/Youtube

Do UOL, em São Paulo

18/09/2021 17h43

Em uma transmissão ao vivo feita em abril do ano passado sobre a hidroxicloroquina, compartilhada pelo presidente Jair Bolsonaro (Sem partido), o virologista Paolo Zanotto, suspeito de integrar o "gabinete paralelo", disse que havia "um entendimento muito interessante" entre a Prevent Senior e o governo federal brasileiro. Pedro Batista Junior, diretor-executivo da operadora de saúde, também participou da transmissão.

Na última quinta-feira, a Globonews revelou um dossiê encaminhado por um grupo de 15 médicos que relatam ter trabalhado na Prevent Senior e dizem que a operadora ocultou mortes de pacientes que participaram — sem conhecimento — de um estudo para testar a eficácia da hidroxicloroquina e azitromicina contra a covid-19.

Segundo o dossiê, a disseminação da cloroquina e outros medicamentos é resultado de um acordo entre o plano de saúde e o governo federal. Desde o início da pandemia, o presidente defende o tratamento precoce, sem eficácia comprovada contra a doença.

Nos documentos, o grupo também informa que integrantes do chamado "gabinete paralelo" do governo Bolsonaro usaram a operadora de saúde como uma espécie de laboratório para tentar comprovar a tese de que o chamado "kit covid" (hidroxicloroquina e azitromicina) seria eficiente contra a covid-19.

O gabinete paralelo teria assessorado o presidente ao longo da pandemia do novo coronavírus à revelia das ponderações e decisões oficiais do Ministério da Saúde.

Na transmissão ao vivo, Zanotto e Batista Júnior são questionados sobre o motivo de o governo Bolsonaro não ter adotado, até então, um protocolo para medicar hospitalizados com hidroxicloroquina.

"A minha função aí foi junto com o Luciano Azevedo, tenente da reserva da Marinha brasileira, médico, e a doutora Nise Yamaguchi - espero que eles estejam ouvindo a gente agora -; eles estão em Brasília nesse momento e eles estão lá conversando com o 'high brass', o alto escalão do governo brasileiro, que está acompanhando isso, o Pedro sabe disso, de muito mais perto do que vocês imaginam", disse Zanotto, se dirigindo ao diretor-executivo da operadora de saúde.

"A gente fez um arrazoado de dados do Pedro, Luciano visitou o Pedro, olhou tudo aquilo, trouxe, para esse grupo, informações impressionantes. (...) Existe um entendimento muito interessante entre a Prevent Senior e o governo federal brasileiro e todas essas informações estão sendo compartilhadas, inclusive com governos de outros países", acrescentou ele.

Batista Júnior, então, responde:

"A gente compartilha o tempo inteiro o trabalho que está sendo feito (...) Eles vieram aqui e coletaram nossas informações, esse grupo de cientistas, o doutor Luciano, a doutora Nise, e o doutor Zanotto".

Em 5 de abril do ano passado, Bolsonaro divulgou em seu Twitter a live. "Esclarecedores dados e pró-atividade (sic) contra o covid-19", escreveu o presidente.

Procurada pelo UOL neste sábado, a Prevent Senior respondeu que "nunca houve entendimento nem qualquer tipo de relação política da empresa com o governo". E resumiu a questão com a justificativa que "durante a pandemia, médicos da empresa participaram de videoconferências com especialistas de diversas organizações do País e do Exterior".

Omissão de mortes

Em entrevista à emissora de TV, os médicos disseram que a operadora de saúde omitiu mortes pela doença em estudo no qual pretendia comprovar a eficácia do kit covid.

Segundo eles, nove pacientes vieram a óbito, mas o estudo relata que foram apenas dois casos. Essa pesquisa foi citada por Bolsonaro como prova da sua falsa tese de que as pessoas não precisavam fazer quarentena ou usar máscara porque a combinação de cloroquina e azitromicina curaria a doença, o que contraria a OMS (Organização Mundial de Saúde).

O documento sob análise da CPI não é apócrifo. Dele, constam os nomes dos 15 médicos e uma série de mensagens de WhatsApp apresentadas como prova. Uma delas é do diretor da Prevent, Fernando Oikawa.

"Iremos iniciar o protocolo de HIDROXICLOROQUINA + AZITROMICINA. Por favor, NÃO INFORMAR O PACIENTE ou FAMILIAR, (sic) sobre a medicação e nem sobre o programa", orientou o executivo no grupo de médicos, segundo revelou a GloboNews.

O dossiê apresentado aos senadores alerta que o estudo foi feito com mais de 700 pacientes - e não os 200 declarados no projeto inicial. Informa ainda que a média de idade das pessoas que foram submetidas à pesquisa é superior a 60 anos, o que sugere a inclusão de grande número de idosos "e, portanto, grupo considerado de maior risco da covid-19".

A denúncia levada pelos médicos à CPI afirma ainda que, no ano passado, após críticas do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta a subnotificações de mortes de pacientes e ao atendimento da Prevent Senior a idosos, a diretoria da operadora "fez um pacto com o 'gabinete paralelo' para livrar a empresa das críticas".

Segundo o dossiê, a médica oncologista Nise Yamaguchi "frequentava a Prevent Senior para alinhar os tratamentos precoces". Os médicos afirmam que ela "assessorava pacientes internados na Prevent Senior que eram considerados 'especiais' pelo governo".

Nise, que chegou a ser cotada para assumir o Ministério da Saúde após a demissão de Mandetta, também é apontada como integrante do "gabinete paralelo".

A existência de uma equipe fora da estrutura do Ministério da Saúde que era ouvida para definir políticas públicas foi revelada por Mandetta, demitido pelo presidente após se negar a assinar protocolos que recomendavam o uso de medicamentos com ineficácia comprovada, como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina, contra a doença.

A Prevent Senior anunciou, em março do ano passado, que faria o estudo para testar a eficácia da hidroxicloroquina associada ao antibiótico azitromicina contra a covid-19. A pesquisa foi suspensa logo em seguida, em 20 de abril, pela Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa). O órgão descobriu que os testes com pacientes haviam começado antes de a operadora receber o aval para a pesquisa, o que é proibido no País.

O grupo de médicos que apresentou a denúncia contra a operadora relatou à CPI que, no ano passado, a Prevent Senior comprou mais de 3 milhões de comprimidos de medicamentos do tratamento precoce, como cloroquina e ivermectina. "Quantidade suficiente para medicar cerca de 500 mil clientes da operadora", dizem no documento.

Em 18 de abril, Bolsonaro publicou em uma rede social que a Prevent Senior o havia informado sobre alguns resultados do estudo. Segundo o presidente, 412 pacientes haviam optado por tomar hidroxicloroquina, 8 foram internados e nenhum intubado. "O número de óbitos foi zero. O estudo completo será compartilhado em breve", registrou Bolsonaro.

O grupo autor da denúncia afirma que o médico Rodrigo Ésper, da operadora, sugeriu, em um áudio no WhatsApp, revisar os números do estudo citado por Bolsonaro. Na mensagem, ele afirma que os dados precisam ser "assertivos e perfeitos porque o mundo está olhando para a gente". "Até o presidente da República citou a gente. Esse áudio tem que ficar aqui, não pode sair."

Operadora diz que vai processar ex-funcionários

A Prevent Senior divulgou nota na última quinta-feira (16), em que "nega e repudia denúncias sistemáticas, mentirosas e reiteradas que têm sido feitas por supostos médicos que, anonimamente, têm procurado desgastar a imagem da empresa". "Em decorrência disso, está tomando as medidas judiciais cabíveis para investigar todos os responsáveis por denunciação caluniosa (e outros crimes) sejam investigados e punidos. Os médicos da empresa sempre tiveram a autonomia respeitada e atuam com afinco para salvar milhares de vidas", afirma a operadora.

A empresa informou, na nota, que vai pedir investigações ao Ministério Público para apurar "as denúncias infundadas e anônimas levadas à CPI por um suposto grupo de médicos". "Estranhamente, antes de as acusações serem levadas à comissão do Senado, uma advogada que representa esse grupo de médicos insinuou que as denúncias não seriam encaminhadas se um acordo não fosse celebrado. Devido à estranheza da abordagem, a Prevent Senior tomará todas as medidas judiciais cabíveis", afirmou a operadora.

O UOL também procurou o Palácio do Planato para saber do que se tratava o "entendimento" citado por Zanotto, mas até a publicação desta reportagem, não recebeu retorno. O espaço será atualizado tão logo sejam prestados esclarecimentos.

Sem tempo e sem vínculos

Batista Júnior, tinha depoimento marcado na quinta-feira na CPI, mas ele não compareceu. A empresa alegou "falta de tempo hábil".

Zanotto afirmou à reportagem do jornal O Estado de S. Paulo que "ninguém disseminou o tratamento" precoce, como afirma o dossiê entregue aos senadores. "Foi perguntando para nós o que estava acontecendo em termos de tratamento precoce. Foi perguntado pelo Arthur Weintraub (ex-assessor da Presidência da República)", disse.

"O tratamento precoce não foi implementado como política de Estado, não houve essa realização. O que aconteceu no Brasil foi a disponibilização de fármacos em alguns lugares do País", afirmou.

Procurada pelo jornal, Nise disse desconhecer que a Prevent Senior fosse validar protocolos do governo.

A médica afirmou ainda que não tem nenhum vínculo científico com a operadora e nem interferência nos protocolos de pesquisa que eles realizam.

* Com informações do Estadão Conteúdo