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Puigdemont detido na Bélgica: quem é o líder catalão que quer se separar da Espanha

Carles Puigdemont se entregou à polícia na Bélgica, onde estava refugiado - Lluis Gene/AFP Photo
Carles Puigdemont se entregou à polícia na Bélgica, onde estava refugiado Imagem: Lluis Gene/AFP Photo

Patrick Jackson - BBC News, em Girona

05/11/2017 13h46

O líder catalão Carles Puigdemont desafiou a lei ao organizar um referendo à revelia do governo central espanhol e declarar independência da Catalunha de forma unilateral.

Depois de ser destituído do cargo de presidente da Catalunha, buscou refúgio na Bélgica junto com outros quatro auxiliares que também defendiam a independência da região autônoma, uma das mais prósperas da Espanha.

A Justiça espanhola emitiu uma ordem de prisão internacional contra Puigdemont e os ex-membros do governo regional por não terem comparecido a uma audiência judicial para responder às acusações de desobediência, conspiração e uso indevido de fundos públicos

Na manhã deste domingo (5), ele e quatro auxiliares decidiram se entregar à polícia na Bélgica. Eles foram soltos em liberdade condicional após interrogatório.

A Justiça belga deve decidir em até duas semanas sobre o pedido de extradição feito pela Espanha. Puigdemont havia dito que não voltaria à Espanha, a menos que fosse garantido um julgamento justo.

Mas quem é esse líder catalão que agora pode cumprir pena por ter levado adiante um plano separatista?

Carles Puigdemont é filho de um padeiro de Girona, cidade localizada a 100 quilômetros de Barcelona, que, antes de ser político, começou a carreira profissional como jornalista.

Ele nasceu em 1962 em Amer, província que faz parte de Girona e tem atualmente pouco mais de 2 mil habitantes, e cresceu durante a ditadura do general Francisco Franco (1892-1975. Frequentou uma escola católica que ensinava em espanhol, mas falava catalão em casa, assim como muitos de sua geração.

Joan Matamala, contemporâneo de escola, se lembra do garoto que todo mundo se dava bem, até mesmo os alunos mais velhos.

Matamala está no comando de uma livraria que, há 50 anos, tem promovido o idioma e a cultura catalã em Girona. Segundo ele, o jovem Puigdemont não era um líder natural na época do colégio, mas foi uma pessoa da qual não se esquece.

Desde cedo, Puigdemont nutria uma paixão pela língua nativa e foi estudar filosofia catalã na universidade local. O primeiro emprego foi em jornais locais da Catalunha ainda na adolescência.

Miquel Riera trabalhou com Puigdemont no El Punt Avui, um engajado jornal pró-independência. "Desde o início ele se mostrava muito interessado em novas tecnologias e na internet", diz Riera.

O gosto por tecnologia pode motivado o interesse de Puigdemont pelas redes sociais, que tiveram papel relevante em promover a campanha pelo referendo de independência.

Além do lado "geek", Puigdemont também é lembrado pelas habilidades sociais. "Ele é um homem que faz amigos fácil", afirma Riera.

Em 2006, decidiu trocar a carreira como jornalista pela política, candidatando-se a deputado do Parlamento da Catalunha. Não venceu a eleição.

Em 2011 foi eleito prefeito de Girona, cargo que deixou para ser empossado presidente regional da Catalunha em 2016 - ele disputou a eleição depois de um acordo de última hora firmado entre partidos separatistas.

E, entre as promessas de campanha dele, estava a de fazer uma consulta popular sobre a independência da Catalunha.

Selfies, comícios e manifestações

Entre os principais apoiadores, Carles Puigdemont desfruta status de "pop star". Em comícios e manifestações, são muitos os pedidos de selfies. A popularidade do líder catalão atinge diferentes classes sociais, vai dos mais humildes a representantes da elite da região autônoma.

"Puigdemont tem sido peça chave em levar a Catalunha ao lugar onde está agora", diz Montse Daban, presidente internacional da Assembleia Nacional Catalã, um movimento pró-independência de base.

"Ele é uma surpresa positiva para os cidadãos da Catalunha que estão realmente apoiando o processo de independência e veem com consternação o peso que esse processo tem".

Depois das notícias de que há um mandado de prisão contra ele, Puigdemont publicou uma foto no Twitter de uma manifestação na porta da sede do governo regional, em Barcelona. "Esse é o momento quando todos os democratas se unem. Pela Catalunha, pela libertação dos presos políticos e pela República", foi a mensagem que escreveu junto à foto.

O texto vem com um link para um texto que faz um apelo aos catalães, que devem voltar às urnas em dezembro e "usar a oportunidade para mais uma vez derrotar" o governo central.

As decisões já tomadas pelo líder catalão o fizeram infringir a lei espanhola. Aos olhos do governo central, ele criou uma crise política na Espanha e, ao declarar a independência de forma unilateral, queimou todas as possibilidades negociar um acordo com Madrid.

"Democracia não é apenas sobre votar, há referendos em ditaduras também", disse um representante do governo central que pediu o anonimato. "Apenas quando as pessoas votam de acordo com o que prevê a lei é que é democracia".

'Armadilha'

Esse mesmo representante do governo central acredita que as imagens de violência no dia do referendo realizado em 1º de outubro foi "parte do plano de Puigdemont". Para impedir a votação, o governo central mandou para a Catalunha forças de segurança e mais de 800 pessoas ficaram feridas em resultado do confronto dos policiais com separatistas.

"Foi uma armadilha e não há dúvidas que foi péssimo para o governo espanhol".

Apesar de ter levado adiante o plano separatista, Puigdemont parece ser mais cauteloso ao falar da independência que seu antecessor Artur Mas, que também fez uma consulta popular, em 2014, banida por Madri.

O referendo de Puigdemont venceu com 90% dos cerca de 2 milhões de votos válidos, apesar de apenas 42% dos eleitores terem comparecido às urnas. Ainda quando as pessoas estavam votando, Puigdemont disse à BBC: "Eu acho que ganhamos o direito de sermos ouvidos, mas o que eu acho mais difícil de entender é essa indiferença - ou falta absoluta de interesse - para entender o que está acontecendo aqui. Eles nunca queriam nos ouvir".

Já na condição de foragido, ele disse à uma TV belga que não está se escondendo da "justiça real" mas de um sistema judicial "claramente politizado".

No domingo, contudo, decidiu se entregar à polícia na Bélgica. Segundo o porta-voz da promotoria belga, o juiz tem 24 horas para decidir se recusa a execução do mandado de detenção europeu, prende os acusados ou os libera sob certas condições ou fiança. Enquanto isso, Puigdemont e os outro quatro separatistas ficam detidos.