Aumenta temor de 'Patriot Act' à francesa após ataques em Paris
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Fred Lancelot/Reuters
A França endureceu suas medidas de segurança após a sequência de atentados jihadistas em Paris, um caminho que levanta o temor, entre alguns analistas, de que o país esteja seguindo na direção da chamada Lei Patriótica americana, a "Patriot Act".
Em um histórico discurso belicista diante do Parlamento reunido na segunda-feira (16), o presidente François Hollande não hesitou em "retomar propostas da direita, quase de extrema direita", alertou o jornal "Le Monde" em seu editorial.
Entre essas medidas, estão o prolongamento por três meses do estado de emergência (uma medida raríssima), o reforço dos meios policiais e militares, a dissolução das mesquitas extremistas e a ampliação das condições para a perda da nacionalidade.
Esse debate começou após os atentados em Paris, em janeiro deste ano.
A "Patriot Act" foi adotada nos Estados Unidos depois dos atentados do 11 de Setembro, em 2001. Essa legislação antiterrorista inédita criou um novo arsenal de agências e de poderes excepcionais, entre eles a detenção por tempo indeterminado e sem julgamento de qualquer pessoa suspeita de preparar atos terroristas.
O Sindicato francês de Magistratura (de esquerda) manifestou sua preocupação com o que considera como uma "suspensão do Estado de Direito".
O estado de emergência permite batidas policiais dia e noite --sem necessidade de mandado judicial--, prisão domiciliar e outras medidas de privação de liberdade excepcionais.
"Quando, frente a uma ameaça permanente, são tomadas decisões para eternizar o excepcional, isso não é bom para a democracia", disse à AFP o jurista Serge Slama.
Já o ex-juiz antiterrorista Marc Trevidic lembrou que dois países ocidentais votaram leis que permitem prender estrangeiros suspeitos de terrorismo sem intervenção da Justiça: Reino Unido, em 2000, até renunciar a essas medidas quatro anos depois; e Estados Unidos, com os campos de detenção de Guantánamo.
"Quatorze anos depois, continuam com Guantánamo aberto", apontou em entrevista ao jornal regional "Sud-Ouest".
O Guantánamo francês
"O arsenal repressor já existente nos parece suficiente. A Lei de Espionagem, em particular, foi muito longe, facilitando os grampos, a geolocalização", avaliou a secretária-geral da União Sindical de Magistrados (USM), Céline Parisot.
A polêmica Lei de Espionagem foi adotada em junho, depois dos atentados jihadistas de janeiro deste ano. Foram 17 mortos.
A lei "permite uma vigilância mais significativa do que em muitos outros países europeus", destacou o especialista Kit Nicholl, do instituto IHS Jane's, com sede em Londres, especializado em espionagem.
Para ele, "o problema não é identificar os potenciais terroristas, mas ter os recursos para analisar e avaliar" a ameaça.
Ontem, Hollande também anunciou a criação de 8.500 vagas na polícia, na Gendarmeria, na Justiça e na Alfândega.
"A França aumentou o orçamento dos serviços de Inteligência e anunciou uma importante quantidade de novas vagas, mas serão necessários anos para que isso tenha efeito. Você não vira agente de Inteligência da noite para o dia", completou Nicholl.
Para o jurista Serge Slama, "ainda não ultrapassamos a linha vermelha em termos de privação das liberdades públicas. Mas, se amanhã (...) for autorizada a prisão domiciliar de pessoas fichadas por radicalismo, ou seja, se se prende 'por precaução' antes mesmo de que se cometa um crime, teremos nosso Guantánamo".