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Ministério Público investiga missão militar contra covid-19 em terras indígenas

Os Yanomami no encontro de Lideranças Yanomami e Ye"kuana, onde os indígenas se manifestaram contra o garimpo em suas terras. O primeiro fórum de lideranças da TI Yanomami foi realizado entre 20 e 23 de novembro de 2019 na Comunidade Watoriki, região do Demini, Terra Indígena Yanomami - Victor Moriyama / ISA/Victor Moriyama / ISA
Os Yanomami no encontro de Lideranças Yanomami e Ye'kuana, onde os indígenas se manifestaram contra o garimpo em suas terras. O primeiro fórum de lideranças da TI Yanomami foi realizado entre 20 e 23 de novembro de 2019 na Comunidade Watoriki, região do Demini, Terra Indígena Yanomami Imagem: Victor Moriyama / ISA/Victor Moriyama / ISA

Brasília

03/07/2020 21h50

O Ministério Público investiga se uma missão militar e de outros organismos estatais nas aldeias yanomami e yekwana no norte do país representaram riscos de contágio de covid-19 para os indígenas, informou a instituição.

O Ministério Público Federal (MPF) explicou que busca determinar se a entrada nas terras indígenas, entre 30 de junho e 1º de julho, ocorreu sem autorização e se a comitiva, que incluía jornalistas, entre eles uma equipe da AFP, violou as regras de distanciamento social.

Além disso, examina também a distribuição de cloroquina, remédio que foi entregue junto a outros materiais de proteção e medicamentos, pela secretaria da saúde indígena nas aldeias, disse o comunicado do MPF divulgado na ontem à noite.

"Ressalto que os indígenas em situação de isolamento são extremamente vulneráveis a agentes patógenos exteriores, podendo seu contato configurar crime contra a saúde pública, dentre outros ilícitos penais", escreveu Junior Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami (Condisi-Y), na denúncia que originou a investigação.

A missão militar visitou três comunidades do estado de Roraima, próximas à fronteira com a Venezuela. Entregou equipamentos de proteção e remédios, entre eles 16.000 comprimidos de cloroquina, assim como testes rápidos para a covid-19. Todos os testes feitos nas aldeias tiveram resultados negativos.

Os repórteres da AFP e de outros veículos de comunicação foram submetidos a testes RT-PCR e a exames médicos antes de embarcar em Brasília. Durante a missão, usaram máscaras e cumpriram as medidas de distanciamento social, como é a norma da AFP para garantir a segurança da equipe e das pessoas com as quais entram em contato ao fazer a cobertura da pandemia.

O ministério da Defesa assegurou, em comunicado, que no que diz respeito à pasta, a missão seguiu todos os procedimentos legais.

O vice-almirante Carlos Chagas, porta-voz do ministério, considerou a denúncia "completamente descabida".

"Como é que uma organização preocupada com os indígenas pode ficar incomodada com a presença de quem está tratando dos indígenas?", disse a jornalistas.

Sob controle?

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo, visitou a missão na última quarta-feira, e afirmou que a expansão do novo coronavírus em terras indígenas "por enquanto está sob controle".

A declaração foi criticada por algumas associações, como o Conselho Indígena de Roraima (CIR).

"Nós que vivenciamos a nossa realidade, senhor ministro! A covid-19 está sim se alastrando a cada dia nas comunidades indígenas e isso tem tirado a nossa tranquilidade. É, sim, preocupante o número de pessoas com os sintomas", afirmou o CIR em comunicado.

Junior Yanomami disse à AFP que existem 160 indígenas Yanomami contaminados com coronavírus, 35 deles nas aldeias. Ele também informou que quatro pessoas desse povo indígena faleceram por causa da covid-19, e outras três mortes estão sob investigação.

A terra indígena Yanomami, de 96.000 km2 e localizada no meio da Floresta Amazônica, há décadas sofre de invasões por mineradores ilegais.

Em resposta a uma solicitação do MPF, nesta sexta-feira Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com sede em Brasília ordenou que o governo retire os mais de 20.000 garimpos ilegais desta terra indígena, que tem 26.780 indígenas, por causa dos riscos de contaminação a esse povo.

O governo não reagiu e, caso queira, pode recorrer da decisão.

O vice-presidente Hamilton Mourão, que preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal, corrigiu que existem 3.000 garimpos ilegais, não 20.000, em seu Twitter.