Covid: crianças de 5 anos morrem mais, mas serão as últimas vacinadas
Dados inéditos dos cartórios de registro de civil do país levantados a pedido do UOL revelam que crianças de cinco anos foram as que mais morreram de covid-19 em 2020 e 2021 dentro da faixa etária da vacinação infantil (entre 5 e 11 anos). A imunização de crianças está prevista para começar na próxima sexta-feira no país. Segundo o plano elaborado pelo Ministério da Saúde, as de 5 anos serão as últimas imunizadas, já que a ordem de imunização indicada é decrescente.
Segundo os dados retirados do portal da transparência da Arpen-Brasil (Associação de Registradores de Pessoas Naturais), desde o início da pandemia houve 324 mortes de crianças entre 5 e 11 anos com covid-19 no país. Dessas, 65 faleceram aos 5 anos de idade, as maiores vítimas entre todas as idades.
A pediatra e diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) em São Paulo, Melissa Palmieri, explica que o as crianças menores estão mais vulneráveis porque estão menos desenvolvidas que as mais velhas.
"Quanto menor a faixa etária, mais risco a exposição a doenças infecciosas devido à imunidade ainda estar imatura; ou até mesmo as próprias crianças estarem realizando também seus esquemas de vacinação para desenvolvimento do sistema imunológico", diz Palmieri.
Ela explica que outro fator importante são as doenças congênitas. "São casos que vêm durante o nascimento, e as causas [de morte] são mais precoces."
Causas de morte
Em 2020 foram registrados 2.776 óbitos de crianças de 5 a 11 anos no Brasil. No ano passado, esse número está em 2.766, mas há expectativa de que novas mortes não informadas por cartórios sejam acrescentadas ao levamento — o prazo para inclusão de óbitos no portal é de até 15 dias.
Nas certidões de óbito, a maior causa de morte de crianças dessta faixa etária é a septicemia (reação exagerada do corpo a algum tipo de infecção causada por vírus, bactéria ou fungo). Em segundo lugar, está a pneumonia. A covid é a quinta causa de morte.
Principais causas de morte (5-11 anos):
- Septicemia - 717
- Pneumonia - 645
- Acidentes vasculares cerebrais - 467
- Insuficiência respiratória - 452
- Covid-19 - 324
Segundo Melissa Palmieri, as principais causas apontadas em registros incluem um conjunto de problemas secundários, causados por uma série de problemas primários.
Septicemia e pneumonia, por exemplo, são ocasionadas por agentes infecciosos --sejam vírus, bactérias, fungos. O problema ocorre devido à assistência e à deficiência de testes para detecção usual desses agentes. Agora nós estamos muito mais alertas em busca de covid, influenza. Mas existem outros vírus. Muitos hospitais particulares conseguem facilmente detectar melhor esses agentes, mas existe essa dificuldade [na rede pública]
Melissa Palmieri, pediatra
A septicemia, por exemplo, muitas vezes surge durante um período de internação —como em casos graves de covid-19. "Elas são evoluções de agravamento, por exemplo, de uma criança que tem um quadro respiratório que evolui com uma infecção generalizada", explica.
Vacinação em ordem decrescente
A necessidade da vacinação infantil é um consenso entre entidades médicas e de especialistas da área, mas foi criticada pelo presidente Jair Bolsonaro. Na quinta-feira, ele chegou a dizer que desconhecia mortes de crianças com covid-19.
Segundo o plano do Ministério da Saúde, as crianças serão imunizadas com duas doses da vacina Pfizer, em um intervalo de oito semanas. A pasta recomenda um calendário que siga ordem decrescente de idade, priorizando:
- Crianças com comorbidades e deficiências permanentes;
- Indígenas e quilombolas;
- Crianças que vivem com pessoas com riscos de evoluir para quadros graves da covid-19.
Estados e municípios, porém, têm autonomia para definir suas regras. O Rio, por exemplo, já adiantou o calendário e que vai vacinar apenas por faixa etária decrescente, sem indicar prioridades.
A previsão é que as primeiras vacinas cheguem ao país no dia 13 e que, até o fim do mês, o país receba 3,7 milhões de doses.
Segundo Melissa Palmieri, a vacinação em ordem de idade crescente teria mais sentido, mas poderia gerar outros tipos de problemas operacionais.
Pelos dados epidemiológicos faria sentido, mas acredito que o espaçamento de uma semana ou duas semanas entre a inserção desses grupos, de acordo com a disponibilidade de vacina, não [traga efeito negativo e] dificultaria até a operacionalização para os pais. Só se houvesse uma deficiência importante de recursos; aí sim, teria que haver essa priorização, em especial dos grupos definidos.
Melissa Palmieri, pediatra
Ela alega ainda a decisão não é simples, já que no caso da SIM (Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica), são crianças mais velhas que apresentam mais problemas. A SIM é uma doença inflamatória que pode ocorrer em crianças que adoecem e precisam ser internadas com covid-19.
"Tudo depende de acometimento de maior número da doença por faixa etária. Nós sabemos que a SIM tem uma repercussão importante numa faixa de 7 a 11 anos. A gente tem visto que tem evoluído muito em crianças que têm comorbidades, mas tem sempre aquela exceção. Então o importante é o município acelerar a vacinação", afirma.
Alta letalidade
O número de óbitos de criança no país chama a atenção quando comparado ao de mortes por outras doenças por agentes infecciosos. O UOL revelou, por exemplo, que as mortes de bebês e crianças de até 9 anos com covid superam a soma de todas as doenças preveníveis por vacinação em 15 anos.
"Os números compilados pelo Portal da Transparência mostram que, embora reduzidos, os óbitos de crianças fazem parte deste triste momento que estamos vivendo, e que a vacinação é o melhor caminho para que vidas sejam salvas e para que a doença, propagada pelas novas variantes, seja menos fatal a quem já estiver imunizado", diz Gustavo Renato Fiscarelli, Presidente da Arpen-Brasil.
Para a SBIm, o número de mortes de crianças no Brasil é considerado muito alto. Além da covid-19, entre crianças e adolescentes, "foram 1.412 casos de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica, que causaram hospitalizações e 85 mortes."
"A taxa de letalidade, 6%, é cinco vezes superior à relatada nos Estados Unidos, por exemplo", diz a entidade em nota de repúdio, publicada na sexta, a fala de Bolsonaro contra a vacinação infantil.
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