Nova guerra de listas e suspensão de deputados: por que a terça-feira será chave na crise do PSL
Ala pró-Luciano Bivar acusa grupo bolsonarista de romper, mas ministro nega ter feito tratativas; sigla reunirá comissão de ética nesta terça e vários deputados podem sofrer sanções.
Na noite de sábado (19/10), o presidente Jair Bolsonaro (PSL) embarcou com a comitiva presidencial para uma viagem de duas semanas pela Ásia e pelo Oriente Médio, tendo como primeiro compromisso a cerimônia de entronização do novo imperador do Japão, Naruhito.
No fim da semana passada, a aposta em Brasília era a de que a viagem presidencial contribuiria para esfriar a crise entre o presidente da República e o comando de seu partido, o PSL.
Mas logo nas primeiras horas desta segunda-feira (21/10) a aposta tinha caído por terra: parlamentares do PSL se envolveram em uma nova "guerra de listas" pela liderança do partido na Câmara, e o presidente da legenda, o deputado Luciano Bivar (PE), convocou para a manhã desta terça-feira (22) uma reunião do Comissão de Ética da sigla que pode resultar na punição de vários deputados — e não só os cinco que já estão sob ameaça de suspensão.
Também está marcado para as primeiras horas desta terça um café da manhã dos deputados "bivaristas" do PSL, para definir os próximos passos do grupo na crise.
As duas alas da disputa também passaram a trocar acusações sobre a quebra de um suposto acordo para tentar pacificar a situação.
Seis listas e contando
Na semana passada, o Palácio do Planalto patrocinou a coleta de assinaturas de deputados do PSL com o objetivo de remover o deputado Delegado Waldir (GO) do posto de líder da bancada na Câmara.
Ao todo, foram três listas: duas da ala "bolsonarista" do partido, que desejava tornar Eduardo Bolsonaro (SP) líder da bancada na Câmara; e uma da ala "bivarista", que defende o nome de Waldir. A lista de Waldir tinha mais assinaturas (29 contra 26), e ele permaneceu como líder.
Mas na manhã desta segunda-feira, uma nova lista foi apresentada, desta vez por aliados de Eduardo: a relação trazia 28 nomes verificados pela Secretaria-Geral da Mesa da Câmara, incluindo três que antes apoiavam Waldir. Mudaram de lado os pesselistas Coronel Chrisóstomo (RO), Daniel Silveira (RJ) e Léo Motta (MG). Com isso, o filho do presidente se tornou o novo líder do partido — pelo menos por ora.
A situação continua confusa: aliados de Delegado Waldir começaram a coletar assinaturas para uma quinta lista. Preventivamente, deputados aliados ao Planalto assinam uma sexta listagem de nomes.
Eduardo Bolsonaro admite não saber se é realmente o líder do PSL no momento.
"Neste momento eu não sei se a lista que está valendo é a minha lista. Se houve qualquer tipo de acordo, não posso me posicionar como sendo ou não o líder do partido", disse o filho do presidente ao jornal O Estado de S. Paulo, no começo da tarde desta segunda-feira.
Segundo aliados de Bivar, a lista que deu a liderança a Eduardo representa a quebra de um acordo para "pacificar" o partido, que teria sido costurado no fim de semana — os aliados de Bolsonaro negam que tenham feito qualquer acordo.
"O general Ramos (ministro da Secretaria de Governo) ligou pro (Luciano) Bivar (presidente do PSL) na primeira hora (desta segunda-feira, 21). O que Ramos disse é que o governo queria uma pacificação e que e nenhum dos dois lado faria mais listas", contou o deputado Júnior Bozzella (PSL-SP) à BBC News Brasil.
"Aí, meia hora depois disso, o (líder do governo na Câmara) Major Vitor Hugo (PSL-GO) rompeu o acordo e apresentou a nova lista para colocar o Eduardo Bolsonaro", diz Bozzella, que é visto como uma espécie de porta-voz informal da ala "bivarista" na crise do partido.
"A articulação do governo age de forma perversa. O que a gente não sabe é se eles são só ruins ou se faltam com a palavra também", disse Bozzella à BBC News Brasil.
Luiz Eduardo Ramos confirmou ao jornal O Globo que conversou com Bivar na manhã desta segunda-feira, mas disse que tratou apenas do Projeto de Lei da reforma do sistema de proteção social dos militares, e não fechou qualquer acordo relacionado ao PSL.
"Houve uma ligação hoje, às 8h da manhã, eu liguei para o Luciano Bivar antes de embarcar (para São Paulo). Eu disse: 'deputado, estou falando com o senhor porque amanhã vai estar na pauta comissão o PL (dos militares) '", disse.
Comissão de Ética pela manhã
Com ou sem acordo, Bivar convocou uma reunião da Comissão de Ética do partido para as 9h desta terça-feira, em Brasília.
"O acordo era de que nem Eduardo Bolsonaro seria líder, nem Delegado Waldir. O que vai acontecer agora é uma discussão com todos os deputados que estejam habilitados para participar", disse Bozzella, enfatizando a palavra "habilitados".
Bozzella se refere ao fato de que cinco deputados do PSL devem ser suspensos do partido: Carla Zambelli (SP), Filipe Barros (PR), Bibo Nunes (RS), Alê Silva (MG) e Carlos Jordy (RJ). Os cinco são considerados integrantes da ala "bolsonarista" da sigla.
No fim da semana passada, Bivar tinha chegado a desistir da suspensão dos deputados. Mas, depois da lista apresentada por Vitor Hugo, a ideia voltou a ganhar força. A suspensão dos deputados é vista como uma forma de garantir a liderança da sigla na Câmara com o Delegado Waldir.
"Me parece que há uma falta de comando no partido. Eles decidem fazer uma coisa, de ceder a liderança e parar o processo de suspensão; e aí depois uma ala mais radical pró-Bivar diz que houve rompimento de acordo e resolve tocar pra frente a suspensão (dos deputados) ", disse Carlos Jordy à BBC News Brasil.
Mas não são só esses cinco que terão seus casos apreciados na reunião desta terça: outros deputados que criticaram publicamente a condução de Bivar e a suposta falta de transparência do PSL também receberam notificações em seus gabinetes.
A representação contra estes deputados é assinada pelo líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo, e por outros dois dirigentes do PSL — que não têm mandato eletivo. Todos os notificados são da ala "bolsonarista" do PSL, e muitos assinaram uma carta de apoio ao presidente da República logo no começo da crise, no dia 9 de outubro.
"A notificação diz que eu não deveria ter feito essa cobrança (de transparência) publicamente, que isso expôs o partido, constrangeu os dirigentes. Mas não diz quais sanções eu posso sofrer. Diz apenas que vai ter uma deliberação sobre isso amanhã e que eu poderei comparecer para me defender lá", diz à BBC News Brasil um dos deputados notificados, Cabo Junio Amaral (PSL-MG).
Controle de fundo milionário
A confusão no PSL — que entra agora em sua terceira semana — passa pela disputa pelo Diretório Nacional da legenda e dos recursos públicos milionários que o PSL tem a receber ao longo dos próximos anos. O mandato atual de Bivar à frente da legenda, asssim como o dos demais dirigentes do partido, se encerra no dia 21 de novembro.
Na semana passada, o clima parecia ter esfriado, até que a Polícia Federal foi às ruas na terça-feira (15), numa operação contra Bivar.
Até mesmo celulares dele foram apreendidos — a operação investiga a existência de supostas candidaturas "laranjas", isto é, de fachada, no PSL pernambucano em 2018.
Mesmo sem qualquer evidência concreta, deputados do PSL ligados ao pernambucano passaram a levantar suspeitas sobre o momento escolhido para a operação — justamente quando Bivar está envolvido em uma disputa com o Planalto.
Na noite da mesma terça-feira, Waldir orientou os deputados do PSL a obstruir a votação de uma Medida Provisória que interessava ao governo. A obstrução é um instrumento usado pelos partidos para permitir que seus deputados não contem para o atingimento do quórum das sessões, mesmo que eles estejam dentro do plenário.
A justificativa de Waldir para o fato era evitar que os congressistas ausentes do PSL tomassem falta, mas o Planalto sentiu-se atingido: na quarta (16), pesselistas leais a Bolsonaro reuniram assinaturas para a primeira tentativa de destituir Waldir do posto de líder e substituí-lo por Eduardo, abrindo a "guerra de listas".
Até o momento, a crise já resultou na destituição de Joice Hasselmann (PSL-SP) do posto de líder do governo no Congresso; no possível adiamento da indicação de Eduardo Bolsonaro para o posto de embaixador do Brasil em Washington (EUA); além do estremecimento da relação entre o presidente e parte de seus apoiadores no Congresso.
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