Morales ainda acredita em reviravolta no referendo da Bolívia

La Paz, 23 Fev 2016 (AFP) - O presidente boliviano, Evo Morales, expressou nesta terça-feira sua esperança de que a apuração do referendo de reforma da Constituição se reverta a seu favor com os votos das populações indígenas distantes.

Com isso, ele poderia se candidatar a um novo mandato.

De acordo com o último boletim oficial, após 91,1% das urnas apuradas, o "não" aparece com 52,3%, contra 47,7% para o "sim".

Hoje, a Missão de Observação Eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA) pediu às autoridades que aceitem e respeitem os resultados do referendo de domingo.

"A Missão convida os representantes das distintas opções e os membros das forças políticas a aceitarem os resultados entregues pelo Órgão Eleitoral Plurinacional, única autoridade competente para esta tarefa", declarou a OEA em uma comunicado à imprensa.

"Peço, hoje (terça-feira), calma aos partidários das distintas opções e aos cidadãos enquanto são processados os resultados finais", completou a organização, afirmando que a transparência do processo está garantida.

Evo Morales, com 56 anos e de origem indígena, afirmou que, "se houver uma reviravolta, será com o voto dos movimentos sociais, especialmente com o voto do movimento camponês e indígena".

A apuração dos votos começa pelos centros urbanos até, finalmente, chegar às zonas rurais.

"Os movimentos sociais (sindicatos) nunca nos abandonaram, especialmente o movimento camponês-indígena", enfatizou, elogiando a lealdade política e eleitoral dos indígenas nesta última década.

"É um pacto de sangue que não vamos abandonar", prometeu.

Ele não quis comentar, porém, uma possível derrota nas urnas, depois de quase dez anos no poder.

O vice-presidente Alvaro García também acha que é preciso esperar pelo voto indígena de regiões dispersas e distantes, normalmente leais a Morales.

Na véspera, o presidente garantiu que respeitará os resultados do referendo de domingo, sejam quais forem.

"Se ganharmos, será por poucos votos. Se perdermos, será por poucos votos", estimou, durante um discurso de entrega de obras na área rural de La Paz.

"Depois de 10 anos (no poder), a maioria continua apoiando o processo", completou.

Embora a tendência dos resultados continue sendo adversa, Morales - que governa desde 2006 com o apoio de uma grande base social de indígenas e de setores populares - mantém a esperança na vitória: "somos otimistas", disse à imprensa.

Nesta terça, a calma prevalecia nas cidades bolivianas e, em La Paz, as atividades cotidianas eram normais.

Salvo um pequeno grupo de ativistas que, na noite de segunda-feira, fez um plantão de poucas horas em frente ao centro de apuração, não houve incidentes.

De acordo com o analista independente Andrés Torres, ainda que Morales tenha uma vitória apertada, o resultado pode deixá-lo "vulnerável aos ataques da oposição, que tentará fazer que sua gestão (com fim previsto para 2020) não termine nas melhores condições, para quem não possa voltar" a ser eleito.

Ex-membro do Tribunal Eleitoral, o cientista político Jorge Lazarte considerou que o resultado confirmaria que "uma parte do país disse 'basta' a Morales". Esse novo contexto pode forçá-lo a repensar suas políticas daqui para frente.

SucessãoEste cenário pode impactar o Movimento para o Socialismo (MAS), onde são vislumbradas "lutas internas que poderiam prejudicar seu futuro", completou Andrés Torres.

Analistas consideram que Morales - o líder com mais tempo no poder na Bolívia - deverá se concentrar no governo, enquanto se esforça para manter a coesão dentro do partido, formado por um conglomerado de organizações sindicais e sociais.

"É muito difícil encontrar um sucessor para Evo Morales que tenha a mesma capacidade de coesão que ele nas organizações sociais", comentou Torres.

"Morales poderia marcar uma tremenda luta" por sua sucessão, a qual "poderia enfraquecer o partido e provocar uma implosão com graves problemas para o MAS e para os quatro anos de governo que ainda lhe restam", completou.

Nas últimas semanas, a situação se complicou para o líder indígena, atingido pelo escândalo de um suposto tráfico de influências a favor da empresa chinesa Camc. Sua ex-mulher Gabriela Zapata trabalha como gerente comercial nesta companhia.

A instituição conseguiu contratos públicos de cerca de 560 milhões de dólares na Bolívia. O caso está sendo investigado no Congresso. Morales negou as acusações.

A imagem do presidente começou a se desgastar progressivamente desde o ano passado, influenciada por um escândalo que envolve dezenas de líderes camponeses, alguns ligados a ele. Os suspeitos são investigados por uma fraude de 2,5 milhões de dólares a um fundo de investimento.

Segundo a consultora de risco político Eurasia Group, é "pouco provável" que uma eventual derrota de Morales provoque "imediatamente uma radicalização de posições no país".

"Do ponto de vista político e econômico, é provável que a trajetória da Bolívia seja de estabilidade a curto prazo. Também não se vê uma Bolívia afetada por uma crise econômica", afirmou.

Isto se deve, em boa medida, ao fato de Morales ter impulsionado o crescimento do país depois de nacionalizar os hidrocarbonetos em maio de 2006, até então nas mãos de uma dezena de companhias estrangeiras.

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