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4 razões que explicam por que a Turquia é alvo de tantos atentados

1.jan.2017 - Mulher ferida é levada em ambulância após ataque  - Murat Ergin/Ihlas News Agency/Reuters
1.jan.2017 - Mulher ferida é levada em ambulância após ataque Imagem: Murat Ergin/Ihlas News Agency/Reuters

03/01/2017 10h24

O momento do ataque à boate Reina, na Turquia, foi simbólico: depois de um ano marcado por vários ataques terroristas e uma violenta instabilidade política, o país esperava que 2017 começasse de forma mais pacífica e feliz, mas, nas primeiras horas do ano, um homem entrou na casa noturna de Istambul e matou a tiros 39 pessoas.

O alvo do ataque também foi simbólico: a Reina, localizada às margens do Estreito de Bósforo, que divide a Ásia e a Europa no país, é um local frequentado por estrangeiros e habitantes mais cosmopolitas da mais conhecida cidade turca.

Horas depois do massacre, o grupo extremista muçulmano autodenominado Estado Islâmico (EI) assumiu a autoria do ataque.

Em 2016, a Turquia foi alvo de 23 atentados, vinculados tanto ao EI quando a separatistas curdos, que deixaram um saldo de mais de 360 mortos.

No entanto, o mais recente, ocorrido apenas duas semanas após o assassinato de Andrei Karlov, embaixador da Rússia na capital turca, Ancara, expôs ainda mais os problemas que o país enfrenta.

A seguir, entenda os motivos que levam a Turquia a estar na mira de tantos ataques.

1. Guerra na Síria

A Turquia é um país muçulmano aliado do Ocidente e membro da Organização para o Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e até pouco tempo visto como um bastião de estabilidade.

Mas não ficou imune ao caos atual no Oriente Médio. No início da guerra civil na Síria, em 2011, o país foi muito criticado por não atuar com firmeza contra militantes extremistas que cruzavam seu território para chegar ao país vizinho.

Ancara foi acusada de apoiar indiretamente o levante do EI, até porque suas operações na Síria se limitavam a atacar alvos do PKK, a principal organização separatista curda e que combate o EI.

Em agosto do ano passado, o governo turco lançou uma operação militar terrestre para combater os extremistas.

Em seu comunicado após o ataque na Reina, o EI acusou a Turquia de "servir aos cristãos" e de derramar sangue muçulmano com "ataques aéreos e bombardeios" na Síria.

"A Turquia está cada vez mais envolvida na guerra civil síria e, por isso, vulnerável", diz Mark Lowen, correspondente da BBC no país. "Este ciclo de violência pode ter marcado o ano mais turbulento da história moderna turca"

 

Câmaras flagram homem atirando dentro de boate em Istambul

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2. Separatismo curdo

No âmbito interno, a Turquia trava há décadas uma luta armada contra o PPK. Em 2015, um cessar-fogo ruiu, e, desde então, a violência e os ataques não pararam mais.

O PPK coloca bombas para matar soldados e policiais turcos, e o Estado revida com ataques e toques de recolher em muitas áreas.

Quando a Turquia interveio na guerra na Síria, fez isso por duas frentes. Além de integrar operações contra o EI, também aumentou o número de ataques contra os curdos sírios - que são aliados de Washington - que combatem o EI no país.

Um dos principais objetivos de Ancara era evitar a criação de uma zona autônoma curda na Síria, o que reforçaria a causa separatista dentro da Turquia.

3. Divisões internas

Não apenas o extremismo islâmico e o separatismo curdo estão por trás do precário estado de segurança na Turquia.

O clima instável no país deu brecha para que, em meados de 2016, houvesse uma tentativa de golpe de Estado.

Em 15 de julho, soldados rebeldes atacaram o parlamento e levaram tanques às ruas em uma noite que deixou quase 300 mortos.

O golpe fracassou, mas o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, respondeu com medidas severas. Ordenou, por exemplo, milhares de prisões e demissões de funcionários públicos.

"Se houvesse um golpe de Estado, as coisas estariam muito pior, mas estamos presenciando a erosão do estado de direito", diz Fatih Canbay, advogado que representa algumas das pessoas presas ou demitidas.

4. Governo de pulso firme

Apesar das medidas de segurança impostas pelo governo, os atentados continuam. E a economia turca está sofrendo com o impacto sobre um de seus principais motores, o turismo, um setor que respondeu em 2015 por quase 13% do seu PIB.

Mas, nos primeiros oito meses de 2016, por exemplo, o número de turistas na Turquia caiu para 16,7 milhões dos 24 milhões registrados no mesmo período do ano anterior.

A instabilidade, sobretudo na política, também atingiu em cheio investimentos estrangeiros no país. Nos primeiros oito meses de 2016, o volume despencou quase 60%. No final do ano, o governo diminuiu de 4,5% para 3,2% a perspectiva de crescimento da economia.

Muitos se perguntam agora se o atentado em Istambul fará com que o governo imponha com ainda mais força sua autoridade. Segundo Mark Lowen, Erdogan tentará em 2017 mudanças constitucionais que fortaleçam seus poderes.

"O presidente argumenta que isso trará estabilidade, mas há o temor de que apenas aprofundará a polarização e o conflito", diz Lowen.

Asli Aydintasbas, escritora turca e pesquisadora do Conselho Europeu de Relações Exteriores, disse ao jornal americano The New York Times que "nada do que o governo fez está ajudando o país a ficar mais seguro".

A Turquia parece presa em ciclo vicioso: a instabilidade interna a deixou cada vez mais vulnerável a ataques extremistas. E os ataques extremistas estão provocando mais instabilidade interna.