Por que o fujimorismo continua tendo apoio no Peru?
A candidata de centro-direita Keiko Fujimori irá disputar o segundo turno das eleições presidenciais no Peru.
Com dois quintos dos votos computados, Fujimori somava 39% dos votos e caminhava para enfrentar Pedro Kuczynski, um ex-economista do Banco Mundial, em um segundo turno em junho.
Kuczynski somava 24% dos votos, enquanto a candidata de esquerda Veronika Mendoza tinha 17%.
Keiko Fujimori, 40 anos, filha do ex-presidente do Peru Alberto Fujimori (governou entre 1990-2000), diz que enfrentar o crime será sua prioridade caso seja eleita.
Ela tem apoio de setores da população que creditam a seu pai a derrota do grupo guerrilheiro Sendero Luminoso.
Mas outros peruanos rejeitam qualquer nome associado ao ex-presidente, que hoje cumpre pena de 25 anos de prisão por ter autorizado a ação de grupos de extermínio contra civis durante sua ação contra a guerrilha.
Keiko se apresenta como candidata pela segunda vez pelo partido Força Popular. Embora busque marcar distância em relação ao pai, sua aspiração inevitavelmente acaba associada à gestão de Alberto Fujimori.
O sobrenome atrai tanto simpatizantes como detratores.
Por que o fujimorismo continua tendo tanta força no Peru? A candidata de direita desperta paixões sobretudo em setores populares, que atribuem a seu pai o fim do terrorismo e da crise econômica que o país enfrentou nos anos 1980.
Mas também gera forte rejeição entre aqueles que não esquecem porque o ex-presidente está na cadeia.
Os opositores de Alberto Fujimori apontam que ele foi um líder autoritário que abusou das instituições para se manter no poder e que fugiu para o Japão por um caso de corrupção sem precedentes no país.
Ele foi condenado em 2009 pelas chacinas de Barrios Altos (1991) e La Cantuta (1992), onde 25 pessoas morreram por ação de um grupo militar à paisana, e pelo sequestro de um jornalista e de um empresário em 1992.
Keiko Fujimori promete não cometer os "erros" do governo do pai, porém seu discurso desperta suspeita em alguns setores. Especialistas dizem ainda que ela poderá enfrentar dificuldades no segundo turno.
Imagem própria
Para especialistas consultados pela BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, o voto antifujimorista no segundo turno deverá se concentrar em Pedro Pablo Kuczynski.
Isso porque embora a filha do ex-presidente tenha defendido o respeito aos direitos humanos na campanha, há quem considere isso insuficiente para dissociá-la da herança do pai.
"É muito difícil limpar a imagem", aponta o peruano Carlos Manuel Indacochea, professor de Relações Internacionais da Universidade George Washington (EUA).
"Sempre que se faz uma barganha moral crimes são chamados de erros. Mas o fujimorismo não cometeu erros; as malas de dinheiro que Fujimori enviou ao Japão com seu cunhado embaixador não foram um erro", completa.
"É muito fácil dizer coisas, mas para que as pessoas acreditem em você é preciso sofrer, pagar um preço. Ela deveria ter enfrentado o pai, suportado a saída de alguns membros históricos do partido.
Isso não ocorreu, então muita gente não acredita nela", diz Peter Levitsky, professor de Governo da Universidade de Harvard (EUA), que no ano passado convidou Keiko para uma conferência aberta com alunos.
Levitsky diz que as acusações de corrupção, violação de direitos humanos e de apoio a um "regime autoritário" não são contra ela, mas seu partido, porém ela "jamais rompeu com a sigla".
Michael Shifter, presidente do centro de análise política Diálogo Interamericano e especialista em Peru, afirma que Keiko é uma figura com "certa habilidade política, que esteve no Congresso e construiu uma base de apoio, mas tem seu limite".
Mesmo que ela tenha um discurso mais aberto como candidata, Shifter diz ser preciso levar em conta quem está próximo da candidata.
"Muita gente de sua equipe era da equipe de seu pai, e isso gera resistências em setores da sociedade que possuem más lembranças dos anos de violações aos direitos humanos, corrupção e de um ambiente muito polarizado".
Simpatizantes em redes sociais defendem Keiko.
"São jovens cujos pais contaram a verdade sobre os anos de terrorismo e que o presidente que teve a coragem para acabar com isso foi o pai de Keiko, por isso a seguem fielmente e são o pilar em que ela se apoia", escreveu René Dulanto na página de Facebook "Jóvens com Keiko".
Favoritismo
Apesar das ressalvas, Keiko venceu o primeiro turno após liderar com folga as pesquisas. Quais são as razões?
"Primeiro porque não havia muitas opções e seus rivais foram piores do que ela", diz Peter Levitsky. "Os partidos que já foram autoritários normalmente não têm maioria, mas conservam certo nível de apoio na sociedade que serve como piso eleitoral. Muitas vezes mantêm redes que ajudam na organização, e o fujimorismo é assim."
Levitsky atribui o "êxito relativo do fujimorismo" ao "colapso" do restante dos partidos e ao fato de Keiko ser uma "candidata de talento".
"Não é muito carismática, mas é disciplinada, trabalha, aprende e é uma boa política", afirma o especialista.
Indulto ao pai
Um dos temas que levantam mais suspeitas no eleitorado contra Keiko é a possibilidade de que conceda indulto a seu pai.
A candidata já disse que deixará a questão com o Judiciário. "O problema é que ninguém no Peru acredita que o poder judicial seja independente", afirma Levitsky.
"Não esqueçamos que o indulto a Alberto Fujimori é praticamente a razão de ser do fujimorismo, por isso o movimento surgiu em meados dos anos 2000. Então não fazer isso seria uma traição aos membros do fujimorismo, mas se fizer terá também que pagar um preço enorme".
Keiko assinou um documento em que se compromete a lutar contra a corrupção, respeitar os direitos humanos e a liberdade de imprensa, e a não usar o poder político para beneficiar parentes.
"Sei olhar para a história do meu país. Sei quais capítulos devem se repetir e sei muito bem quais não devem."
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