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Cuba vota sua nova Constituição, enquanto defende a Venezuela

24/02/2019 20h03

Havana, 24 Fev 2019 (AFP) - Os cubanos votavam neste domingo (24) uma nova Constituição, que reafirma o socialismo como sistema político "irrevogável", em meio a fortes ameaças dos Estados Unidos e saindo em defesa da Venezuela, seu aliado mais próximo.

Por volta das 14H00 locais (16H00 de Brasília), cinco horas depois da abertura das seções, 74,09% dos habilitados tinham exercido seu direito ao voto, que é voluntário da ilha, informou a Comissão Eleitoral.

"A união cívico-militar e o povo revolucionário da #Venezuela, com seu Presidente @NicolasMaduro, impediram o golpe imperialista. Fracassaram os falcões do império e seus lacaios acompanhantes, mas o império não renuncia aos seus planos. A luta continua. #ManosFueraDelaVenezuela" [Mãos Fora da Venezuela], escreveu o presidente Miguel Díaz-Canel em sua conta no Twitter, após votar e sem perder de vista a situação do seu aliado.

Mais de oito milhões de cubanos foram convocados a votar em um referendo que o governo transformou em um plebiscito sobre a vigência "irrevogável" do socialismo.

"Até agora, o processo marcha de forma positiva, a afluência de todos os eleitores comportou-se de acordo com o previsto", disse à AFP Adelaida Sánchez, presidente de uma seção eleitoral em Havana Velha.

Segundo o jornal oficial Granma, Raúl Castro, primeiro secretário do governista Partido Comunista (PCC, único) "exerceu seu direito ao voto" na manhã deste domingo.

Na mira de Washington, assim como seu contraparte venezuelano Maduro, Díaz-Canel disse à imprensa que a América Latina está "vivendo um momento de ameaça imperial", e condenou a presença dos presidentes de Colômbia, Chile e Paraguai no sábado na fronteira da Colômbia com a Venezuela.

"A quem estes presidentes estavam apoiando?", perguntou-se também questionand-se o que fazia ali o senador republicano pela Flórida, Marco Rubio, duro crítico da revolução cubana e muito próximo do presidente Donald Trump.

Precisamente, Rubio, que é de origem cubana, tuitou neste domingo que o referendo é "outra manobra mais que a ditadura cubana usa para se aferrar ao poder", uma farsa e uma fraude". "Vejos você em breve", escreveu, dirigindo-se a Díaz-Canel em outro tuíte postado no sábado.

Cuba tenta unir a comunidade internacional contra o que chama de uma "agressão militar dos Estados Unidos" ao seu aliado.

- Trump impulsiona o sim? -Em Miami, Trump advertiu na segunda-feira que "os dias do socialismo e do comunismo estão contados na Venezuela e também na Nicarágua e em Cuba", países que sua administração aponta como "a troica da tirania".

Para o acadêmico Carlos Alzugaray, a agressividade de Trump impulsionou a onipresente campanha #YovotoSí (Eu voto sim), do governo.

"O discurso de Trump foi uma boa propaganda para o sim (...) Tem muita gente (...) que vai votar sim porque quer defender a independência diante da ameaça americana", explicou Alzugaray à AFP.

A nova Constituição, que substituiria a de 1976, reconhece o mercado e o investimento privado e externo como agentes na reforma da economia de viés soviético e com muitas carências, mas sempre sob a orientação do governista e único Partido Comunista.

- "A oportunidade de dizer não" - Em face do referendo, a oposição que apela geralmente à abstenção ou a anular as cédulas, desta vez convocou o "não".

"É óbvio que esse 'não' redondo vai além do 'não' a uma Constituição, é um 'não' a um regime que busca se perpetuar no poder", declarou à AFP o opositor José Daniel Ferrer.

Votar contra o texto é, ainda, "a única oportunidade que o povo teve em anos de lhe dizer 'não'", acrescentou.

Na era da Internet, mais facilmente acessível na ilha desde o lançamento, em dezembro, do 3G, o "sim" e o "não" disputaram por meses as redes sociais.

A Constituição dará aos cubanos "a Cuba a que sempre aspiramos, a Cuba digna, a Cuba sem ingerências, sem manipulações", disse o jovem Elián González, de 25 anos, que ficou famoso criança como o menino balseiro nos anos 2000.

O governo confia em que a vitória maciça do "sim", que requer 50%+1 do colégio eleitoral.

A Constituição de 1976 foi aprovada por 97,7% dos que votaram e a reforma constitucional de 2002 para tornar o socialismo "irrevogável" obteve 99,3%.

Na hipótese de que o "não" vença, um cenário político sem precedentes em 60 anos de revolução, continua em vigor a Carta de 1976 e o governo teria que adequar as normas para dar base legal às reformas em curso.

Alzugaray avaliou que a nova Constituição terá entre "70% e 80%" dos votos válidos: "A sociedade mudou e esta mudança vai se refletir no voto".